Passagem

Para todos os efeitos era como se ele não estivesse ali.

Lila permanecia sentada na beira cama com os olhos afundados no chão sem dizer uma palavra.

- Não foi minha culpa inteiramente. – Diego disse, tentando quebrar o silêncio.

Mas ela permaneceu calada.

- Eu sei, eu sei. Agora que está feito não importa de quem foi a culpa. – Ele continuou a falar, sentado na janela, como se não tivesse medo de cair do lado de fora.

Lila se deitou na cama e cobriu a cabeça com um travesseiro.

- Ah. Agora você vai me ignorar, não é? Típico de você. – Ele insistiu.

Então ela arremessou o travesseiro na parede e Diego pôde ver que havia lágrimas escorrendo de seus olhos. O que foi o suficiente para que se calasse. Quis abraça-la, como tantas vezes tinha feito, durante e depois das brigas. Mas agora, não tinha coragem para isso. Lila correu para o banheiro e se trancou. Passou-se muito tempo até que saísse de lá. E quando saiu, estava enrolada numa toalha e de cabelo molhado. Ele a seguiu de perto e esbravejou.

- O que você quer que eu faça agora? O que eu poderia ter feito diferente? Porra! Eu só queria que você estivesse por perto mais tempo. Estava cansado dos seus silêncios, dos seus sumiços e das tantas vezes que você dizia que ainda sentia saudade, mas que era melhor que não nos víssemos. Você não sabe como era difícil me olhar no espelho e saber que tudo estava acabado entre nós. Você não estava comigo para me ver apodrecendo. Se estivesse, saberia.

Lila continuava a chorar, e tentava desesperadamente se maquiar, olhando-se num espelho, enquanto ele esbravejava. Mas as lágrimas tornavam tudo mais difícil. Então ela arremessou o lápis de olho na direção dele e gritou.

- Por que você fez isso comigo?

Depois abriu uma caixa de madeira que tinha guardado no armário e pegou um punhado de fotos. Fotos dele... Fotos deles.

Começou a rasga-las e espalhar os pedaços pela casa.

- Como você conseguiu ser tão egoísta?! - Ela gritou para a única foto que tinha permanecido intacta.

- Eu não sei o que dizer. Sinto muito, Lila. – Ele falou, cheio de culpa, sem conseguir olhar diretamente pra ela.

- Eu nunca deixei de te amar! Acho que nunca vou deixar. Mas nós precisávamos seguir com nossas vidas. Eu preciso seguir com a minha.

- Ah Claro. Sempre foi muito mais fácil pra você. Só bastava um sorriso e você estava cercada de pessoas. E eu? O que eu tinha? O que eu tenho? E agora eu sou o egoísta? Você foi embora e eu só fiquei com uma casa vazia e silêncio. O que você queria que eu fizesse com isso?

Lila não respondeu e permaneceu com os olhos cravados no chão.

- Eu imaginei que você não teria nada a dizer. – Diego finalizou.

Lila juntou os pedaços das fotos em cima da cama, enxugou as lágrimas e se vestiu da melhor forma que pôde. Ela estava ali do seu lado, mas Diego a sentia extremamente distante. E de alguma forma, inalcançável. Ao mesmo tempo, não sabia como tinha chegado àquele ponto. Tudo era tão confuso e tão difícil de entender.

Lila enfim, pegou uma pequena bolsa, colocou uma carteira e celular dentro e saiu de casa.

Diego ficou observando pela janela enquanto ela ganhava a rua e esperava na esquina. Logo um carro parou e Lila abriu a porta e entrou. Ele pode ver quando motorista a beijou, antes que acelerasse o carro e os dois desaparecessem de sua vista.

Diego sentiu um terrível vazio dentro de si. E de alguma forma, era como se ele estivesse desaparecendo.

Olhou a foto que Lila havia deixado intacta sobre a cama.

A primeira foto que tinham tirado juntos.

Nela, Lila sorria... Leve... Radiante.

Talvez um dia ela pudesse se sentir novamente daquela forma, sem que ele estivesse por perto...

Aquele sorriso ficou preso em sua memória e de fato foi a última coisa que conseguiu reter de si mesmo, enquanto silenciosamente ia deixando de existir no mundo dela.

Rômulo Maciel de Moraes Filho
Enviado por Rômulo Maciel de Moraes Filho em 16/09/2018
Reeditado em 09/10/2020
Código do texto: T6450269
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