A Mulher da minha vida

Amigos de farra, Dé e Pê, frequentemente encontravam-se todos os fins de semana nas noites de uma boate, conhecida na cidade, como Kalamazoo, para juntos, em cada fim de semana construírem, sob os sonhos, os embalos de sábado à noite. E sob esse signo, nas sexta-feira, quando terminava os seus afazeres, Pê curtindo a FM da cidade, na condução rotineira, se dirigia ao ponto de encontro para esperar o amigo, que no dia a dia, diferente de Pê. Dê, que era o filho único, de um certo capitão, passava o dia brincando com o seu vídeo game, esperando as noites de fim de semana, como quem espera uma decisão de futebol, para completar a sua vida, em mais um hobby.

Os dois já cinquentões, ainda teimavam viver a vida como playboys e assim levavam os anos.

Lá, era como se o outro lado da liberdade vos sorrisse, um paraíso de prazeres, como Dê sempre falava. Começavam entrando sem pagar, bebiam, fumavam, namoravam e dançavam bastante, até cansarem e nesse ritmo frenético chegar a famigerada segunda feira e a realidade bater de novo as suas portas como acabando o encanto.

Gostavam de apreciar, dançar e principalmente amar as garotas mais belas, ouviam as músicas e se deliciavam até o sol raiar. Quando não, curtiam se envolverem numas boas e saudosas brigas, como aventuras ou então dormir na casa de suas conquistadas para no dia seguinte por telefone rirem dos acontecimentos.

Aconteceu, porém, que num fim de semana, Pê não pode comparecer, pois o seu patrão exigiu hora extra. A fábrica de vidros tinha umas entregas de porte e qualidade para o exterior, fator esse, que tirou de rota o nosso amigo Pê daquele final de semana. Deixando Dê, pela primeira vez embarcar no sonho sozinho.

E nesse caminhar de lobo solitário, o leão, as vezes se perde, ou quem sabe se acha. O fato é que naquele fim de semana, Dê dançando de lambada a carimbó, bebendo todas, pois estava se sentindo só, sem saber o paradeiro do amigo, esbarrou numa moça loira, de olhos azuis e branca como a flor na madrugada, em sua alma, dizendo nas entrelinhas, quero ser amada.

Como despertar de um sonho, ele não perdeu tempo, como de costume, se aproximou, festejou, serviu de chacota e quando se viu estava dançando com a moça, que apostou nele até o amanhecer.

Trocando números telefônicos e endereços, aquele homenzarrão se apaixonou, pela linda Mônica. Foi amor à primeira vista, uma paixão dessas que deixa qualquer ser humano, sem asas, sem pés e nem alma.

Arrebatado, na segunda feira cedo foi à casa do seu amigo de farra. Não com o intuito de sabe o que o levara não ter aparecido naquele fim de semana, mas com a finidade de confidenciar o novo que estava vivendo.

Naquela noite, o luar estava calado e a chuva fina descrevia sobre as telhas uns versos profundos de uma certa saudade, que ardia nos olhos daquele homenzarrão apaixonado. Seu amigo, o ouvia atentamente, mas com um ar de não acreditar na narração dos fatos. E como a si, o reflexo de algo do que viveu no passado, parecia sussurrar-lhe a mente na história narrada por seu companheiro. E momentaneamente ficava sem entender o que Dê vivia, visto que o seu lema era “nunca amar, mas sim curtir até o sol raiar”. E sob efeito dessa viagem, lembrou que fora feliz, mas que vivera um inferno, quando optou por ter alguém ao seu lado. E ele participando como ouvinte da confidência do amigo, exclamou, quando para seu espanto Dê, de tanto falar, como um insano disse:

- Pê acho que vou me casar com essa mulher.

De súbito Pê se expressou:

- Agora você pirou de vez. Conheceu a mulher numa noite e já vai casar.

Dê continuou:

- Parceiro, é porque tu não viste a mulher. E ainda bem, pois tu ias querer me rouba-la, mas agora não tem jeito, ela tá na minha e só queria que tu a conhecesses.

Os dois riram e Pê vendo até onde a situação ia, concordou em ver a moça.

Dê levou o amigo para conhecer Mônica, os apresentou e como se fosse o prêmio da vida, os dois a sós num bar de esquina, perguntou ao seu parceiro:

- E ai, o que tu achastes da mulher.

Pê então falou:

- realmente ela é bonita, você sempre teve um bom gosto.

E batendo nas costas de Pê, Dê finalizou:

- Não te falei. Eu vou é casar com essa mulher, ela é linda.

Com ar de preocupado, Pê finalizou:

- Meu amigo, estás certo do que falas. Mal conheces essa moça e ela muito menos a ti.

Dê praguejou:

- Deixa de agouro, será que não posso acertar uma vez. Vamos beber em minha homenagem, ela é uma boa moça, confie no que digo.

E Pê concluiu:

- Sim, dela tenho certeza, só não sei você.

E rindo os dois se foram, para nuns dias mais se reencontrarem sob as pompas e adornos na igreja, Basílica de Nazaré, onde Pê, ainda sem acreditar viu o amigo de farra e amigo das horas dá o primeiro sim de sua vida. Abdicar das farras, das aventuras e prazeres das noites, por uma família.

Tão certo como o seu casamento, numa bela tarde, três meses depois, o pai de Dê liga para Pê pedindo ajuda.

Ao telefone dizia angustiado:

- meu filho, eu sei que você é o melhor amigo do meu filho, por isso te peço, que venha comigo, para irmos à casa dele, pois algo muito sério aconteceu lá, que o sindico me ligou apavorado.

Sem impor barreiras e muito preocupado Pê o aguardando na esquina pensava com os seus botões:

- Que loucura Dê está fazendo agora, além de passar o dia jogando vídeo game, outro dia ele bateu na moça e agora o que será. Foi quando o pai de Dê chegou e os dois preocupados seguiram ao apartamento deles.

Lá chegando os dois depararam com a cena, a moça com o rosto bastante machucado e hematomas pelo corpo, Dê trancado dentro do banheiro e a moça com uma arma em punho gritando feito histérica:

- Tirem esse animal daqui, antes que eu o mate. Eu saio para trabalhar todos os dias, chego cansada, dou um duro danado e assim mesmo tenho que lavar, passar, fazer comida e ele não faz nada em casa pra me ajudar, tão pouco reconhece. Só come, dorme, passa o dia jogando vídeo game e ainda quer me bater.

Como pacifista Pê, que por sua experiência já tinha vivido essas crises, quando fora casado, conseguiu acalmar os ânimos, tomar a arma da moça, dar um copo com água e tirar o amigo do banheiro. Embora umas discursões tenham se acirrado, quando os pais da moça chegaram, eles conseguiram tirar Dê de lá e quando vinham no carro do pai de Dê, de repente tiveram que parar o carro, pois Dê, aquele homenzarrão apaixonado chorava feito criança dizendo sem parar:

- Me elevem de volta, por favor. Eu vou morrer sem essa mulher. Eu a amor, amo, amo muito. Ela é a mulher da minha vida.

Pê olhando a cena, começou a sorrir sarcasticamente e finalizou:

Olhe aqui Dê, pare com esse show. Pois se você a amasse de verdade teria mudado de conduta; o teu lugar ainda é no Kalamazoo.

E como era sábado os dois, levados pelo pai de Dê rumaram para lá e como era de costume, voltaram a encher a cara.