A MORTE FAZ PIRRAÇA
Demétrio Sena - Magé
Esta noite a morte pensou que sua visita me aterrorizaria. Fez aquela cara de mistério, ligou seu ar condicionado e o ambiente já sombrio terminou de compor a cena. Então olhou bem para minha cara e quase disse: "Qual é a sua? Não entende ainda que sou a morte? Quer que desenhe?".
Não precisava. Estava evidente meu destino, porém ela esqueceu nossa intimidade. Sou filho de Maria; irmão de Jô, Izo, Beto, Carminha, vado, Nem, Branca e Nete. Foram muitas as vezes que a enfrentamos. De minha parte, nem ligo mais para vencê-la. Vivi pelo menos duzentos anos em 59.
A morte viu meu desprezo. Meu tanto faz...Viu até meu conforto ao saber que descansaria. Ficou com raiva e me causou dor, mas isso também eu domino. Também sou cascudo nesse campo. Há poucas dores que já não tenha sentido no corpo; na alma; na psique. No raio que me parta.
Virou as costas, quando lhe dei a mão. Soltou. Tinhosa, só me queria se eu não a quisesse, como nas histórias de amor. De costas, virou seus olhos pros meus e falou em baixo e bom sussurro. "É com a outra que você vai se ver. Esnobou? Então fique aí! Tomara que viva por mais duzentos anos!".