1-O homem do campo, ARTAXERXES, de repente – ainda que de forma um tanto ambígua – imagina que o Presidente da República foi seu companheiro de infância.  Muda-se para o Rio de Janeiro, então capital federal, e começa a pensar num bom texto para um telegrama – pensa, repensa, acrescenta palavras, corrige, substitui palavras, cada dia melhor conteúdo... e se perde no tempo.  Já nem sabe mais se enviou, se não enviou.  Ah, porque um ano depois acha o rascunho e a angústia recomeça.  Quem sabe, como resposta, uma nomeação para um destacado cargo público?  Pois é................................
 
2-Segunda metade da década de 60.  A moça carioca se correspondia desde garota com um professor paulista que mudara de Campinas para São Paulo e quinzenalmente visitava os pais, dormindo no antigo quarto.  Certa ocasião, de repente – ainda que muito cuidadosa com papéis – ELA imaginou o possível extravio de uma carta dentro de casa mesmo... ou teria despachado e esqueceu?  Levou dias e dias procurando em vão tal envelope:  agulha no palheiro?  Mais rápido um telegrama.  Enviou.  O rapaz alugara um quarto no apê de uma senhora judia intelectual, toda séria e sempre muito preocupada com as leis e a Constituição do Brasil.  Ora, o tal telegrama foi entregue ao carteiro na agência de correio, num horário extremante tardio, e o telegrafista apenas informou – sem dizer o exato conteúdo – não ser assunto secreto, gravíssimo, urgente... Ora, o  carteiro, casual vizinhosíssimo do prédio do destinatário, espiou o porteiro abrir a entrada de vidro às 5 da manhã e entregou o papel dobradinho e lacradinho.  Missão cumprida que passa a comprida depois.  Aí é a hora da discrição e da honestidade, inexistentes em 2015!  A tal senhora telefonou antes do sol para Campinas, chamando-o de “senhor” (muito mais novo que o filho dela caçula), comunicou apreensiva a chegada do telegrama, porém recusou-se a abri-lo e ler ao telefone.  Correspondência inviolável de acordo com a Constituição e, além disso, ela era uma estrangeira.  O “abra” versus “não abro” levou muitos minutos até o paulista ser obrigado a inventar que estava gravando a autorização... portanto não era crime algum.  Abriu e leu para ELE:  “Aguarde carta.”
 
FONTE:
“O telegrama de Artaxerxes”, conto de 1944, autor ANÍBAL MACHADO – filme da Cia. Vera Cruz em 1954  -  um dos episódios na telenovela “Felicidade”, 203 capítulos entre out./91 e maio/92.


                                         F  I  M
Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 26/12/2020
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