Dente-de-leão

A gente nasce, cresce, envelhece e morre. Esse é o ciclo da vida que o banco da escola ensina. Simples assim. Só não explica que no ciclo da vida, a vida é o que há de mais complexo. Quantas vidas cabem em uma vida? Quantas vidas nem nascem. Morrem antes mesmo de ser. Quanto nós matamos antes de acontecer. Cresce. Cresce como? Regamos, alimentamos, cuidamos. Sem esses elementos, cresce? Não. Envelhece e Morre. Pode ser que morra sem nem mesmo envelhecer. Pode ser. Morre. Quantas mortes acontecem antes de envelhecer? Quantas mortes cabem em uma vida? Quantas formas de morrer existem? Um dia saberemos dizer? Falar dos ciclos dentro dos ciclos da vida. Das diferentes linhas que se cruzam, das que permanecem juntas. Por quanto permanecem juntas, unidas, paralelas, contínuas. Algumas, intersecções. Mudam o rumo. Como um acidente de carro. Causa impacto. Machuca. Desvia o caminho. Dá sentido. Perdemos os sentidos. Encontramos novos sentidos. Qual linha sou no ciclo da vida? Alguém ousa dizer? Prever o futuro. Quantas vezes já tivemos o ímpeto, a vontade de saber o futuro. Ilustre desconhecido. Nos reserva as surpresas do amanhã. Por ele perdemos noites de sono, sem saber se seria a nossa última noite, nosso último dia. Sem saber que o acontecimento em sequência mudaria todo o sentido e razão do que já foi. Me encontro no abismo do desconhecido. Querendo ver o que a visão não alcança. Aquilo que nem feiticeiro ou bruxaria conseguiria me dizer. Ainda assim, quero saber. Teimosia. Amanhã é meu último dia? Então vou viver o hoje. Hoje é meu último dia. Agora é minha última hora. Meu último instante. No próximo já não sou mais eu. Sou outro eu. Outra de mim. A mesma de sempre, mas sempre diferente. Vestida pelas linhas que passam por esse corpo e marcam a única constante: mudança. Tal qual um dente-de-leão. Basta um sopro. Sopro de vida. Tudo muda. Me espalho pelo mundo. Deixo um pouco de mim. Mudo e sou mudada. Sem pedir ou querer. Sem aviso prévio. A vida acontece.