Doze Anos Depois

Se você me visse hoje, nem iria acreditar o quanto eu mudei.

Quando nos conhecemos, eu não passava de uma menina mimada. Meus pais sempre me deram tudo o que eu pedi, as coisas vinham parar nas minhas mãos sem qualquer esforço meu. Nunca, até então, havia precisado batalhar por nada.

Nem por você eu batalhei. Eu estava bem quieta no meu canto quando um dia você apareceu vindo não sei de onde e se sentou ao meu lado. Segundo consta, já estava até apaixonado por mim. Nem precisei lutar para conquistar seu amor. Nunca foi tão fácil me apropriar do coração de alguém como o seu. Até hoje me surpreendo com a rapidez com que você despencou aos meus pés.

Mas por eu ser uma guria mimada, seu amor por mim também não durou muito tempo. Mas foi o tempo bastante para me deixar marcas gravadas a ferro e fogo no meu coração. Quando você me chutou, fiquei uma semana sem tomar banho e sem lavar o cabelo, inconformada. Fiquei também uma semana acordando e dormindo ao lado do celular, 24 horas por dia, numa espera doentia pela sua ligação. O inferno. O caos. Antes que eu naufragasse de vez, meus pais me mandaram passar uns seis meses na Austrália para que eu esquecesse você. Quando eu voltei, coloquei os pés em solo brasileiro pensando em lhe procurar. Para minha total decepção, quem havia partido havia sido você. E sem data para voltar.

Aí os anos passaram. Eu fui obrigada a amadurecer, querendo ou não. Meu cabelo cresceu, ficou loiro, fiz escova progressiva. Conquistei um bom emprego, meus pais ficaram velhos demais para me mimar e, por fim, entrei na vida adulta tendo que lutar por cada coisa que antes vinha parar na minha mão, de graça. Um dia acordei grávida. Lembrei da menina de alguns anos atrás e que agora seria mãe, sem sequer ter um marido. Era tão assustador. Senti saudades daquele passado repleto de mordomias e apavorada com o que viria pela frente. Será que eu seria competente para criar um filho sozinha, sem ajuda de ninguém?

Quem me olha não imagina que eu passo por tantos terrores cada vez que ponho a cabeça no travesseiro, nestas minhas noites mal dormidas. Tento enganar a quem me cerca, passando a imagem de uma mulher forte e de atitude. E eu faço força para acreditar que sou realmente assim.

Se você viesse falar comigo hoje, veria o quanto eu mudei. Lá no fundo guardo alguma coisa daquele tempo. E ontem eu vi você. Passou tão perto de mim, mas nem me viu. Acho que mudei tanto que você não me reconheceu. Espero que tenha sido isto, apenas isto.

Só que fiquei com vontade de cutucar seu braço, perguntar onde estava morando, com quem, mostrar a minha barriga que começava a despontar e a gerar comentários. Queria tanto que você visse que eu sou outra, mas os anos me trouxeram uma timidez inesperada. Vi você caminhando lentamente entre as pessoas, ensaiei uma pequena perseguição, depois desisti. É, você não era para ser meu mesmo. Mas talvez gostasse do que os anos trouxeram de bom para mim.

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 19/02/2006
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