LIGAÇÃO PERDIDA

A vida que eu vivia era tão simples que dava a impressão de ser perfeita. Ou quase. Um marido excelente, casa própria, carro novo e um emprego estável. O que mais eu poderia querer? Tudo certinho no seu lugar. Eu não podia reclamar do Guilherme. Meu companheiro, meu amigo… eu podia contar com ele para tudo. E, para alegria de toda a família, eu estava tentando engravidar. Era só uma questão de tempo.

Então, uma sexta à tarde, tocou meu celular. Naquele momento eu estava no trabalho, tomando um cafezinho, na minha mesa, despreocupadamente. Minha lista de compras para o supermercado logo mais estava quase pronta. Achei que fosse o Guilherme. Atendi o celular sem sequer verificar quem era realmente.

- Alô?

Estranhei os dois segundos de silêncio que se fez do outro lado. Quando eu ía falar outra vez, aquela voz – maldita bendita voz – soou do outro lado. E eu gelei.

- Carol… que bom escutar você.

Fechei os olhos e tive vontade de jogar o celular de encontro à parede. Não, não de novo, não! Volte para onde você veio!, tive vontade de gritar. Meu coração se acelerou e eu fiquei trêmula. Felizmente eu estava sozinha na sala, pois fiquei totalmente descompensada quando escutei a voz do Ricardo, meu ex. Além de meu ex, ele havia sido o único cara que eu tinha amado até então. O mais cafajeste, o mais canalha, o mais ordinário, o mais lindo, o mais sedutor, o mais bom de cama, o mais… Eram tantos “mais” que eu deveria fazer uma estátua do Ricardo e adorá-lo todos os dias. Ele simplesmente desaparecera há dois anos. Assim como entrou na minha vida de repente, um dia Ricardo sumiu e me deixou na mais completa solidão. No auge da minha dor, conheci o Guilherme, minha tábua de salvação. E quando tudo tinha se ajeitado novamente na minha vida, o filho da mãe volta. Que azar. Azar?

- Você… você… onde você esteve, Ricardo? – perguntei agarrando o telefone com força, tensa – Sabe que eu casei? Que estou tentando engravidar? Você sabe…

- Você sabe que eu estou louco para ver você?

- Quando e onde?

Eu não pude e nem quis resistir. O resto do mundo já tinha explodido. Eu não enxergava mais nada.

- Agora. Estou no carro, aqui embaixo. Desça. E eu disse agora.

Inacreditável. Ricardo tinha voltado. Peguei minha bolsa e esqueci a lista em cima da mesa. Saí voando do escritório, não me despedi de ninguém. Não usei o elevador. Eu estava tão atordoada que fui de escada mesmo, pulando os degraus de dois em dois. Ricardo. Era tudo o que eu não precisava. Ele era tudo o que eu mais precisava. Encontrei-o sentado em um Jipe do outro lado da rua. Barba por fazer, bronzeado, o cabelo mais claro. Dava mostras de ter passado uma temporada sob o sol. O olho… bem, aqueles olhos escuros eram o mistério total. Ao mesmo tempo em que pareciam te amar, ali se escondiam coisas que duvido que alguma mulher pudesse desvendar. Eu bem que tentei.

Entrei dentro daquele carro e no segundo seguinte estávamos nos beijando, loucamente. Quinze minutos depois, Ricardo entrou no primeiro motel que apareceu e passamos ali algumas horas maravilhosas. Só lembrei do meu marido quando eram oito horas da noite e liguei o celular. Havia tantas mensagens dele, que provavelmente Guilherme deveria estar achando que eu tinha sido abduzida.

Ricardo me levou de volta ao trabalho e eu peguei meu carro. Nos despedimos cheios de amor. Ele me jurou que me procuraria. Agora tinha assentado a cabeça e estava de mudança para minha cidade. Sim, eu prometi que largaria Guilherme para ficar com ele. Era loucura, eu sabia. Mas finalmente eu estava admitindo para mim mesma que o homem da minha vida era o Ricardo.

Quando cheguei em casa, meus ombros pesavam de tanta culpa. Olhei para o Guilherme e meus olhos pareceram contar onde eu havia passado aquelas últimas horas. Acabei tendo uma discussão horrível com meu marido. No final, já de madrugada, ele fez as malas e foi embora. Fiquei sozinha, arrasada, mas dizendo para mim mesma que o Ricardo voltaria em breve e ficaríamos juntos para toda a eternidade.

Os dias passaram. Emagreci, enfrentei a ira da família do Gui e da minha também. Acabei tendo que tirar uma licença, tamanho o meu estresse. Um dia me descobri grávida. E eu nem sabia mais quem era o pai. E do Ricardo… bom, deste eu nunca mais ouvi falar. Mas tremo toda vez que meu celular toca.

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 23/08/2008
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