A HORA DA VIDA
É a mesma hora. A hora de todos nós num lugar sem história, onde
a aurora é quase sempre triste.
O acordar, melancolia inesperada, temendo a última palavra sobre
o mundo. Mas a água no rosto convida para o dia, para a guerra suja
do viver.
Viver. O dia avançando para as obrigações inadiáveis. A oração
que se esquece. Café com pão enchendo a barriga e um poema de
Maiacovski levantando a coragem.
As mãos que produzem riquezas faz tempo que estão despertas.
Por necessidade. Por medo.
No caminho, os operários contemplam a paisagem. Carregam muita
esperança de um bom dia. "Um bom dia é um dia sem acidentes" Ah,
o ocidente!
Os ônibus estão lotados. É sempre assim, nunca muda. O que fa-
zer? É preciso chegar ao roçado porque o pão nunca vem de graça.
Chega gastando suor, sangue e lágrimas. Certeza universal.
E também se ama. O amor foi bom na noite que passou e aliviou as
angústias do dia maldito.
O mesmo uniforme. A mesma função. Os mesmos gestos que se
repetem. E já são tantos os anos...
Ainda existe o meio-dia para se matar a fome. Descanso a esperar
o continuar das angústias.
Tarde sadia e amorosa. Antecipando os fascínios da noite misterio-
sa a negar a possibilidade de feliz solidão.
Talvez haja sonhos e os sonhos ajudam a enfrentar a hora inicial
do novo dia.
A mesma hora que existiu hoje!