Redação

Foi quando entrei na quinta série que comecei a estudar de manhã. Eu me sentia “a tampa” no ginásio, com um caderno de vinte matérias (e claro que até o fim do ano não usei nem dez). Eu estava na turma mais numerosa da escola, mais um motivo para me achar mais importante do que era na realidade, e pela primeira vez soube o que era ter um professor para cada matéria. Pela primeira vez eu soube o que era ter professores engraçados. Os meus favoritos eram o de matemática e o de português, mas como nunca fui fã de matemática, era o professor de português o meu ídolo. Eu sempre voltava das aulas contando para a minha mãe as piadas que ele tinha feito e as perguntas que eu tinha respondido.

No ano seguinte fui estudar em outra escola e só tinha notícias dele por terceiros. Não que eu me importasse muito, arranjei logo outras pré-ocupações.

No meu último ano escolar eu o reencontrei. Foi engraçado, porque voltei a me sentir como aquela criança de onze anos, que ficava radiante ao ouvir qualquer elogio dele. Não que ele se lembrasse de mim, mas foi um dos poucos professores que reparou na minha existência dentro (e às vezes fora) da sala de aula. Por mais que ele não soubesse nem o meu nome, foi de grande influência na minha vida.

No ano seguinte eu levei pau no vestibular e passei a freqüentar um cursinho. Claro que eu queria um cursinho onde ele lecionasse, e devo dizer que não me arrependo da escolha que fiz.

Eu estava deprimida, solitária e solteira. Quando ele irrompeu na sala de aula eu estava prestes a chorar, sentindo-me incapaz, incompetente e inconsolável. Em poucos minutos de aula ele me viu e me reconheceu. Dirigiu-se até o fundo da sala, beijou-me e perguntou como eu estava. E o ano seguiu-se assim. Todas as aulas ele me cumprimentava (coisa que não era muito freqüente, já que eu não me relacionava com as outras pessoas do cursinho), às vezes de uma forma inocente, às vezes de forma mais ousada. Até que eu comecei a ver segundas intenções nas brincadeiras dele e entrei no jogo. Houve ocasiões em que ele quase me beijou na boca em plena aula.

Eu ia até ele sem motivos reais, inventando dúvidas e desculpas até que ele me ofereceu uma carona (para dizer a verdade, minha casa ficava quase ao lado do cursinho) e saiu com o número do meu telefone. Depois disso nos encontramos pela primeira vez. A minha segunda no carro de um professor casado. Demos algumas voltas pela vizinhança e paramos exatamente na frente do colégio onde ele tinha sido meu professor sete anos atrás. E lá ele tentou me comer. Eu não dei e ele achou que eu era virgem (isso foi tão engraçado!)

Depois disso só nos encontramos fora do cursinho quando ele efetivamente me comeu. Fomos ao motel (nada de sexo no carro!) e transamos uma única vez. Não que eu fizesse questão de mais, única coisa que eu tinha realmente gostado era das mordidas. O problema foi que eu tive que passar a esconder minhas costas do meu namorado (e não que tenha sido um desafio).

Ele sempre ia e voltava. Ligava-me, mandava e-mails e depois desaparecia. Ele me disse depois que tinha crises de consciência depois de me encontrar. Trair namorado é uma coisa, mas comer a aluna enquanto diz pra mulher que foi comprar fraldas já é algo mais sério.

Claro que minha vida continuou entre esse vai-e-volta todo, e ele me surgiu pela última vez em um momento inoportuno (como de costume). Mas eu queria tentar fazer as coisas certas dessa vez, mesmo tendo escolhido a pessoa errada. Eu ia encontrá-lo, ele disse que ia explicar tudo que acontecera, mas antes que eu soubesse de qualquer coisa, coloquei um ponto final.

Expliquei em um e-mail tudo que se passava e foi aí que tudo acabou. Por mais que eu apreciasse sua companhia, não quis tentar um relacionamento estando envolvida com um homem comprometido. Ele pôs todas as vírgulas, mas o ponto final coube a mim.

Não sei se haverão outros parágrafos, mesmo não tendo vingado o relacionamento em que eu apostava, não poderia eu começá-los. Apesar de sentir a falta de ter minhas costas marcadas e meus seios espremidos, sei que extrapolei as trinta linhas e deveria tentar começar uma nova redação.

Thais Gualberto
Enviado por Thais Gualberto em 11/07/2009
Reeditado em 12/07/2009
Código do texto: T1693473
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.