FÉRIAS DA FAMILIA FULÔ

FÉRIAS DA FAMILIA FULÔ

FlavioMPinto

Groselha estava ansiosa : faltavam poucos dias para as férias. Descanso, descanso, descanso. O trabalho burocrático do ministério a consumia. Viagens, trabalho, reuniões. Não via a hora de ir para a beira do mar e , numa cadeira de praia, tomar sua caipirinha favorita. Como boa mineira, correria com a família para o litoral capixaba que a esperava de braços abertos.

O dia amanhecera cinzento em Brasília. Chuvoso. Rollerjéquison não queria nem sair da cama, mas o dever o chamava: além de ser véspera de viagem, era o dia de colher suas frutinhas para seus famosos licores e geléias . Cerejas, amoras, mangas, pitangas. Não só do seu quintal, mas também da frente das casas dos vizinhos. Uma festa o dia da colheita e de sujeira na cozinha. Nos últimos tempos não contava mais com as filhas, Maria e Marialva, que agora “aborrecentes” só queriam saber de shoppings e Justin Bieber. Além da concorrência de Perereca e Latifa, duas cadelinhas maltês brancas e peludas a latirem sem parar.

A brincadeira terminava próxima do meio-dia com quase uma dúzia de licores prontos para adormecer por um ou dois anos, e após uma boa filtragem, distribuir aos amigos e confraternizar. Com relação as geléias, era esperar esfriar e distribuir com uma boa dedicatória.

Roller não bebia, mas naquele dia , até uísque tinha vontade de beber. Não ia dirigir nem no dia seguinte....

- Agora é só reorganizar a cozinha prá Zélha não me encher o saco e ...pronto. Tô livre prás férias.

O problema mesmo estava no dia do embarque.

Havia combinado com um vizinho, Seu Bento, dono da banca de frutas da superquadra, para levá-los ao aeroporto. A Kombi 76 já estava a postos. Sempre cioso com o relógio, preocupado com o horário dos vizinhos, combina que sairiam ás 1230 hs. A “viatura” , como era conhecida a Kombi, já estava limpa. O último transporte da feira já fora feito e tudo pronto para a ida ao aeroporto. Tinham de estar duas horas antes do embarque por causa das cadelas.

A família Fulô estava dispersa no dia do embarque: Zélha no cabeleireiro, Roller no trato enrolado de seus licores e geléias, a empregada ás voltas com a casa e Maria e Marialva que não queriam tomar banho nem arrumar suas coisas.

- Mas que diacho, sô, duas meninas já com 15 anos não quererem tomar banho! Exclama uma preocupada Maria do Socorro, a empregada envolta com a comida do almoço e a bagunça do Rollerjéquison na cozinha.

Tanto fez que uma foi. E já eram mais de dez e meia quando Maria não queria sair do banheiro.

- Abre a porta que quero entrar, bradava uma Marialva com a cadelinha maltês debaixo do braço e celular noutro. E este foi a salvação.

Pelo celular conseguiu que a irmã atendesse e abrisse a porta. E lá ficaram as duas com as duas cadelas e nada de ligar o chuveiro pois nem barulho de água se ouvia . Só as cadelas latindo.

Quase meio-dia e o celular de Zélha não atendia e não se sabia da sua situação no cabeleireiro. E as duas meninas encerradas no banheiro.

Marialva deixara seu quarto como se um vendaval houvesse passado: não se diferenciava o que era roupa de cama e de uso. Uma montanha de roupa suja e limpa se mostrava encima da cama e um colchão inflável com toalhas de banho emboladas barrava quem ousasse chegar ao armário.

Doze e quinze, Roller termina sua faina e vai arrumar a mala quando toca a campainha: era seu Bento preocupado e viera ver como estava a situação. Só tinha de arrumar a mala, tomar banho e procurar as passagens.

Prevenido, Seu Bento trouxera a patroa para qualquer eventualidade. E ainda sem notícias de Zélha.

- Oh, seu Roller tá encima da hora! A Kombi já está lá fora!

Chega Zélha, esbaforida e mais ainda quando nota que o banheiro ainda estava ocupado pelas filhas e as cadelas.

Mal ela deu um grito de exclamação, saem as quatro, duas filhas e as duas cadelas, em correria para os quartos e se trancam.

- Agora é minha vez, grita Roller. Tenho de tomar banho.

E assim entraram Roller e Zélha para se arrumar no banheiro.

Doze e quarenta e cinco, para desespero de Bento, saem bem belos do banheiro, direto para o almoço com as filhas ainda trancadas nos quartos.

Roller consegue que saiam dos quartos e almoçar. Marialva não sabia onde encontrar sua mala no quarto e acaba encontrando-a no meio das cobertas debaixo da cama. Na mesa, aquele problema de sempre: Marialva não queria comer o que era servido porque não tinha o seu suco de abacaxi. Melhor, Socorro, envolvida nas confusões, esquecera de fazer.

Zélha, mais preocupada com seu cabelo e unhas, não dava conta das confusões da viagem.

No entanto, lá pela 1 e 30 horas conseguem embarcar na Kombi e Seu Bento parte do Setor Noroeste a mil por hora entre um pardal e outro, para chegar ao aeroporto. Era acelerar e freiar a cada pardal! Estavam atrasados, claro.

Com quase uma hora de atraso chegam ao aeroporto e Zélha corre para a entrega das cadelas na área de bagagens. Só uma poderia embarcar com os passageiros e Latifa fora escolhida.

Na hora de retirar a Perereca da casinha, ela, rápida, dispara pelo hall do aeroporto e some no meio dos passageiros e bagagens.

A esta altura a família já era conhecida no aeroporto.

Meia hora depois encontram a cadela, mas era tarde: estava “grudada” noutro cachorrinho que também era procurado por sua dona. Até acabar o “problema” perdem o voo, mas são realocados num horário próximo.

Dois dias após chegarem no seu destino, o celular de Roller toca sem parar, o número era da firma de vigilância. Avisavam que o alarme da casa havia disparado e precisavam de sua presença, notaram que não havia ninguém, mas precisavam entrar, e não sabiam o segredo do alarme, que era acionado por sensor ótico-digital.

Roller acaba voltando, pois não poderia mandar seu dedo médio pelo correio nem por telefone, e descobre que Maria havia deixado o computador, o ventilador de teto e o ar condicionado ligados.

As férias já estavam comprometidas.