Tia Ritinha

O tempo passa, sempre, todos os muitos dias da vida de cada um, assim também deveria passar o de tia ritinha, a velha senhora que vive na casa ao lado.

Mas não, para ela o tempo não passa, ela finge que ainda tem trinta anos, faz ginástica, come moderadamente, e, quando olha, por acaso um espelho, vê a menina que foi, nunca a mulher que se tornou.

Não que o faça por mal ou por vaidade, simplesmente , embora para muitos o tempo não pare, pra ela parou, há muito. Muitas vezes, estranha que os homens, que antes viviam à sua sombra, pedindo um beijo, um sorriso, um abraço, já não sejam tantos, para não dizer nenhum. Acha que ficaram velhos, ou que encontraram uma mulher que, tolinha, pensou que poderia tomar seu lugar no coração deles, mas ela sabe que a um olhar mais malicioso, um chamado mais dengoso, eles estarão ali, de novo, a seus pés. Muitas vezes quando vê seus filhos, o mais velho já passou dos quarenta, pensa que eles são os garotinhos que corriam pela calçada, atrás da bola. Ficou surpresa quando, ainda outro dia, um de seus filhos, olhando uma foto em que tinha menos idade do que ele tem agora, comentou com os outros, nossa, como era bonita a mãe! Ficou a olhar, sem palavras, o homem, que dizia estas palavras estranhas, que não devia estar falando dela, já que o espelho não lhe demonstra mudanças tão aparentes. O homem em que se tranformara seu filho caçula, que já lhe deu netos, mesmo sem que ela tivesse perdido ( ou ganhado) um dia sequer da sua caminhada.

Olha mais além, e vê seus amigos com cabelos brancos, rugas nos rostos mostrando todos os dias que se passaram pra eles e pensa, consigo mesma, que envelhecido está o fulano, como pode se descuidar tanto, deixar o tempo passar tão depressa pra ele. Devia fazer como eu, que seguro o tempo pelo rabo e não permito que passe, que me enrugue, que me envelheça.

Então, naquele passar lento, começa a perceber que talvez não esteja tão jovem, tão igual a sempre, que mesmo em face da sua obstinação, o tempo teima em passar, cada dia, um a mais, e resolve lutar contra o tempo.

Aumenta sua jornada de trabalho, já bem árdua, professora, ainda, aposentadoria é pra velhos, não é? Aumenta sua carga de exercícios, melhora sua alimentação e vê, satisfeita, o tempo parar de correr, as pessoas de novo elogiando sua vitalidade, seu amor pela vida e pelas coisas da vida. E se olha menos nos espelhos, quase nem os tem em casa, já não permite fotografias, e se volta mais pra sua imagem que é a da jovem que vive dentro dela.

nadiaestrela
Enviado por nadiaestrela em 11/04/2011
Código do texto: T2902936
Classificação de conteúdo: seguro