Maratona de Buenos Aires - A Corrida!

A ansiedade mostrou-se dispensável, excesso de bagagem pelo qual eu não queria pagar, e não embarcou comigo. No avião, pude relaxar e iniciar a viagem. Na partida, a companhia era o superficial guia de viagens, algumas anotações de sugestões e dicas e meus planos para o dia seguinte. Para aquela noite, apenas reconhecer os arredores e atacar algumas empanadas. Era quarta-feira.

No dia seguinte, o céu estava limpo e a temperatura era bastante agradável. Aproveitei para circular pela cidade caminhando. Calculo que percorri uns 18 km ao longo do dia, em ritmo lento e com muitas paradas. Foi, digamos, o último treino. Ao final da tarde, havia previsão de forte temporal. Rotineiramente, carne vermelha faz parte das minhas refeições somente 1 ou 2 vezes na semana. Em Buenos Aires, isso foi alterado para 1 ou 2 vezes/dia! Ali, qualquer cardápio diferente seria desperdício de ótima oportunidade gastronômica.

Na sexta-feira no café da manhã, encontro o Marco e a esposa dele. Como apresentei no relato pré-maratona, ele é meu colega de trabalho e de corridas e também ia correr a maratona. Sob forte chuva, seguimos para a exposição da corrida. Naquele horário, estava bastante vazio, certamente em conseqüência do temporal. O kit era simples, camiseta, número, chip descartável e folhetos com explicações.

Minha disputa em corridas é simplesmente individual, quero melhorar minhas marcas pessoais. Os outros corredores são apenas estímulo, “coelhos”. Competitividade, acho que apenas numa eventual reta de chegada, faltando pouca distância. Durante o tempo que o Marco também treinou com a assessoria esportiva patrocinada pela empresa onde trabalhamos, fazíamos treinamentos diferentes. Ele era mais rápido e tinha melhores resultados em 5 e 10 km, eu era mais lento e mais resistente. O melhor tempo em meia-maratona era meu.

A partir de então, ele decidiu planejar seus treinos por contra própria e evoluiu muito. Fez coisas do tipo correr a meia-maratona da Asics perto de 1h45 “sem forçar muito” e depois ir passear de bicicleta com a filha. Coisa simbólica... de 20 km! Na planilha dele, dia de descanso pode significar nadar alguns quilômetros e ou musculação. E foi a único que vi chegar inteiro ao final da Corrida da Ponte. Em julho passado, ele completou a meia do Rio em impressionantes 1h 35min. Um tempo ótimo, evolução excelente, porém o mais impressionante não é exatamente a marca. Ele simplesmente manteve o pace (min/km) das suas provas de 10 km durante 21km! Definitivamente, isso não é comum! Em Buenos Aires, meu tempo de maratona tinha data e hora para ser superado...

Domingo, dia da corrida, chegamos na largada perto das 7:00. Poucos minutos antes do início, entramos na nossa área de largada de acordo com o tempo previsto. Como nas corridas brasileiras, essa divisão não é bem organizada. O clima estava absolutamente perfeito. Próximo a 16 ºC na largada e provavelmente em torno de 20 ºC na chegada. Pouco vento, parcialmente nublado. Irretocável. Diante de condições tão boas para correr rápido, era a oportunidade para melhorar as marcas pessoais. Depois do meio-dia, a temperatura aumentou, mas com a largada às 7:30, o impacto deve ter sido pequeno.

O ritmo realizado desde o início estava no limite da nossa preparação. Corríamos lado a lado com pace (min/km) de 5:20. Seguindo a estratégia prevista, a partir do quilômetro 28 reduzimos a velocidade e o pace ficou próximo a 5:30. Correr com alguém com condicionamento semelhante é interessante, ajuda.

Como disse, a chuva esvaziou a entrega dos kits, minimizando meu contato com outros brasileiros. Ao longo da prova, era fácil ouvir o português e ver a nossa bandeira estampada na camisa de muitos corredores. Um fato curioso: lá pela metade da prova, passado por um brasileiro “identificável”, me animo e solto um “Vamos Brasil!” Mais 4 ou 5 “não-identificáveis” respondem! Repeti o incentivo algumas vezes, com resultados semelhantes. Uma verdadeira invasão!

Meados de prova, proximidades da Casa Rosada, o Marco precisou de um pit-stop no banheiro químico. Ao final, o tempo parado se revelaria crítico... Adicionalmente, a quebra de ritmo atrapalha bastante... Após trecho acelerado, estamos novamente correndo perto.

É comum ver apresentação de bandas diversas ao longo do trajeto de uma maratona. É uma ótima estratégia da organização para motivar os participantes. Mas dobrar uma esquina e se deparar com uma apresentação de Tango, só pode acontecer em Buenos Aires! Próximo ao quilômetro 38, uso meu derradeiro gel de carboidrato e ouço uma banda tocando Bob Dylan. Grande incentivo! A estratégia era controlar até o 40º km e atacar os metros restantes.

Marco correu ouvindo música. Quase no quilômetro 40 ele avisa: “tá tocando I belive in miracles!” Pronto, era o estímulo necessário, o melhor doping psicológico possível! Ramones em geral, essa música em particular. Acelero em direção à linha de chegada. Corri 2,195 km em exatos 10min, o que pra mim, é um final de maratona muito rápido. Como resultado final, faço 3h 47 min 59s e melhoro minha marca em quase 10 min! Uma combinação de mais treinos com condições ideais no dia da prova. E o Marco chegou pouco depois, com tempo líquido de 3h 48min 32s.

Espero que tenha agüentado este relato-maratona até o fim. Ficar exausto da corrida faz parte do jogo, tédio com a leitura é dispensável... Se continuou a leitura até aqui, participou da viagem comigo. Obrigado pela companhia e até a próxima!

Boas corridas!

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