Romeu e Julieta

Já era tarde da noite quando Romeu chegou em casa com fome e encharcado da intermitente chuva que caia sem piedade sobre a cidade. Nas notícias do rádio a calamidade assolava a região sul com fortes ventos, granizo e tempestades. Ao adentrar o silêncio da residência, cuidou para não perturbar a sua família que devia estar fazendo as orações para dormir. Deixando a mochila na mesa e de olho no prato de comida que sua esposa Clara Luz preparou com carinho, Romeu deu um pulo para trás com o susto que levou quando a pequena Julieta veio correndo para os seus braços e com seus grandes olhos brilhantes fez um pedido de forma abrupta:

- Não esquece que amanhã cedo temos um compromisso! Que horas eu ti acordo?– cobrou o que fora combinado no almoço.

Romeu lembrou da proposta que surgiu durante o dia enquanto Julieta esmagava seu gato e ele advertia que os felinos tem um comportamento próprio e exigem liberdade e cuidados diferenciados. Ela concordava com a cabeça, mas na primeira oportunidade corria atrás do gato e jogava-o para cima. Arranhões e machucados nos braços e até no rosto era comum e acabava preocupando sua mãe Clara Luz que administrava os curativos com “babosa” para uma boa cicatrização. Numa dessas estripulias, Romeu foi enfático:

- Julieta, vamos pesquisar sobre os felinos, pois não quero que o gato fure teus olhos lindos.

No outro dia, pela manhã próximo das nove horas, a bela garotinha acordou Romeu de maneira eufórica e entusiasmada. Para sua surpresa, Julieta estava pronta e já corria em direção a sua bicicleta apressando o velho dorminhoco. Em questão de minutinhos, engoliu o café e foram de bicicleta em direção ao seu destino. Na cabecinha imaginativa da pequena ela se perguntava onde poderia aprender mais sobre o comportamento dos felinos? Seria no veterinário ou em algum amigo “gateiro”? Ia pedalando pelas ruas da cidade apreciando o movimento e deixando seu pensamento voar. Conversava com Romeu, cantarolava e acompanhava o movimento dos animais e das pessoas; pássaros batiam suas asas, os cachorros atravessavam a ruela e uma senhora grisalha que carregava uma bolsa marrom com legumes e verduras da feira.

Às margens da lagoa, Romeu e Julieta chegam ao local desejado: a Biblioteca Pública. Quando estavam estacionando suas bicicletas começaram a estimar quantos exemplares tinha no acervo da biblioteca. Julieta achara que era em torno de uns mil livros, Romeu deu um palpite de cerca de cinco mil e o bibliotecário Eduardo afirmou categoricamente que chegam a vinte mil. Adentrando o recinto, viam pessoas lendo e pesquisando e outros conversando baixinho.

Julieta solicita carinhosamente à Eduardo, o guardião dos livros:

- Estou pesquisando sobre os felinos e seu comportamento.

Prontamente, entre as prateleiras da biblioteca Eduardo buscou enciclopédias e outras publicações sobre os animais. Julieta aproveitou e retirou no empréstimo outro livro para a atividade da roda literária na escola. Saiu satisfeita e muito entusiasmada conversando sem parar. Chega em casa e devora os livros com naturalidade questionando a todo instante sobre as dúvidas que surgiam. Romeu e Julieta compartilham uma paixão incomensurável pela leitura e pelos livros. As amiguinhas na escola em tom de deboche, incrédulas perguntam porque Julieta não pesquisou na internet, no Google. Com calma e paciência, a pequena respondia com alegria que pesquisar nos livros é mais divertido! Romeu estava tranquilo considerando que Julieta estava mais doutrinada em relação ao seu gato, porém no menor descuido o gato voava e era esmagado pelo furor infantil. Clara Luz advertia em alto tom: “Larga o gato, menina!” Na sapequice de criança, Julieta ria e ficava com as bochechas avermelhadas. Olhava para Romeu que pensava com sorriso no rosto: “Ainda bem que as crianças não tem jeito mesmo!”

Publicado no jornal A Folha/ Torres e Jornal Litoral Norte RS.

Leonardo Gedeon
Enviado por Leonardo Gedeon em 14/07/2016
Reeditado em 15/07/2016
Código do texto: T5697879
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