UM CONTO DE FÉRIAS

Férias!

Oba!

Uma ocasião muito esperada.

Planos muitos bailavam em nossos corações, cheios de fantasias.

Eu tinha quase quinze anos nessa época.

Reclusa num Colégio de Freiras desde os 9 anos de idade. Uma liberdade relativa.

Mas eu era feliz assim.

As colegas, as freiras, a rotina, a disciplina e o aprendizado eficaz eram a preparação para a vida.

Cuidados responsáveis do meu pai.

Esperta, traquina, diziam que eu era inteligente.

Naquele tempo, eu já fazia poemas, levada pelos sonhos que bordavam a minha juventude, desnudada em sorrisos doces e trejeitos faceiros.

O meu mundo era muito pequeno, embora eu fizesse o curso ginasial fora dos muros do internato.

Era bolsista no Colégio Santo Agostinho, dirigido por freiras agostinianas.

Egressa da zona rural, sentia saudades. Sonhava com a liberdade da natureza florida do meu torrão natal: o riacho que passava no fundo do quintal, o monjolo, no seu árduo e cadenciado cantarolar, acompanhado pelo sonoro jato dágua, que impulsionava o seu trabalho.

Saudade dos passeios pelos caminhos floridos, no lombo do cavalo.

O céu, o cheiro do mato, da terra arada, o trinar dos pássaros alegravam a minha vida.

Como eu era feliz e não sabia!

Isso foi uma fase. Tudo é fase na vida. E tem que ser assim.

Agora, significavam saudades, naquele lugar distante, de arquitetura de concreto arrojada, bem diferente do meu antigo teto.

Ali, a vida era pautada pela disciplina, muito longe do palco de tantos folguedos de menina, do mugido do gado, do cheiro de café sendo coado e do leite fervendo, pela manhã.

Mas isso era preciso!

O futuro batia à porta e papai pensava no melhor para nós.

Homem austero, centrado, trabalhador, com grande senso de responsabilidade pela prole.

Ouriçadas com a chegada das férias, esperávamos ansiosas a hora da partida.

Fazíamos vinhetas e cantarolávamos ao léu:

“Tá, tá chegando

A hora das internas irem embora.

Papai me espera no portão!

Ai como é que vai ser bom!"

Dessa feita, fomos para a casa de uma tia, na fazenda, onde um córrego gorgolejava, com muitos seixos rolados e muitas árvores frutíferas, galinhas cacarejando, gado, cavalos e, ainda, os roçados plantados de milho.

À noite o céu estrelado bordava o limpo terreiro, rendilhando o chão. Que tempo bom!

Era quase a estampa da fazendinha de papai que nos viu crescer e tantas fantasias nos legou!

Ali, a fartura do pomar, as pamonhas roliças e gostosas, a comidinha feita no fogão à lenha, o feijão preto com arroz quentinho e costelinha de porco são lembranças que, ainda hoje, aguçam-me o paladar.

Que saudade!

A carne era frita e enlatada na banha de porco, para conservação, pois não havia geladeira.

Tudo muito empírico, gostoso e sadio.

Eu era quase uma mocinha. Sentia-me o aflorar da libido.

A feminilidade fazia-me bonita, faceira.

As mudanças estampavam-se no meu corpo de menina-moça, exibindo-me as curvas, fazendo-me elegante.

Nessa ocasião fomos à uma festa, um baile, (um pagode, como era por lá conhecido) numa fazenda vizinha.

Era a primeira vez que iria à uma festa dançante.

A empolgação tomava-me o coração!

Tudo muito novo, diferente para mim!

E agora na condição de mocinha, cujas pretensões afofavam a mulher que pulsava em mim.

Na zona rural as meninas namoram cedo, assim, logo me apareceu um pretendente.

Sorriso fácil, olhar cativante...

Uma máscula figura que me ouriçou os hormônios, num gostoso tremor.

Um mancebo principesco que se conduzia num majestoso cavalo. Faltou ser branco para completar a tela de romance.

No verdor de sua idade, era falante, galanteador. Isso é inerente como arma de conquista.

E eu gostei.

Sei que o meu sorriso o encantou.

A corte logo se fez e meu coração pulsava altaneiro, descontrolado, abismado com a nova fase.

Não sabia que o amor era tão gostoso.

Como me lembro disso!

Mas papai jamais aprovaria e as férias estavam no final.

No dia seguinte retornaríamos ao Colégio.

O ano letivo estava prestes a começar e eu teria que me esforçar.

Como lembrar é viver, eis a lembrança que guardei de um tempo tão distante.

O meu ingresso na arte de ser mulher!

Não sei se posso chamar de primeiro namorado.

Mas que gostei, ah, isso eu gostei muito!

A noite não pode conciliar o meu sono, pois a alegria sacudia-me, aos borbotões, em desejos mil, diante das lembranças do que me havia acontecido.

Lindo episódio que marcou um tempo, machucou meu coração e se foi qual revoadas de pássaros ao entardecer.

Até hoje, parece que vejo e sinto aquele olhar másculo que me fitava com carinho, afagando o meu ser/mulher, visivelmente enamorado.

Naquela noite, ao som de um violão, aos refegos de passos de dança, lastreado pelo salão e sob uma lua matreira que entrava pela janela, eu me senti MULHER!

Simples assim, a minha estreia!

Genaura Tormin
Enviado por Genaura Tormin em 18/12/2016
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