Os erros iniciam pela interpretação de texto

Se eu respiro? Ora, como não? Se é errado respirar, morrerei respirando! Como quem se despertou para a pergunta, eu durmo com os anjos; desperto com o alarido dos pássaros; cuspo o catarro matutino na pia do banheiro; desembaraço os cabelos em frente ao espelho; calço os sapatos vermelhos; passo batom de mesma cor nos lábios; visto a roupa engomada na semana anterior; ponho a ração temperada com salmão para os meus filhos domésticos; boto a cara para fora da janela para saber como está temperatura ambiente e sorrindo feliz para mais um dia, caminho emperdigada em direção à mesa posta. Viver de um sujeita simples, que divide a felicidade em doces de compotas.

Tomando o desjejum, folheio o diário em formato de pasquim. Em suas páginas tem de Além-Tejo, à tudo de tédio. Aldabras, espadas e alforges. Numa delas está escrito que a economia vai bem, obrigado. Cavaleiros de São Jorge. Na outra, o toque de primeira, a bola balançando a rede, o bailado das pernas que dançam sobre a redonda, alucina, inebria e a ilusão do desalento de vidas, desanuviam. Em mais outra, a celebridade é o centro das atenções. É mais um filho dela que irá nascer; em noites escuras e dias claros, sóis se põem; e o adultério em alta, digno de palmas e louvor. Para esses, os furúnculo explodem em erupção, porém, não causam tremendo ardor.

Mas o que isto tem de importante, fortunas em petróleo, hoje como antes, se comparado ao balouçado das bandeiras que circundam minhas estradas. Em cada uma delas, a inscrição insinua que que por onde eu passar, por um salpicado de pétalas, serei reverenciado. Serei eu merecedor de caminhar sobre um tapete de flores? Rosas, dálias, lilás, ipês de várias cores, ornamentando minha amada, a rainha da sucata, fria de corpo, morna de palavras, insípida de espírito, vagueia a mariposa ao redor da lâmpada incolor.

Soprando oboés e flautas, hordas de anjos pedirão passagem. Dos céus em revoada, virão. Saltitando leve como o balanço da pluma em queda livre, respirarei amores. Trevas não existem para quem é clareza, transparência, luz e iluminação. Roda o mundo. Gira tudo em um ser vagabundo. Suspiro a dor, grito o silêncio, torneio pavores. E como quem agoniza a morte, sigo vivendo a vida em seu eterno continuar... até quando o mundo rodar.

Existem lugares tão oportunos e extasiantes, que os entrantes nem dão conta do cativeiro que frequentam... entram às furtivas e lá liberam, exalam o feromônio do desejo, barganham as mercadorias mais nobres que possuem. Certamente, é o melhor que tem para oferecer aos inocentes e cegos clientes madrugadeiros. No dia seguinte, alguém é processado por crime passional... A morte é uma poesia nunca lida pelas vistas e por passar ilesa, nunca decorada pela mente.

No outono, as folhas caem. Na primavera, refazem-se. As árvores se revigoram e a folhagem adornam as saias das copas. Envelheço com as rugas. Renasço com as plantas. Venho do erro e no erro, não pretendo permanecer; pois quem erra continuamente, o próximo não ama. O que só vale, quando o próximo está próximo. Ação consciente não é ciência exata, como também não é ciência humana; em contrapartida, consciência possui, quem não deixa o erro se propagar.

Finalizando essa prosa poética, cheia de erros pela falta de métrica, tal qual a feiura que escreverei, pequenos focos de erros, são como pequenos focos de incêndio, que no pasto seco do conhecimento humano, podem se alastrar. No poço raso, banho-me num mergulho profundo. Errar indefinidamente é fogo... e permanecer no erro, é queima de pensamentos livres e inquisição de almas vivas. Contudo, com os acertos cavalgando e esporeando os erros, um dia escreverei sobre a vida.

Nada em livros, menos ainda nos filme, encontro os erros nos textos, ao viver a vida; pois os erros da vida, é quase o mesmo que uma vida fomentada pelos erros. Desalentadora, esguia, moça, ilusória, louca, vida bela... desfilando o salto alto sobre o tapete vermelho da passarela, em direção à finitude, segue ela.

Porém, todavia, se não houver tempo suficiente para erradicar os erros de interpretação encontrados nesse texto, os quais os dicionários e a poesia validam, vale o que escrevi sobre as controvérsias do belo, que não passa de ilusão sensorial; pois o gosto doce do mel, é puramente defeito do amargo fel. Ou a afirmativa está errada, devendo, portanto, ser correta e confiável quando escrita ao contrário? Ah, deixe assim mesmo: erros são erros e se a gramática não reclama e exige a correção, não será o texto em si que irá fazer isso pelo idioma português; sobretudo, para penas que escrevem coisas irresponsáveis e impensadas, textos inescrupulosos.

Edificando um Novo Mundo

Favela é o único empreendimento residencial que não termina nunca. E por que deveria terminar, se o apocalipse é crença de religiosos. Aqui meu amigo, trabalho não falta para pedreiros e serventes. E o melhor, sem as chatices de aprovação em prefeitura, assinatura de responsável técnico, serviço que cobram valores acima da realidade dos favela dos. Aliás, o maior e mais ilustre arquiteto brasileiro, o famoso e irrepreensível rabiscador de traços Oscar Niemeyer, era socialista e nos defendia como poucos. Porém, se dedicou as grandes e valiosas obras do governo.

Nunca, jamais se meteu a jogar um traço concernente a uma favela na folha de papel. Devia ter lá seus motivos para não ter enfrentado as construções em forma de ondas marítimas de nossos barracos. Puxa daqui, estica de lá, apruma acolá e vai subindo as construções lego. E o final, para quê final? A favela foi a inspiração para a sociedade alternativa; foi a gênese do viver em agrupamento. Um em cima do outro, enquanto um sobe, o outro desce. Vidas desniveladas. Movimento constante. Vai e vem constante, tal qual as grandes metrópoles. Ninhos de víboras; buracos de formigueiros. Túneis de ratos. Ratazanas e camundongos. Enfileirados, segue o tropel barulhento!

Iniciar uma favela é semelhante a traição e começou, difícil é parar. Aliás, traição é o que não falta nos barracos. É o Zé com a Zefa; o sô Mané com a Mazé; o Joaquim fubá com a Raimunda munguzá. E tome festa bundalelê nos barracos. Rola a noite toda. Sujeira é o que não falta e o resultado somente após 9 meses. Trair e coçar é começar. Para favelar, é só desbarrancar o barranco com picaretas, pás, enxadas, para fincar os barracos.

Na favela é ronco de makita dia e noite. Não para e nem deve, pois as construções lego não podem parar. Tudo à base do meia... meia colher, meio saco de comento, meia pá de areia, meio saco de brita, meia boca. favelado nenhum sente frio. Todos andam calçados e lógico, com meia. Passou em suas ruelas e becos, botam meia em qualquer um. Vestem ratos e baratas. Cães e gatos também. À noite botam meia nas mulheres friolentas. Os tomam meia cerveja para aguçar a meia foda dos meia-bocas.

Da janela de meu apartamento vejo uma. Antes que pergunte, o que vejo; vejo ela, no quarto do barraco da favela. E enquanto escrevo, já subiram mais uma fiada. Tijolos amarrados em tijolos. Lá vão as vidas subindo ao limite do céu. Já está no oitavo pavimento. Confiam que o Criador é brasileiro e por ser um Deus misericórdioso, não soprará os tufões e ciclones para o Brasil. Tomara que não, porque se chegar aqui... não ficará tijolo sobre tijolo; telha sobre telha; azulejo sobre azulejo nas paredes. Piso sobre piso sumirão. Monturo sobre monturo, rumas de monturo é o que sobrará.

E as pessoas, ratos, cães, televisores, carros, smarthphones, geladeiras, pacoteiras de maconha, baratas, para onde irão? Quando acontecer eu escrevo. Por enquanto são apenas profecias enviadas a mim, pelo espírito de Messias. Diz ainda que terrenos e áreas verdes é o que não faltam num país gigantesco como o Brasil.

Materiais. Caminhões esperando para descarregar materiais. Engarrafamento na única rua de acesso às inúmeras quadras do loteamento. Labirintos de becos. Emaranhado de ninhos. Gatos (não é gato de água ou de energia) miam eletrocutados por todas as saídas dos becos. Um berro na passagem: "vai pegando o beco, já seu marica"! O que significa a palavra marica na linguagem dos manos? Pá... pá... pá. Três estampidos. Esses são os sinais que apagam as curiosidades dos bisbilhoteiros. Corram... escondam todos, que já vem mais: pá... pá... pá. Esses foram para os cínicos e malfeitores. Um galo solitário canta no fundo do armário. Galinhas abatidas. Contrabando de penosas. De papagagaio, de tartaruga, de câgados, de pássaros pretos, de pintassilgos, de azulão, de trinca ferro; de cocaina; de gente; etc. Poderia parar Mutável! Claro, já parei... desculpe-me, fui longe demais. Talvez no Japão.

Sem tirar os olhos do rebuliço, estico o braço e alcanço os binóculos. Levo-os direto às vistas. Inacreditável! Uma séquito de formigas lava-pés atravessam a mesas, escalam as prateleiras à procura de algo. Uma descobre; deve ser a líder. Adentram o pote de açúcar. Devem estar famintas para adoçar o bico e obviamente, aliviarem-se do amargor das notícias dos tiroteios que rondam os corredores e becos.

Favela é o único empreendimento imobiliário que não termina nunca; e além do céu ser o limite, merecidamente, os habitantes recebem auxílio permanente do governo. A fila anda, o próximo é chamado e o estoque de leite vai sumindo das prateleiras dos depósitos. Uma senhora chora, outra reclama a data de revalidação do vale-leite. Em outro beco, a fila caminha, o povo alardeia e os estoques de gás butanos diminuem consideravelmente.

Histórias não apenas da geração, mas das construções lego, ou operação miojo lamen? Liquidação total para queima de estoque! Honestamente, passou da hora de reconstruir o mundo.

Hasteg#edificando um Novo Mundo é o endereço físico das favelas. Se curtiu, vem para favela você também; ou vai fazer como fazem os políticos, que nos procura somente em épocas de eleições? Arreganhou os dentes de porcelana, sorriu a falsidade e gesticulou com o polegar, o positivo, pode saber que querem nosso voto. Porém, é sabido que nas florestas frequentadas pelos burgueses, só os ricos respiram oxigênio puro e filtrado... na favela, o que nos resta é um ar abafado, asfixiante, ignóbil e carregado de miséria. A começar por mim, que entoquei com família e meus animais domésticos nos monturos produzidos por nós e não saímos mais...

Mutável Gambiarreiro
Enviado por Mutável Gambiarreiro em 12/09/2017
Reeditado em 31/10/2017
Código do texto: T6111709
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