Clube da Esperança

Com sorrisos convidativos, Rino (o rinoceronte), recebe os convidados, que chegam para a reunião social do Clube da Esperança. A noite está agradável e tudo corre bem, exceto por um pequeno episódio que desagradou a todos, Corina (a coruja) chegou lamentando que seus vizinhos humanos não a deixaram dormir durante o dia ouvindo “Eguinha Pocotó”, tanto reclamou que todos os presentes gritaram aborrecidos: “Cala a boca, Magda!”.

Monkey, o macaco, um animal viajado, que já esteve em diversas praças, respeitadíssimo entre os membros da comunidade, pede a palavra, questionando se alguém saberia explicar qual a razão pela qual humanos, matam humanos se não é para comer.

Aguardando um tempo pela resposta, não a obtendo, prossegue: _ Vi guerra e cadáveres ambulantes, tenho visto muita fome. Muitas pessoas morreram, outras tantas sofreram queimaduras ou foram atingidas por tiros; como se não bastasse, convivem com uma bomba mais mortífera: a fome.

Milhares de pessoas perambulam pelas ruas procurando comida até nos lixos. Abatidas e derrotadas, sentam-se nas portas de suas casas, parecendo cadáveres ambulantes. Os rostos consumidos, os olhos fundos e a expressão de quem já não tem mais esperança alguma. Tocados em seu âmago, devido ao impressionante relato, ninguém ousava dizer nada, e o silêncio se fez profundo.

Nesse momento, Léo fitou Corina com olhar pensativo, pois já havia passado por situação semelhante na Reserva Ambiental onde vivia; os “humanos” que a visitavam desrespeitavam os avisos expostos, como: “Não joguem lixo na floresta, não façam barulho, não joguem alimentos pros animais”, pois na noite anterior, fizeram um churrasco no acampamento, provocando a maior algazarra. De longe era possível identificar a música do "Bonde do tigrão”.

A coruja Corina, com toda a sabedoria, diz: _ Amigos, estamos aqui reunidos com o propósito de trazer Esperança, e já é hora de levarmos nossa palavra aos humanos. Somos o exemplo de que tudo é possível quando se acredita, e com união e coragem, respeitando as diferenças podemos mudar o mundo. Onde há trevas, trazer luz e esperança. Onde há tristeza e desavenças, trazer a paz e alegria.

Corina, que sempre se destacava por ser muito sábia, continuou a falar: _ Amigos precisamos pensar que apesar de existirem pessoas que por não terem um coração de amor e por não serem grandes, tentam nos dizimar, não conseguirão, pois mais forte é o amor que nos une, a coragem de lutar para nos defendermos. Portanto, temos que elaborar um plano. Vamos procurar pessoas que tenham um bom coração e se preocupem realmente com a natureza, com os animais e não somente com aqueles que querem destruir a nossa terra, as nossas matas, pedindo-lhes sejam mais severos no cumprimento de suas leis.

Toda a bicharada entreolhava-se, as palavras da coruja eram realmente sábias e sérias. Todos concordaram. Continuou ela: _ Os humanos constróem destruindo e pior, destruindo as suas próprias vidas com ações desastrosas.Vamos dar um basta aos homens violentos, que agridem a natureza, que não nos deixam curtir nas manhãs o som das nossas irmãs aves, um banho em águas sem poluição, que limitam os nossos vôos, colocando-nos em gaiolas ou viveiros. Como querem ter esperança, destruindo a dos outros? Matando o ar, secando a terra... Eita, humanos! E dizem que têm o uso da razão.

Nesse momento, Lupus pede a palavra. _ Amigos, desde os tempos mais remotos nós, os lobos, éramos respeitados pelo homem. Seus ancestrais nos pintavam nas paredes das cavernas, éramos o símbolo do seu lado selvagem e indomado. Acho que no fundo eles desejavam ser livres como nós e, como foram se tornando cada vez mais escravos de suas ambições, do seu desejo de poder e de sucesso, passaram a nos perseguir. Então nos transformaram no vilão, no "lobo mau" que assusta as crianças e come a vovozinha, tudo por inveja. Sim, os homens estão destruindo tudo porque não conseguem se tornar poderosos como Deus e, invejando a Sua obra, querem acabar com tudo.

Todos se calaram, pensativos, lamentando o ponto a que chegou o homem, de invejar o próprio Deus. Mas a girafa, com toda a sua delicadeza, diz: _ É verdade, mas Deus com a sua sabedoria nos deu a oportunidade de saber identificar o verdadeiro sentimento humanitário.E é por isso que estamos aqui; se não fossem alguns desses homens, não teríamos a chance de mudar. Só temos que entender que somos criaturas invejáveis, pois temos nosso próprio mundo, sem precisar de tecnologia; somos felizes, pois temos amigos sem precisar muitas vezes comprá-los. E somos felizes assim, livres.

Rino se levanta e, dando um tapinha nas costas de Lupus, diz: _ Nem tudo está perdido, amigo. Os homens começaram a se dar conta de seus erros e já existem muitas Ongs lutando em nossa defesa, especialmente dos nossos amigos ameaçados de extinção. O mico leão dourado, por exemplo.

Neste momento, houve um silencio profundo... Todos de cabeça baixa se colocaram a pensar. Eles estavam com uma grande responsabilidade. Era preciso um plano para parar a ganância do homem e teria que ser certeiro. Foi aí que Léo, o representante dos felinos teve a idéia de chamar a Sra. Sofia e sua netinha Serena para participar da reunião. A Sra. Sofia morava em uma choupana há muitos anos, era uma pessoa encantadora e amava a natureza e seus habitantes; sua netinha Serena era uma menina de 13 anos e gostava muito dos animais. “Com certeza elas nos ajudarão a entender melhor os homens, para que possamos elaborar nosso plano”, pensou Léo, que imediatamente propôs a Canys ir pessoalmente fazer o convite, por conhecê-las, pois muitas vezes havia estado na casa de dona Sofia.

Todos ficaram contentes com a idéia de Léo, pois nada melhor do que a Sra. Sofia, que morava na floresta e já os conhecia para ajudar! E assim concordaram que o Canys deveria imediatamente cumprir sua missão.

Mal havia terminado a reunião, ouviu-se o alvoroço de pássaros em revoada, como se algo os tivesse assustado.Um cheiro forte de fumaça invadiu o Clube da Esperança e todos correram para fora, onde viram esquilos saindo das árvores apressadamente, gritando: _ Fogo! Fogo! Salve-se quem puder, a floresta está em chamas! Foram saindo de suas tocas e ninhos, tentando fugir o mais rápido possível, salvando seus filhotes e os mais velhos e doentes, que já não podiam correr como antes.

Os animais já estavam acostumados com incêndios causados por balões, pelos campistas irresponsáveis que deixavam fogueiras acesas, cigarros e brincavam com fogos nas festas que faziam e desrespeitavam as placas e avisos colocadas nas estradas, colocando a natureza em constante sobressalto.

Neste momento, ouviram tiros de espingarda. Rino, que orientava a todos a manterem a calma, se cala. Tatiana (a tartaruga), fica muito amedrontada, pois sabe que num momento de desespero será a maior prejudicada, já que não tem agilidade em seus passos. Então começa a chorar. Pascoal (o coelho) seu amigo a consola, dizendo: _Tati, não a deixaremos aqui, somos amigos e estaremos sempre unidos. Não tenha medo.

As palavras de Pascoal são interrompidas bruscamente por estampidos de arma de fogo, pois caçadores haviam atirado num lobo guará, que morrera imediatamente, não resistindo aos ferimentos. O incêndio havia sido iniciado por eles, que haviam jogado uma bituca de cigarro na grama ressecada pelo sol.

Passado o alvoroço, todos se aproximam, ainda temerosos, expressando a dor pela perda do amigo Guará, o último dessa espécie que habitava por estas bandas.

Todos choram. Lupus uiva longamente, numa tristeza que se espalha por toda a floresta. Todos cantam uma linda elegia, como última homenagem ao nobre amigo, num lindo coro de vozes de todos os timbres: pássaros, lobos, leões com seus graves rugidos, ao som do gemido de saudade do vento... E finalmente elevam uma prece a Deus, pedindo que salve a humanidade.

Todos unidos na mesma dor e conscientes da dura realidade, que se anunciava cada vez mais próxima, agora sabiam que mais do que nunca, algo teria que ser feito, pois corriam extremo perigo, nenhuma espécie estava a salvo da destruição e da maldade humana...Mas como detê-los?

Lena (a pomba), que até então se mantivera calada, propõe a Canys que retomasse a missão que lhe fora confiada, pois não poderia haver mais demora. Este sai imediatamente para cumprir sua missão.

Chegando à choupana, Canys percebeu que a Sra. Sofia ainda estava muito triste, pela perda de seu amigo Guará; então, num momento de reflexão, deitou-se em sua sala... Após alguns minutos, Léo começou a explicar à senhora e sua neta que precisavam de sua ajuda. A Sra. Sofia ficou lisonjeada com o convite e prontamente o aceitou.

Dona Sofia, como a mais antiga habitante da cidade, convocou um reunião para debater o assunto, bronqueando com os caçadores por haverem matado o lobo guará. Pedro, um dos caçadores, replica dizendo: _ Mas, minha senhora! Nós atiramos para defender a sua vida e a de sua netinha.

Em prantos, responde-lhe a senhora: _ Mentira! Como defender-nos, se ele era o nosso companheiro de todos os dias, que pela manhã vinha visitar-nos e nos protegia contra a ameaça de estranhos?

_ Ah, não entendo mais nada! - Disse Pedro, envergonhado pela reprimenda. - Qualquer criança de cinco anos sabe que todo lobo é mau. A senhora é uma mal agradecida, não reconhece o bem que lhe fizemos?

_ De que bem fala? Destruindo as florestas, eliminando os animais, aprisionando-os, caçando sem necessidade?

Dona Sofia era enérgica, e quando falava todos a respeitavam, pois além de ser a moradora mais antiga, muito havia contribuído para o progresso da cidade. Todos na reunião são chamados a contribuir com sua opinião, e são unânimes em afirmar que se há leis, estas devem ser cumpridas rigorosamente. Diante da confissão de Pedro, o delegado dá lhe voz de prisão, comunicando-lhe que poderá pagar sua pena em serviços comunitários.

Dias depois, uma comissão de humanos, tendo à frente o Juiz de Paz da cidade, Dr. Albertino, visita à reserva ambiental, e comunicando a Rino que dali para frente ninguém mais vai lhes ameaçar a existência, e que Pedro vai passar a proteger a reserva em cumprimento da sua pena.

Difícil é descrever a alegria de toda a bicharada, após a partida da comissão. Para comemorar, resolveram fazer uma alegre festa; no céu azul e límpido esvoaçavam lindas borboletas multicores. Mas em meio a tanta alegria, Léo sobe em uma pedra e solta um urro vigoroso, que assusta a todos, no silêncio, lembra-lhes que a luta prossegue em outros lugares, que não deveriam acomodar-se. Por hoje poderiam comemorar, mas amanhã começa outra jornada.

Texto do Projeto Revelando Escritores