Ziguezagueando 18

Jovita, chegou chegando. Gritou: Huuugo! Deu alguns passos diminutos em volta dos jovens, que sacudiam freneticamente para o alto o homem. A moçada, quando ouviram aquele gritinho fino, estridente, na medida que olharam para ver de onde vinha a voz, soltaram Hugo, que caiu, se esparramando ao chão. O grupo saiu em disparate, sem ao menos olhar para trás, tomaram rumo do canteiro central da avenida, paralela a praia, desaparecendo por entre as pessoas no calçadão.

Caiu meio que desacordado, a pequena, fragilizada com o susto que a cena estampou, foi logo agachar ao chão. Sentou na areia, recostou a cabeça de Hugo em seu colo, que estava sem sangue no rosto, mãos frias, tez suando como vidro de box em banho quente no inverno, literalmente desacordado.

Sorte que aqueles agitadores não mexeram na carteira, que estava intacta no bolso da calça. Hugo, estava sujo, suado, com a calça surrada, manchada, a camisa, não sabe como , mas amarrada na cabeça. Parecia um pirada da modernidade.

Jovita radicalizou, via que o belo afrodescendente não acordava, foi até a beira da praia, molhou seu vestido, que estava guardado no embornal, trouxe-o ensopado, espremendo-o no rosto de Hugo, que acordou instantaneamente, tossindo e sacudindo a cabeça.

A primeira pessoa que Hugo avistou, foi Jovita, olhando dentro dos olhos dele, debruçada sobre seu corpo, que tinha chacoalhado desesperadamente .

Hugo paralisou, pegou nos dois ombros de Jovita, afastando-a dele, que sentou ao seu lado. Ela, com os olhinhos apertados, como criança que acaba de tentar salvar o bichano de água quente, fica amiúde, na espreita.

Hugo desamarrou da cabeça aquilo que foi camisa um dia, forrou ao chão, e sentou sobre ela, de frente para Jovita.

Num tom desencantado, vencido pela batalha, se revelou, não no psicólogo, no cidadão,no homem da sociedade, ou até mesmo no fracassado náufrago da vida afetiva a dois. Mas arregalou o par de olhos negros, estufando-os para fora dos longos cílios que mamãe tinha permitido que tivesse, e falou: “O que você está arrumando, menina! desde que te conheci, tens criado fuga e mais fuga, sigo você pelos seus rastros, que farejo no invisível. Encontrando-a, logo arruma outra retirada inesperada. Quero te ver! enxergar você mulher. Até aqui, sei que usa braços e pernas, cabeça e vontade como homem para sobreviver, mas onde está você, mulher? Preciso encontrá-la para ver se me acho no masculino que está oculto em mim, virei as costas para a completude interior. Solidão não é vida! Solidão não é vida! Quem sabe me curo do me bastar no deserto?”

Começava anoitecer, o silêncio e a maresia passaram ser sentidos pelos dois. Os banhistas foram se evadindo, até os pássaros que comiam o lixo na areia, desapareceram. As primeiras luzes dos quiosques foram vendo serem acesas ao longe.

O mar nessas horas, muda o tom, aquela orquestra que ele toca, ouvida somente pelo coração, muda de ritmo e melodia ao crepúsculo, passando resgatar na mente um quê de ancestral no humano. Quem pela praia passa, fica meio que no primitivo, e no hoje. É assim que passaram estar.

O sol avermelhado, baixando no horizonte, as águas tremulando, sendo interrompidas delicadamente por ondas rítmicas, que se escabelavam até a areia, deu cena, e levou expressão para os dois continuarem no enfrentamento subcutâneo das suas almas, que tomaram caminhos mais profundo, através do diálogo que se iniciou com Hugo naquele instante.

Márcia Maria Anaga
Enviado por Márcia Maria Anaga em 18/06/2018
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