Um dia quase igual ao seu para chamar de meu.

É segunda-feira, mais um dia de trabalho. Aquele dia em que o cansaço adormecido e o vigor não recuperado se encontram no pátio da escola. Acordo, ainda de olhos fechados, penso: “Mais um dia, tenho que levantar.” Então, com os olhos ainda meio fechados, sento-me na cama, faço uma oração rápida e, com o peso de quem acabou de chegar do trabalho, ponho-me de pé.

Abro a janela do quarto e deixo a luz entrar. Sim, a luz expulsa a tristeza, ainda que o cansaço fique.

Tomo um banho quente, aliás, sei que é uma má ideia tomar banho quente pela manhã, já que o banho quente ajuda a relaxar. Mas, a água está muito fria mesmo;

No fundo, sei que é pior a água quente, mas não encaro o frio. Talvez a água fria deixasse-me com mais energia para o dia que se apresenta. Saio, rapidamente, encarando as ruas e a vida.

A rotina se estende como um lençol bem passado, sem curvas, sem surpresas. É verdade, contudo, mesmo um lençol bem passado deixa-se cair aos lados da cama. Então, quem sabe uma surpresa acontece depois da curva que aparece ao longe?

De fato, não existe uma rotina igualzinha à outra. As cenas nunca se repetem da mesma forma. Duas folhas da mesma árvore jamais caem de modo idêntico sobre a mesma rajada de vento, cada uma tem a sua própria dança. As pessoas podem até ser as mesmas, mas mudam os assuntos, as roupas, as passadas, as preferências. É cedo, os muitos pombos da praça fazem uma espécie de coreografia, levantam voo e voltam ao chão, parece que estão alongando as asas.

Pois bem, preciso alongar-me também.

Volto meus passos e minha atenção para o trabalho e vou seguindo o meu script que, na verdade, não é falso ou lisonjeiro.

“ Bom dia, senhor.” “Bom dia, senhora.” “Obrigada, volte sempre. ”

Fim de expediente, hora de voltar para casa.

Volto pelas mesmas ruas, as cenas se repetem quase idênticas, ao fim do dia: pessoas apressadas em seus veículos ou a pé vão e vêm levando seus sonhos, seus cansaços, seus pães para o café da tarde, suas angústias, suas alegrias...

A rotina se repetiu. Nada de extraordinário aconteceu, nem uma surpresa boa; graças a Deus, nem uma surpresa ruim.

Saber onde estão minhas coisas, minha casa, meu emprego e, principalmente, as pessoas que amo faz a rotina valer a pena. Onde o sossego e o tédio se confundem, esclareço-me a mim mesmo que o sossego é maravilhoso. Hora de dormir, sabendo que tudo transcorreu dentro do esperado, sei que tudo transcorreu bem, tenho motivos para agradecer: Minha gratidão é para Ti, Senhor.

Deito-me novamente para dormir e antes de apagar resolvo, meio oscilante:

Amanhã, corto os cabelos e mudo-lhes a cor.

Amanhã, arranco as mangas das minhas camisetas.

Amanhã, abro as janelas do meu quarto e da minha alma e deixarei a luz entrar e tudo de ruim sair.

Amanhã, mudo minha cama de lugar.

Amanhã, mudo o meu trajeto.

Amanhã, rompo o casulo da rotina e deixo a borboleta da novidade de vida voar livre.

Só não sei ao certo como, mas alguns ingredientes importantes para essa receita dar certo eu já tenho: o incômodo e a vontade de mudar.