A gente que flerta na calçada

Os passos vão divagando na medida em que olhos dele vão encontrando os dela.

Ela sorria ao caminhar.

Ele falava algo a que ela não deu fé, porque têm vezes que a nossa voz foge ao conforto do pensamento.

Mas se é de pensar em fazer e fazer, você tem de ser rápido porque segundos não demoram horas, como quer a poesia. É assim que olhares trocados viram sorrisos e balbucios

- Oi? - pra ele.

- Oi? - pra ela.

E vão prosseguindo, cada qual na sua direção. Até que o caminhar vai divagando mais; e mais; e para. O rosto foi-se embora com o resto do corpo, e o que ficou foi o perfume. É o que concluem.

O(A) leitor(a) faça um esforço em imaginar um véu transparente e perfumado que tenha se estendido pela calçada, e recorde o perfume que sentiu acariciar a face, puxando aí uma lembrança boa ou duas.

Ninguém vira o rosto para saber se está olhando de volta. Para quê? a esta altura qualquer um dos dois já cruzou uma das esquinas daquela rua; mas continuam por mais uns instantes daquele jeito, inertes. Um voltou os olhos para o próprio smartphone, deslizando o polegar pela rolagem para definir a nova playlist. A outra ficou na frente duma livraria lendo os títulos dos livros na vitrine. Lê o título, autor e preço, e passa para o próximo.

Mas, repito, pouca coisa dura mais que segundos, e dali pra frente escutam-se passos.

Israel Ramon
Enviado por Israel Ramon em 12/01/2019
Reeditado em 13/01/2019
Código do texto: T6548929
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