Procissão de Sexta-Feira da Paixão

No relógio da Igreja Matriz eram ouvidas as oito badaladas. Já era noite e todos já concluíam que eram vinte horas. As horas exatas para que o padre iniciasse as cerimônias em comemoração à Sexta-Feira Santa. Um dia muito esperado pela população. Era dia santo e de guarda para todos. Feriado nacional e dia de muito respeito. Um momento muito esperado por todos, pois, no sermão a ser proferido, estaria pregando o novo vigário, recém ordenado padre e naquele momento seria ele o pregador.

O jovem sacerdote era muito inteligente. Foi um dos melhores alunos no curso primário, no curso ginasial e nos cursos de Filosofia e Teologia. Era muito respeitado pela oratória. Falava-se muito bem. Trazia o discurso sempre direcionado para cada casta social. Muito brincalhão e um ferrenho contador de piadas, estava ele, ali, junto ao vigário local, rodeado pelos auxiliares coroinhas, pelos cantores do coral local, dos figurantes e sendo visto e admirado pelos conterrâneos e outros visitantes que aguardavam a pregação.

Do outro lado do palco montado exclusivamente para a cerimônia, estavam dois amigos de mais ou menos dezessete anos cada. Eram velhos amigos de infância, de adolescência e seriam futuros compadres, padrinhos ou algo que lhes acontecesse no futuro. Estavam calados e muito tristes, pois as festividades não estavam bem para ambos. No mesmo dia, os dois terminaram com as namoradas. Era somente tristeza para cada um. Estavam amargurados e sempre esqueciam de tocar no assunto, mas era de imediato quando um dizia que no ano anterior ele estava com a namorada. O outro, da mesma forma, também lembrava do passado. Poderia ver algumas lágrimas surgirem nos olhos de ambos, pois eles amavam verdadeiramente as namoradas. A vida estava iniciando para ambos, porém sem as companheiras do futuro.

Uma senhora subiu ao púlpito. Estava ela vestida toda de preto. Usava-se um véu, também da cor preta, muito longo. O vestido dela na cor preta, o qual combinava com os sapatos e as meias. Tudo na cor preta. Com um pano onde se via pintado a face de Cristo, ela iniciava o cântico chamado de “Canto da Verônica”. Muito bonito e todo ele cantado na língua latim. Era acompanhada por um coral e parte da banda de música local.

Após a apresentação, o recém pároco pegou o microfone e iniciou o sermão...

- Aos homens que passam por este caminho. Às mulheres que labutam em suas casas e sempre acompanhadas dos esposos. São dores da vida, são momentos dolosos e momentos felizes. Quem ainda não teve o seu namorado, a sua namorada, a sua noiva, o seu noivo, o seu esposo e a sua esposa. Tantos momentos bons passados, quantos abraços, quantas trocas de carinhos um para o outro. Vejam, portanto a imagem de Cristo pregado no lenho desta cruz...

Os dois amigos estavam atentos às belas palavras do recém pároco. Ele é muito amigo dos dois e os familiares eram vizinhos. As palavras foram dominando os espíritos dos dois e contagiavam a alma. Esqueciam, naquele momento, dos problemas amorosos. Nem mesmo pensavam na tristeza do final do namoro. O padre continuava...

- Meus irmãos, acendam as velas e pensem nas coisas boas acontecidas. Lembrem-se de tudo. Ponha a mão no coração. Sintam as batidas e sintam o amor que está dentro de vocês.

Os dois, rapidamente, acenderam as velas. Estavam muito atentos em tudo. Nem mesmo lembravam das antigas namoradas. A vida para eles seria outra. Seria melhor e lutavam para encontrarem novas amantes. O tempo ia passando. As velas continuavam acessas e as lindas palavras do recém vigário iam contagiando a todos que ali estavam. Falou ele sobre a família, sobre os problemas sociais, sobre a fraca economia do país, enfim, de tudo um pouco. O entusiasmo de todos fazia com que o ar parecesse mais leve, sem violência, sem desejo de vingança, enfim, tudo era novidade.

À frente deles chegaram duas moças. Uma morena e a outra, meio loura. Eram bonitas, mas eram simples. Moravam na zona rural e vinham à cidade para estudar. Já estavam se preparando para o vestibular. Uma faria contabilidade e a outra queria ser advogada. Eles não se importaram com a presença delas. Por coincidência, o cabelo das duas eram grandes e ambos cacheados.

O pároco, mas uma vez, voltou ao tempo e pediu para os fiéis presentes recordarem do passado, dos bons e maus momentos, da passagem da vida e que olhassem para o lado direito de cada e prestasse muita atenção.

Quando os dois olharam para a direita, com as velas acesas nas mãos, próximas uma da outra, viram, repentinamente as antigas namoradas (as duas eram irmãs), com os dois novos namorados. Admirados e com o coração explodindo de raiva, perderam a consciência das velas que estavam nas mãos e tais velas se aproximaram dos cabelos das outras jovens que estavam à frente. Um zunido e cheiro de cabelo queimado foram ouvidos e sentidos ao mesmo tempo. Eram lavaredas saindo para todo o lado e até o padre parou o sermão e pediu para terem cuidado com as velas.

Desapontados, cheios de vergonhas, os dois pediram desculpas a elas e foram logos recebidos com um sorriso bem delicado. Neste momento, a padre pediu que cada um desse um abraço no companheiro ao lado. Neste momento, cada um abraçou e nasceram um namoro tão forte e tão bonito. Hoje, estão eles casados, com filhos e moram vizinhos um do outro.

JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO
Enviado por JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO em 19/04/2019
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