Presente

Eu pedi um presente...

Meu presente.

O que nunca esqueço era de quando desejei ter. Quando antes só havia um desejo, uma vontade de sentir que as coisas ficariam bem. Na época em que era mais fácil admitir que poderia estar me enganando, eu pedi um presente...

E aguardei ansioso, uma espera com esperança, um devaneio de quem sofreu e espera que algo aplaque a dor de saber. Eu acreditei que se pedisse com muita fé, poderia ser ouvido. Meus ouvidos. Queriam ouvir. Eu também queria me ouvir mas ainda assim tinha vergonha de ouvir minha voz. Pedia em silêncio.

E com a preocupação de quem sente que ainda existe tempo pra se esperar, pensei que talvez não o recebesse. Quem sabe era pedir demais, quem sabe não merecesse. Meu conhecimento a respeito de quem eu era, era duvidoso. Uma parte do que você é se vai e você não vê a hora de se sentir outra vez completo. E então você pede. Acha que talvez merece. E isso talvez seja um grande equívoco. O juiz de si exige firmeza quando se faz um pedido. Seu presente, é seu presente. Ponto. Não será possível anular o que se receber após pedir.

E continuei pedindo. Lembrava a mim que pedir era de certa forma triste. A quem pedia eu? Em que acreditava? Acreditava? Querer é um ato de egoísmo consentido. É uma verdade que negamos por aceitar que há o que se pode querer e o que não. Escolha mal, colha mal. Mas por vezes não recebemos o que pedimos até que sem que saibamos percebemos. Lá está... o nosso presente. Sem perceber, o que se sonhou como futuro está ali, presente. Como um presente... E não percebemos.

E ao vermos que o recebemos sentimos que por isso somos merecedores. É perfeito. É bom sentir que algo é teu porque tem que ser. Como se tudo conspirasse e te fizesse acreditar que é só se deixar levar. Que não há consequências. Não é só receber. O peso existe para que haja a força para carrega-lo. O peso de uma escolha é um presente inalienável.

E enquanto o suportamos sentimos a plenitude. É nosso. Nosso presente. Não foi o que pedimos? A quem devemos agradecer? São perguntas ignoradas, mas não pelo juiz de si. Ele observa. Ele não esquecerá se formos negligentes. O valor do mérito não está na medalha. O feito não se resume a um símbolo. Vemos o que queremos, esquecemos do peso e nos enfraquecemos. Até que não podemos mais carrega-lo. Se formos fracos, desejaremos nos livrar do peso. Se formos fortes, pararemos ao lado dele até que sejamos o suficiente para carrega-lo. Porque ele é nosso. Pedimos. Esquecemos?

Não se pode recusar o que se pede. Eu pedi. Mas mereço? Será que o preço pra que eu possa pedir é não ter forças para suportar o peso do meu presente? Por que não apenas me foi recusado tal capricho do ser? Eu achei que merecia... eu apenas pedi... mas talvez não mereça. Talvez pedir seja demais pra mim. Não... não quero este presente... não desejei um presente... eu quis um presente... e recebi um presente...

Quero eu recusá-lo?

... estou pedindo um presente...

Edgar Lins
Enviado por Edgar Lins em 23/06/2020
Código do texto: T6985756
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