O Rei Caído – Capítulo VI – Decisão

Coruscant, Loivty, 13º dia de Rarpisy do ano de 638.

— Maldição! — berrou o Rei Éden dando um forte murro sobre a mesa que apoiava o mapa do continente, ricamente desenhado em couro de boi, derrubando algumas peças que indicavam exércitos aliados e inimigos. Uma peça de chumbo esculpida com o desenho de um martelo e uma bigorna, símbolo do reino anão de Stonegate, rolou e caiu no chão aos pés do rei.

Estavam em uma sala luxuosamente decorada com tapeçarias e candelabros de cristal. Uma pesada mesa de madeira negra estava posicionada no centro com diversas cadeiras acolchoadas ao redor. Sentados nas cadeiras estavam, além do regente de Loivty, Lorde Thierk, seu conselheiro, Sir Elmorn Spelloyal, general do exército loivtyano, Almirante Adogeon Milner, comandante da marinha longêsa, e Sir Gorthnow, chefe da guarda real e guarda-costas pessoal do rei.

Éden estava com os cabelos negros com várias mechas grisalhas, fortes olheiras e uma barba por fazer. Ostentava sua bela coroa de ouro e brilhantes sobre a cabeça e usava uma capa de lã vermelha sobre uma armadura negra de cota de malha. Olhou mais uma vez para o mapa e, com olhar sombrio, perguntou:

— Agora que os magos do Alto Conselho de Hamolan se uniram aos malditos anões, o que podemos fazer? Devemos retornar à Greenreef?

— Se retornarmos, majestade, perderemos todo o norte. Podemos perder o Rio das Almas também — respondeu o general Sir Spelloyal, que usava armadura completa de aço polido com a cabeça de um leão desenhada em ouro no peito e uma capa negra escorrendo pelas costas. Tinha poucos cabelos na cabeça, mas possuía uma espessa e bem aparada barba grisalha e pequenos olhos negros cercados de rugas.

— Greenreef está sob cerco de Stormgard — o rei retrucou. — Se perdermos nossa capital, perderemos todo o sul e seria um golpe terrível contra o moral do exército.

— Greenreef tem suprimentos para sobreviver ao cerco por vários anos, majestade. Stormgard não possui homens suficientes para um ataque contra os muros da cidade. Eles estão aguardando o exército anão chegar para invadir a cidade. Temos que segurar os anões aqui, em Coruscant. — O general apontou para o mapa.

— O que você acha, Lorde Thierk? — o rei perguntou para seu conselheiro pessoal.

— Concordo com o general — o lorde respondeu. — A batalha que decidirá os rumos da guerra ocorrerá aqui em Coruscant. Se vencermos os anões aqui, dentro das muralhas da cidade, poderemos voltar e recuperar Greenreef. Se perdemos Coruscant, perderemos Loivty.

— Como está a situação em Longness? Como está a rainha? — Éden perguntou pressionando as têmporas com os dedos, num sinal de preocupação e dores de cabeça.

— Os exércitos de Trenet e Griffion marcham para sitiar Hangsdon, majestade — Sir Gorthnow, chefe da guarda real, respondeu. — Recebi a notícia hoje de manhã. Devem alcançar a cidade em alguns meses. A Rainha Keith está segura no castelo com alguns de meus melhores homens.

O rei olhou para o mapa e amaldiçoou a Tríade de Aço. Ele havia conquistado diversos territórios no leste e quase toda Avalon. Bastava o último golpe contra Midland, a capital. Marchou com boa parte de seu exército de Greenreef por terra até lá. Porém, quando estavam acampados em Coruscant, segunda maior cidade de Loivty, os anões saíram das montanhas e começaram a tomar várias cidades no caminho. Dois anos já se passaram e continuavam ali, aguardando. O rei estava irritado em só aguardar. Enquanto estavam parados, Greenreef foi sitiada, várias terras conquistadas de Avalon foram perdidas e Longness estava sofrendo intensos ataques de Trenet e Griffion, os demais reinos do leste.

— Prepare uma comitiva, Sir, irei pessoalmente para Hangsdon enfrentar o cerco ao lado de minha esposa. Não podemos perder Longness! — o rei finalmente respondeu.

— Isso é loucura! — Sir Spelloyal gritou num impulso. Todos olharam para ele. Chamar o rei de louco costuma ser crime punível com morte. O general percebeu a gafe e baixou o tom. — Perdoe-me, majestade, não quis ofendê-lo. Peço, porém, que repense sua decisão. Se vossa majestade partir e levar mais homens e navios, perderemos Loivty.

— A decisão está tomada! — o rei respondeu irritado. — E suma da minha frente! Se nunca mais olhar sua cara insolente, posso perdoar sua audácia. E deixar sua cabeça em seu pescoço! — Aguardou o general sair da sala e continuou: — Nomeio Lorde Thierk como regente de Loivty na minha ausência. Ele terá todo o poder para liderar o exército e defender Coruscant. — Acenou com a cabeça para seu conselheiro e, por fim, disse para o chefe da esquadra: — Almirante, prepare navios rápidos. Vamos voltar para casa.

— Sim, majestade. Temos bons navios à disposição e os rios ainda são nossos. Chegaremos lá antes do cerco — o almirante respondeu.

— Obrigado, almirante. Agora, deixem-me à sós. Preciso pensar. — Quando todos estavam deixando a sala, o rei disse: — Menos você, Lorde Thierk. Ainda temos alguns assuntos a acertar.

Quando todos saíram da sala, o conselheiro real, usando seu habitual manto de seda azul escuro com alguns entalhes prateados, caminhou para um aparador no canto da sala, pegou um cálice de cristal e serviu-se do vinho que estava em um belo jarro de ouro. Bebeu um longo gole e, então, disse:

— É um erro voltar para Longness.

— Mas, mesmo assim, você não vai me impedir, não é? — o rei continuava sentado em sua cadeira com o queixo apoiado sobre as mãos, observando o mapa.

— Não, majestade. Sinceramente, não preciso mais de você. Você me fez regente de Loivty.

O rei expressou um leve sorriso. Mas olhou para o mapa e logo fechou o rosto novamente. Pensou por um momento, olhou para o lorde e perguntou:

— Por quê estamos perdendo essa guerra, Thierk? O que fizemos de errado?

— Guerras são imprevisíveis, majestade. — O lorde tomou outro longo gole de vinho. — A Ordem do Dragão Dourado tomou partido. Existe um cavaleiro dourado por trás da Tríade de Aço.

— Achei que eles não interferissem.

— Eles sabem que estou por trás dessa guerra. Se um servo de diamante escolhe um lado, os cavaleiros dourados escolhem o outro. É assim que funciona. Eles sempre tentam estragar nossos planos. Para virar essa guerra para nosso lado novamente, o cavaleiro precisa morrer.

— E se eu também fosse um servo de diamante? — o rei perguntou. Sempre quis perguntar isso. Achava injusto ser apenas uma marionete. Seu nome estaria na história, para o bem ou para o mau, seria justo que ele também fosse transformado em um servo. Assim, ele seria imbatível.

— Você serve o Dragão de Diamante. Isso é suficiente.

— Você entendeu o que quis dizer. Por quê ele não me transforma, assim como fez com você?

— Só ele pode decidir isso. Quando tudo isso acabar, você pode pedir para ele pessoalmente.

— Por quê não agora, ainda durante a guerra? Poderia fazer a diferença.

— Não é assim que ele deseja. Visite-o quando a guerra acabar. Posso levá-lo até ele.

— E se… e se ele não me julgar digno? — o rei perguntou com uma curiosidade quase infantil.

O lorde caminhou até a mesa, apoiou o cálice vazio em um canto, pegou uma peça de ouro esculpida como uma coroa real, que representava a posição do Rei Éden no mapa. Segurou a peça nas extremidades com o polegar e o indicador de cada mão e, com uma facilidade sobre-humana, quebrou-a em dois pedaços, como se fosse um simples graveto. Arremessou-os displicentemente de volta na mesa e disse:

— Nesse caso, majestade, você será apenas mais um na sua infinita coleção.