O verdadeiro amor - Primeira Parte

Por Rodrigo Capella*

Estava com quase vinte e cinco anos e ainda sonhava em encontrar o homem perfeito. Não, eu não queria um príncipe encantado montado num cavalo branco. Diferente das mulheres da minha idade, eu procurava apenas um homem sincero e com todos os dentes bem escovados.

Iniciei a busca pela Internet, estabelecendo conversas virtuais com possíveis candidatos, dos mais variados tipos e tamanhos. No total, foram cinqüenta encontros cibernéticos ou, se você preferir, duzentas e dez horas dedicadas à procura da minha cara metade. Resultado: três idas ao cinema, assistindo péssimos filmes.

Insatisfeita, liguei para Alex, meu colega de faculdade. Talvez ele pudesse me ajudar:

- Fala linda, há quanto tempo....

- Alex, Alex, sua voz continua a mesma.

- Amor, eu amo a minha voz.

Demos muitas risadas, durante longos minutos.

- Mas, me diga, o que você precisa?

- Passei vinte e cinco anos procurando o homem perfeito para mim. Participei de conversas via Internet e nada, nada deu certo. O que eu posso fazer, meu amigo?

- Ufa! Amiga achei que você estava doente. Relaxa, de homem eu entendo. Já tive vários namorados. Linda, você quer um conselho? Aqui vai: cotidiano, cotidiano é a palavra-chave.

- Como assim?

- Repare nos homens que estão perto de você.

- Alex, obrigada, você abriu o caminho.

- De nada. Eu queria abrir outra coisa.. Hum... Mas, o João está viajando...

Desliguei o telefone. Estava na hora de encontrar o meu homem. Cotidiano. Repeti essa palavra durante longos minutos e construi mentalmente a minha rotina: acordo ás sete, tomo café, vou para a faculdade e volto para casa. Assisto desenho animado até ás oito da noite, subo para quarto e faço anotações no meu diário durante duas horas. Depois, vou dormir e acordo ás sete.

Cotidiano, cotidiano. É claro, o meu homem perfeito só podia estar na faculdade. Ah! O cara que serve batatas durante o almoço. Ele é muito lindo e vive me olhando meio estranho, diferente. Bingo!

No dia seguinte, não tive dúvidas: entrei na fila das batatas, e, respirei fundo, para entregar um bilhete à tampa da minha panela: “eu sei que você não me conhece, mas estou à procura do meu príncipe encantado e sei que ele é você. Me liga. Meu número é....”.

- Alô.

Timidamente, eu não respondi. Achei que era ele. A minha mão suava, o cabelo se desmanchava, o esmalte saia da unha, eu queria me atirar da janela. Pena que ela estava fechada.

- Alô, quem é?

- O cara das batatas.

Rimos bastante, minutos após minutos. Minha mandíbula doeu, fiquei nervosa, queria me matar.

- Que bom que você ligou.

- Obrigado.

O silêncio sempre surge do nada, para dizer nada, para causar surpresa.

- Oi, você está ai?

- Sim, estou no telefone.

- Estava pensando em sair hoje á noite, que tal?

- Hoje, hoje a noite?

- É, você pode?

Fiz alguns segundos de suspense. Eu queria muito, mas nessa hora a mulher precisa se valorizar.

- Alô, posso, claro, posso sim. Me pegue às oito, tá, ás oito!

- Tudo bem, ás oito.

- Beijos, até mais.

- Perai, e o seu endereço?

- Anota. É avenida....

O conto continua. Aguarde a segunda parte.

(*) Rodrigo Capella é escritor e poeta. Autor de vários livros, entre eles “Enigmas e Passaportes”, “Poesia não vende” e “Poesia não vende”. Informações: www.rodrigocapella.com.br

Rodrigo Capella
Enviado por Rodrigo Capella em 11/09/2007
Código do texto: T647782