GLÁUCIA - EM BUSCA DA JÓIA DE SETE FACES parte 5

- Mas você... você não era um pombo?

- Disfarces, pequena verme. Apenas disfarces. Por mais simples e idiota que pareça essa ave inútil alguns alquimistas dizem que um pombo transmite mais doenças que qualquer outro tipo de animal. Eu, nesse caso, apenas usei um corpo que meu não era.

- Qual corpo? – dizia Gláucia assustada.

- O de minha mãe.

- Espera. Está dizendo que...

- Sacrifícios devem ser feitos, minha cara. Não poderia ficar com esse corpo esquelético.

Enquanto o Ceifador se aproximava de Gláucia, sua verdadeira forma aparecia. Era da altura de Gláucia, com um manto negro sobre todo o corpo, um rosto de caveira, olhos negros com a pupila vermelha. Em suas mãos com garras afiadas como que de dragão, uma foice enorme surgia com uma grande lâmina fria.

Gláucia abriu seu livro para invocar uma espada, mas o Ceifador com um golpe de foice rasgou o livro no meio.

- Como ousa?

- Não sei se esse ambiente te é apetecível, cara guerreira. Mas vamos deixar as coisas do modo original?

Num ímpeto violento a terra estremeceu e o castelo começou a subir rapidamente numa altura inigualável.

- Olhe para fora, menina. – e o Ceifador com um movimento de sua mão fez Gláucia voar até a entrada do castelo, arrebentando a porta. Ela olhou para baixo e nada pode ver, a não ser nuvens mais escuras que aquelas que haviam na montanha em que o dragão estava.

- Você é o dragão? Quem era aquele homem então?

- O marido de Córdia. Pelo egoísmo eu pude tomar o coração dele e instiga-lo a manter essa joia aqui comigo. Em troca, concederia poderes a ele. Ele foi apenas um lacaio do próprio egoísmo.

- Mas por que eu sentia essas pontadas? Por que você veio no meio de nós? Por que tudo isso? Se queria nos matar, por que não fez isso antes?

O Ceifador a levou para dentro do mundo dos espelhos com sua mão de dragão. Gláucia ficou flutuando no meio do nada, enquanto o rosto do Ceifador crescia mais e mais:

- Primeiro vale lembrar que eu pude interceptar a carta do Rei Andher Son, assassinei o mensageiro e me disfarcei dele. Depois que usei o corpo da minha mãe aguardei a reunião de vocês. Então me intrometi no vosso meio. Foi igual na incursão onde Petrus, o profeta da terra estava.

- Mas por que ele não nos avisou?

- Ora, nobre humana. Não viu que disfarcei um sono pra ser escondido justamente na hora em que ele aparecia? Que bom que ele morreu antes de contar-vos a verdade.

- E os orcs que falavam nossa língua?

- Ventriloquismo. Nenhum orc sabe vosso idioma. Basta falar de um modo convincente que Giz Ellen e Galva Negra nem desconfiaram que eu as conhecia.

- Então você esteve entre nós o tempo todo? Você não sabia onde estava a joia?

- Confesso que isso foi apenas distração. Saber eu sabia, mas eu precisava que VOCÊ, em especial, usasse essa joia.

- Mas por que a mim?

De repente Gláucia foi transportada para o alto de uma montanha com o Ceifador lhe segurando pelo ar:

- Suas pontadas na cabeça... suas lembranças... tudo isso. É complexo, mas simples. É uma pena que você seja tão fraca.

Ele tirou o ar dos pés de Gláucia e ela começou a cair, porém ao chegar ao chão estava intacta, sem dor, na frente de sua casa antiga.

- O que fazemos aqui?

- Deixe-me contar uma coisa. Essa joia nas mãos do rei poderia fazer do condado de Litherátuhus o mais forte possível. Quando o rei perdeu essa joia, o motivo foi torpe.

- Do que está falando?

O Ceifador a cercava como um fantasma negro a envolvendo:

- Diga-me, humana. Se você é tão especial assim? Qual o seu nome?

- Meu nome é Gláucia, aquela que tem olhos verdes. Sou a líder do grupo de...

- Já chega. Isso é suficiente. Agora te pergunto: quantos anos você tem? Qual o nome do seu pai? E da sua mãe?

Gláucia pela primeira vez sentiu-se confusa com sua própria existência.

- Eu não sei.

- Quer saber então quem era Córdia?

O Ceifador a transportou para dentro de uma caverna, onde havia um casal se relacionando.

- Córdia foi filha de um amor rápido e não planejado de uma deusa e de um personagem conhecido por você.

- Espere? O que está falando?

- A joia não te lembra de nada? Como Córdia achou essa joia, sendo que era a joia mais preciosa do rei?

- Pelos deuses! Córdia é filha do rei Andher Son?!

- Filha não assumida. Então a deusa fez a natureza cuidar dela, e foi muito bem cuidada. Como a deusa tinha olhos verdes, ela puxou isso dela. Ela recebeu da deusa um livro mágico quando pequena, porém ela não sabia que aquele livro tinha poderes. Então apenas escrevia histórias e desenhava o que vinha na cabeça infantil.

- O livro foi dado pela deusa... mas que deusa era?

- A deusa do amor e da dor, Giulianah. Mas venha até aqui.

Gláucia foi arrastada por um espelho criado pelo Ceifador e viu a cena da casa.

- Lá está a moça escrevendo. Olhe na janela, os bárbaros vem vindo.

Em seguida ele a transportou para a montanha onde Córdia era salva:

- Veja esse moço... pobre coração. Mal sabia ele que era tão fácil de ser dominado.

- Você o transformou num monstro.

- Nada disso. Eu o dei poderes e o transformei em dragão. O monstro ele sempre foi. O que acha que são esses orcs? De onde acha que surgiram esses muitos dragões? Frutos de bacanais nefandos. Desejos de homens e mulheres insaciáveis que se transformaram nos próprios pecados encarnados. Eu apenas lhes dei o que queriam.

- Que horror! – pasmava Gláucia.

- Calma, não acabou. Veja isso.

Gláucia via toda a cena sem reação. Córdia agora estava chorando e decidiu desenhar uma guerreira. Desenhou os cabelos iguais aos dela, os olhos da mesma cor e com um livro igual ao que ela tinha. Nesse momento o livro começou a brilhar:

- Olhe bem para o desenho que ela fez. Qual o nome que aparece abaixo do desenho?

- Gla... Gláu...

- ISSO! GLÁUCIA! – o céu trovejou e ela rapidamente foi levada para o topo do castelo. O Ceifador foi se transformando num dragão negro com uma enorme foice em sua mão:

- Córdia criou você! Você foi fruto da imaginação de uma moça. O livro apenas te deu vida e materializou!

- Não! Não! Isso é impossível!

- Admita, Gláucia! Você é apenas a mesma coisa que suas armas. Por isso você não tem poderes. Porque você é apenas um milagre de um livro. Mais nada!

Nesse momento o céu escureceu e a lua ficou cor de sangue. O dragão imenso nos céus agora transformou-se numa caveira envolta em um manto escuro e sua foice apenas aumentava.

- Eu poderia destruir-te agora, sua inútil. Mas antes tenho algo a te propor!

Gláucia estava muito confusa com seus pensamentos. Não sabia mais quem era ou porque vivia.

- Venha e aceite minha proposta. Seja igual a eles.

- Você quer me transformar num dragão?

- Negativo. Quero apenas te dar tudo aquilo que seus desejos mais ocultos quiserem. Corpos, saúde, poder, escravos... tudo isso eu te darei... se prostrada me adorares e me entregares sua fidelidade.

- Nunca que eu faria isso! Jamais!

Ela se lançou ao chão e pegou sua espada e seu escudo, que estavam próximos:

- Por Córdia que morreu por uma causa nobre, eu tenho a missão de honra-la. Então lutarei contigo até a morte, mas não me renderei a você nem aos meus caprichos! Eu resgatarei a joia e meus amigos serão libertos da prisão dos espelhos.

- Libertos? – o Ceifador diminuiu e ficou na altura de Gláucia. Ela a transportou para a caverna dos espelhos de volta. Os espelhos estavam todos manchados de sangue.

Ao chão, todos os guerreiros que vieram com ela estavam mortos.

- Que horror! – Gláucia colocava as mãos no rosto. - Seu demônio desgraçado!

- Venha! Não há necessidade de ter esse fim tambem. O poder da joia está em nossas mãos.

- Jamais! – e avançou com fúria pra cima do Ceifador.

********

Gláucia lutou bravamente, mas foi ferida pela foice macabra do Ceifador que a acertou em cheio no seu coração.

- Qual era o seu poder mesmo, Gláucia? Ah, já sei. Parece com o meu. Sabe fazer rir.

Gláucia caiu no chão... morta.

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Nesse momento, o livro rasgado pelo meio por causa do golpe do Ceifador, começou a brilhar e as folhas a se juntarem...

Continua

Leandro Severo da Silva
Enviado por Leandro Severo da Silva em 18/07/2019
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