Sob nossos pés

Depois de detalhar o que pretendia fazer, Romar de Noranto pediu ao preboste Nondar que não fosse interrompido enquanto desenvolvia o amplificador de mana com o auxílio da dedicada Ulanir. Duas pedras de raio, grandes blocos hexagonais de material translúcido, cujo centro parecia pulsar com um brilho suave que mudava de cor, foram trazidos dos cofres do castelo para a tenda do armeiro. Romar os dispôs sobre cavaletes de madeira, um de cada lado de uma cadeira com espaldar reto.

- Você já fez isso antes? - Indagou ela curiosa, assistindo a movimentação.

- A guilda fez vários testes comigo, - explicou o rapaz, sentando-se confiantemente na cadeira - mas nunca com pedras de raio deste tamanho.

- Pelo que sei, há muitas mais de onde saíram estas - comentou Ulanir. - Mas como você está usando duas, imagino que não tentará criar um vínculo da maneira tradicional.

- Para atingir Ras Andor, calculo que estas duas serão suficientes - avaliou Romar. - E as usarei como amplificadores, já que teoricamente não há como acionar os operantes daqui.

- Por experiência própria, posso lhe dizer que não há - afirmou Ulanir. - O mestre Ikan, seu antecessor, desenvolvia os projetos aqui, mas tinha que se deslocar fisicamente para Ras Andor para criar o vínculo. Às vezes, ele ficava lá para ganhar tempo, e me pedia para mandar as especificações por um mensageiro.

Romar ouvia atentamente, mãos nos braços da cadeira.

- Imagine então se pudermos fazer o processo à distância!

- Estou imaginando - replicou Ulanir de pé, braços cruzados. - Me convença.

- Vamos lá - declarou ele em tom de desafio.

Romar ergueu as mãos e colocou uma sobre cada pedra de raio; fechou os olhos e concentrou-se. Sob a mão direita, pulsou um brilho avermelhado; sob a mão esquerda, um brilho azul. Com uma tabuinha coberta de cera e um estilete, a dedicada anotava os procedimentos em curso.

- Carga na mão direita - alertou ela. - Fluxo na esquerda.

Romar pareceu não ouvi-la, tal era a concentração. Franziu a testa. Sob a mão esquerda, o brilho azul mudou para verde-esmeralda. Quando a pedra da direita também brilhou no mesmo tom, pareceu relaxar.

- Aguardando instruções, modo de comando - informou Ulanir, mais para si do que para Romar.

O mestre de armas murmurou alguma coisa, olhos fechados.

- Não entendi - disse Ulanir.

Romar continuou falando, mas aparentemente não a ouvia. Ela inclinou-se sobre ele para tentar entender.

- Isso não é Ras Andor... - conseguiu entender. - Que lugar é esse?

E então, subitamente, arregalou os olhos e ergueu ambas as mãos, cortando o vínculo. Respirando fundo, inclinou o corpo, pondo o rosto entre as mãos.

- Você está bem? - Indagou Ulanir preocupada, tocando-lhe um ombro.

Romar apenas balançou a cabeça, sem responder. Ela largou a tabuinha e o estilete sobre uma bancada e encheu um copo de cerâmica com água. Quando o entregou a ele, bebeu o conteúdo de um só gole.

- Essas coisas são muito poderosas - murmurou Romar, depois de alguns minutos em silêncio. - Nunca tinha sentido nada parecido.

- Você conseguiu fechar o vínculo com Ras Andor? - Indagou a dedicada.

Ele balançou negativamente a cabeça.

- Não ainda, mas ficou muito claro que posso fazê-lo, é só uma questão de calibragem. As pedras me mandaram para um lugar totalmente inesperado...

Diante da expressão de expectativa de Ulanir, apontou para o chão.

- Dentro da montanha. Há alguma coisa dentro da montanha... não é um operante, mas aceitou o modo de comando.

Ergueu-se da cadeira e segurou a dedicada pelos braços, encarando-a:

- Pelo juramento da guilda, isso não pode sair daqui!

- Está bem - replicou ela, assustada.

- Pelo menos, até que eu descubra do que se trata... - prosseguiu Romar, soltando-a. - E se representa algum perigo para nós.

Voltou a sentar-se na cadeira, começando a imaginar que acabara de descobrir a razão pela qual os operantes não se aproximavam da Montanha Isolada. Decididamente, eles sabiam que havia algo extremamente poderoso sob a rocha; e que, talvez, não gostasse deles.

[Continua]

- [07-11-2020]