REGRESSÃO I

REGRESSÃO:

CONTO DE OTREBOR OZODRAC

Tenho sessenta e oito anos, lembro que quando tinha quarenta e oito, parece que foi ontem. Isso me leva a uma reflexão, daqui a vinte anos, estarei com oitenta e oito e será amanhã. Raramente, alguém chega a essa idade, e provavelmente não fugirei a regra. Isso me faz pensar, quão pífia é a vida.

Nesses momentos de reflexão, fico pensando em tudo o que nos cerca, constato que nada sabemos sobre isso. Não sabemos de onde vimos assim como não sabemos para aonde vamos. Isto me inquieta, e digo com toda a sinceridade, que isso não deve ocorrer apenas comigo, acontece com a maioria dos homens que tem o habito de raciocinar e interrogar o desconhecido, a procura de soluções. Esses temores, ou incertezas, seja lá o que for, levam a reflexão, nos levam a criar soluções, como se pode dizer, se não há solução eu crio uma, que me satisfaça. Assim pensando o homem criou as religiões, buscando através delas, criar soluções para as suas incertezas. Como não sou diferente dos demais seres humanos, faço tais interrogações e busquei nas religiões respostas para as minhas incertezas.

Confesso que em todas às que tive a oportunidade de estudar, nenhuma me deixou satisfeito. Não vou discutir estas questões, para não me envolver numa teia que não me levará a lugar algum, criando a desesperança e incertezas nos meus semelhantes. Nesse emaranhado de incertezas, por acaso, chegou-me as mãos, uma possível solução. A qual passo a narrar.

Numa manhã, de dias atrás, passava das nove horas. Abri o notebook, como faço sempre. Havia vários e-mails, levei alguns minutos para acessá-los e respondê-los. Um deles chamou-me especial atenção, era de um desconhecido, o que me fez passar o antivírus, antes de abri-lo. Ao lê-lo constatei que carregava anexo um arquivo em MP3, tinha como título, hipnose. O autor me convidava a ouvi-lo com muita atenção.

Coloquei os fones de ouvidos e dei partida no MP3. Uma música maravilhosa, com uma suavidade que induzia paz, seguida por uma voz, calma e suave, com um carregado sotaque português, que dizia:

“ comece concentrando-se na sua respiração, que vai entrando pelo corpo. A cada inspiração deixe-se aprofundar cada vez mais, em um lindo estado de serenidade e relaxamento. Indo mais fundo, em cada inspiração. Esta é uma técnica chamada respiração Yoga, uma técnica muito antiga. Indo mais fundo a cada inspiração. Enquanto se concentra na respiração, descontraia todos os músculos e sinta-se ir ainda mais fundo.

Relaxe os músculos do rosto e os maxilares. Grande parte da tensão esta alojada nesta zona. Descontraia os músculos do pescoço, aqui também se acumula uma grande dose de ansiedade e tensões. As pessoas que sofrem de dores no pescoço costumam a ter muita tensão ai acumulada relaxe completamente estes músculos. E agora descontraia os músculos dos ombros, sinta-os mais leves, mais soltos, completamente relaxados. “As pessoas que carregam problemas consigo como peso aos ombros, tem estes músculos tensos e presos, relaxe os músculos dos braços e das costas...”

O MP3 de vinte minutos foi por mim ouvido, seguindo a risca tudo o que a voz dizia.

Durante o processo fui convidado pela voz, a descer uma escada e chegar até uma sala, onde havia flores e vegetações. Havia também um divã, no qual eu deveria repousar quanto sentisse necessidade. Ou que poderia deitar-me no divã, se o quisesse agora. E, que ficasse completamente relaxado, e regredisse a minha infância, em um momento qualquer, que imaginasse uma cena passada. Vi-me como um menino de três anos, estava deitado em uma pequena cama, ao meu lado estava meu pai e minha mãe, que me seguravam. Não estava dormindo, pois, movimentava as pernas e tremia os braços, secreções corriam dos meus lábios. Sempre ouvira meus pais dizerem que eu sofrera de ataques quando era pequeno. O que estava vendo, deveria ser um desses ataques que estava acontecendo. Como isso estava gravado no meu subconsciente como uma interrogação, para lá tinha ido durante a regressão.

Após, a voz ordenou-me que regressasse ao estado de um bebe. Regressei, e estava sendo amamentado. No colo de minha mãe, sugava aquele mamilo ereto, donde saia um néctar morno e delicioso, meus lábios roçavam aquela aureola escura que contornava o mamilo, parecia ser veludo, de tão macios. Segui a voz que disse:

— Vamos agora voltar ao útero materno, para o período intrauterinos, imediatamente antes de ter nascido. Tudo o que lhe vier à cabeça é ótimo. Deixe-se apenas experimentar.

Assisti à cena, senti que estava no útero, nadava em água calma e morna, podia me movimentar, esticar as pernas de quando em vez.

Sentia conforto, segurança e podia ouvir sons que vinham de longa distância. Era uma situação inimaginável.

A voz disse que retornasse a sala e ao divã, e que a minha frente estava um espelho grande, cheio de luz e ao olhar para o espelho vi o reflexo de muitos, muitos espelhos. E, em cada um desses espelhos, eu me encontrava em um tempo diferente, num lugar diferente, talvez num espaço ou numa dimensão diferente. Talvez noutra vida. Se quisesse ser capaz de recuar mais e mais e relembrar disso depois.

A voz continuou dizendo, que quando ele contasse de um até cinco em ordem decrescente, eu me devia sentir atraído, puxado por um daqueles espelhos, por um daqueles reflexos. Que ao olhar para dentro conseguiria ver a mim mesmo em muitos lugares diferentes, tempos diferentes, vestido de maneira diferente e capaz de ter um aspecto muito diferente. Sentia-me atraído por um dos espelhos, por uma época, talvez uma que me ajudasse a explicar ou compreender um problema, um sintoma, um dom, uma relação, um habito ou determinado conhecimento, fosse o que fosse. Senti-me atraído por um dos espelhos. A voz disse: Que quando contasse de cinco até um, eu entrasse num daqueles espelhos, e que, se me sentisse desconfortável, poderia pairar acima da cena e observá-la como estivesse num cinema.

Vi num dos espelhos uma mulher, olhei-lhe os pés, estavam descalços, olhei o corpo estava com um vestido surrado e sujo, olhei ao redor, uma favela cujas ruas, escorriam em córregos o esgoto fétido. A voz dizia que deveria olhar ao redor e que deveria recordar de tudo o que havia visto quando regressasse. Que era hora de regressar, que deveria retornar ao salão e que estava na hora de acordar e que ele contaria de um até dez e quando dissesse dez, eu deveria acordar descontraído cheio de energia que recordaria tudo o que havia passado. Contou calmamente até dez, dizendo em intervalos que eu estava acordando, que estava quase desperto e eu acordei.

Havia tido uma experiência insólita. Confesso que sempre fui cético, quanto a processos de hipnose e regressão. E, por isso, ainda pairava dúvidas sobre o que havia se passado. Achava que tinha imaginado tudo aquilo, exatamente o que a voz ditara. Que meu cérebro criara a imagem da mulher no espelho, seguindo a orientação da voz.

Trabalhei o resto do dia sem me preocupar com a experiência e no final da tarde, acomodei-me na cadeira do papai, uma cadeira reclinável, muito confortável, coloquei os fones e liguei o MP3.

Tudo ocorreu como antes, quando estava na idade de três anos, lá estava eu tendo um ataque, desta feita pude notar que a secreção que escorria da minha boa era vômito, passei novamente pela experiência do útero e fui aos espelhos, escolhi aquele em que estava a mesma mulher, e adentrei nele. Acena era a mesma, pude notar mais detidamente tudo que a cercava. Mas a voz dizia que deveria retornar ao salão e eu regressei como na vez anterior. Constatei que o processo era limitado, pois, teria sempre que seguir a voz e quando ali chegasse ela fazia retornar, finalizando a sessão.

Tinha de pensar nesse assunto, por isso, deixei tudo para continuar no dia seguinte, após solucionar o impasse.

Como costumo resolver os meus problemas à noite, antes de conciliar o sono, quando estou por entrar no estado alfa. Montei mentalmente uma estratégia, que seria a seguinte:

Faria a gravação em uma fita cassete, quando chegasse ao espelho, antes da voz ordenar que retornasse ao jardim, daria uma pausa na gravação, deixando que a fita rodasse sem nada gravar, assim aumentaria o tempo no interior do espelho. Calculei que dez minutos seria o suficiente para eu me aprofundar no transe, após continuaria a gravação de onde parara. Dessa forma interrompendo a viagem insólita e regressando ao salão.

No dia seguinte, ao chegar a casa, no término do expediente, tudo preparado iniciei a experiência.

Adentrei no espelho, lá estava à mulher, como a tinha visto nas vezes anteriores. Olhei o seu semblante que espelhava angustia, seus cabelos grisalhos, despenteados se acomodavam sobre os ombros, seus olhos negros, procuravam alguma coisa com severa avidez. O vira-lata a cheirou e seguiu o seu caminho, parado e olhando para a mulher, como quem diz, siga-me. A mulher custa a perceber a atitude do cão, mas resolve segui-lo. Uma vala de acumulo de lixo a céu aberto, no meio dos barracos, ela olha em seu interior, um corpo de menino. Corre, adentra no lixo e se abraça ao corpo inerte. Suspende-o nos braços e sai do meio do lixo, seguindo pela ruela. No alto da lombada, dois homens armados. Ela para, e tenta retornar, mas as armas são disparadas e a atingem pelas costas. Tomba no solo seco, o corpo que carregava nos braços e lançado a sua frente. Senti uma angústia incontrolada, com tudo o que estava passando. De repente tudo ficou sereno, o corpo inerte, mas eu me sentia aliviado e sereno. Nesse momento a voz surge e determina que retorne ao salão, concluindo a experiência.

Desperto do transe hipnótico, concluí que o tempo havia determinado. E, que na experiência eu era a mulher, que ao morrer, sentiu paz e tranquilidade.

Nos próximos dias gravei em uma fita de uma hora em cada lado e dei um tempo maior para permanecer no transe hipnótico.

Mas, antes de iniciar uma nova experiência, pensei, pensei e cheguei à conclusão que eu não estava preparado para continuar com tal experimento. Faltava-me mais conhecimento sobre o assunto. A única indicação que tinha para tentar me aperfeiçoar na matéria era o nome do autor do MP3. Após uma incansável busca consegui um livro desse autor. Em seu livro ele narra diversas experiências com clientes, uma vez que é médico Psiquiatra e professo de psiquiatria.

Não posso reproduzir nenhuma das partes do seu livro, pois isso seria antiético e desonesto de minha parte.

Mas posso lhes afirmar que a leitura desses livros me deram conhecimento que necessitava para continuar com minhas experiências. Ao ler os livros aprendi que quando estivesse na regressão, teria um completo controle de tudo o que estivesse acontecendo, e que, poderia interromper a regressão a qualquer momento que desejasse. Que poderia reviver o que passara em vidas anteriores, ou planar sobre elas, apenas assistindo o desenrolar das cenas. Em fim, tais leituras me deram coragem e conhecimento para continuar com minhas experiências.

Amigo leitor, amiga leitora, siga o meu conselho: “Não se arrisque fazer o mesmo, procure um profissional capacitado, ele o orientará em suas regressões, não deixando sequelas em experiência ruins.”

Nos dias seguintes, articulei um novo plano, na gravação original, acrescentei, logo após estar no útero materno, usando a minha voz, disse:

— “Regresse a uma vida remota, a mais antiga possível.”

Dei um tempo de vinte minutos, o dobro do que tinha dado na vez anterior, entendia que era o tempo suficiente para uma experiência de longa duração.

Tudo estava preparado, eu me encontrava no útero materno e, após ouvir. “Regresse a uma vida remota, a mais antiga possível.” Tudo ficou claro e eu me encontrava no meio de uma região árida, areia e pedras que aflorava. Uso uma pele que me cobre da cintura até próximo dos joelhos. Meus cabelos são escuros, longos e emaranhados, minha barba de grande tamanho em mechas grudentas. Na mão direita carrego um grande osso, como uma arma mortal. Meus pés rachados com a pele em grande espessura, por caminhar descalço sobre pedras. Paro e ouço gritos estridentes, o que me inquieta, corro para uma formação rochosa e aos pulos atinjo o seu cume, vejo lá embaixo, ao longe, um pequeno grupo hostil que avança. Escondo-me sobre pedras, meu coração bate acelerado, sinto a adrenalina esparramar-se pelo meu corpo, que sua. A luta era iminente eles estão próximos. De um salto lanço-me sobre eles, eram cinco, o primeiro golpe desfechado atinge dois deles, mas os demais atiram contra mim pesadas pedras, uma me atinge na cabeça e eu perco os sentidos. Pairava sobre a cena, podia ver os atacantes desfecharem pancadas sobre minha cabeça. De repente tudo ficou sereno, senti um alívio e uma sensação de bem estar. Tudo estava terminado.

A voz reiniciara dizendo que retornasse, quando a contagem regressiva terminasse. A voz dizia que era hora de regressar, deixar aquele tempo e retornar ao salão onde poderia descansar no divã. Conto de um a dez, dizendo, nos intervalos, que eu acordaria serenamente e que me recordaria de tudo o que havia passado e que, um bem estar poderoso se apossaria do meu ser.

No final da contagem eu acordei.

Confesso que esta viagem fora por mim programada inadequadamente, eu havia desejado voltar a um tempo remoto, provavelmente a um estado em que ainda era um primata. A experiência não me havia convencido de que eu teria realmente retornado a uma vida passada, achei que tudo havia sido criado por meu subconsciente que criara uma situação seguindo aquilo que eu e havia proposto.

Na semana seguinte, procurei o meu irmão Oslim Ozodrac e lhe disse:

— Eu quero que você escute este MP3 — estendi-lhe a mão e lhe entreguei um pendrive — escute sozinho e em um ambiente que não haja ruídos. Retornarei amanhã para continuarmos a conversa.

Na manhã seguinte. Lá estava eu.

— E daí, assistiu o MP3.

— Sim, assisti e achei interessante, mas você acredita nisso?

— Bem, estou tentando acreditar, mas está difícil. Por isso necessito da tua ajuda. Quero que tu me monitores quando estiver em regressões.

— Mas mano, eu não tenho qualquer qualificação para fazer isso.

— Sei disso, eu também não tenho qualquer habilidade para fazer regressões, é só para tirar a prova dos nove — lhe disse em tom zombeteiro.

— Tá bem, mas o que eu devo fazer?

— É simples, terás que permanecer ao meu lado enquanto eu faço a possível regressão. Quando a voz disser:

“entre no espelho, sinta a força, quase do outro lado, já está, veja os sapatos, se está calçado”.

Nesse momento, tu acionas a pausa e fica me observando. Posso passar por momentos de grande agitação, apenas observa. Somente torna a acionar o MP3, quando estiver calmo novamente.

— Não sei se isso vai dar certo, mas vamos tentar — disse Oslim.

Caro leitor, cara leitora. Estes fatos que estou narrando, são verdadeiros e estão acontecendo neste momento. Por isso tenho de interromper e voltar mais tarde no próximo capítulo.

CAPITULO II

A CONFIRMAÇÃO.

Lá estavam os espelhos, havia varias opções, mas qual deles eu deveria adentrar, qual situação, seria para mim mais importante? Escolhi um, aleatoriamente e, ao entrara, Oslim, que ficara no controle, interrompeu o MP3 acionando a pausa.

Já dentro do espelho, olhei ao redor, procurando estabelecer uma época, um tempo ou um local. Olhei e lá se encontrava um menino. Olhei para os seus pés. O menino estava calçado com sapatos de couro, olhei a roupa, vestia um terno de casimira clara, camisa e gravata, seus cabelos estavam bem arrumados e parecia feliz.

Olhando ao redor, pude ver uma sala onde havia mais pessoas convivendo com o menino. Pareceu-me que eram felizes e que viviam em harmonia.

Acompanhei aquela família por todo o tempo que durara a regressão, até que Oslim ligasse novamente o MP3, dando por terminada a sessão de regressão.

Agora sabia que poderia ter regressões e ser monitorado por Oslim, para que nada de mal pudesse ocorrer, mas estava consciente que muito teria que estudar para aprimorar e entender aquele mecanismo o da regressão.

Na semana seguinte, continuei a pesquisar sobre o assunto e tive algumas constatações que me pareceram importantes.

Por exemplo, que uma regressão só se justifica, quando queremos corrigir um sintoma, algum distúrbio, que possam ter origem em vidas passadas.

Que através da técnica de regressão, eu poderia acessar fatos ocorridos durante a vida adulta, a adolescência, a infância, o nascimento, a vida intra-uterina, e até mesmo experiências ocorridas em outras vivências que ainda nos afetam o dia-a-dia.

Um dos autores que li, assegura que podemos avançar em vidas futuras, de ver-nos em tempos que ainda virão vivenciar coisas e passagens que ainda não aconteceram. Este mesmo autor diz que, tudo está ocorrendo simultaneamente dentro de um espaço tempo, que o hoje, o ontem e o amanhã, estão paralelamente ocorrendo ao mesmo tempo.

Que a regressão pode servir de terapia a males que nos estão afetando nesta vida. Que tais sintomas, podem desaparecer com as revelações ocorridas nas regressões. Que as regressões já curaram inúmeros pacientes, que após haverem desnudado situações vividas em vidas anteriores, ficaram completamente curados dos males que os afetava nesta vida.

Em outros casos, a regressão pode nos fazer mal, se descobrimos que uma pessoa que hoje faz parte de nossa existência presente, foi em outra vida, alguém que muito mal nos fez. Podemos passar a tratar mal e ter aversão a essa pessoa. Que em cada reencarnação, somos melhores do que nas anteriores, num crescendo, tal que nos levará a perfeição e ao desenvolvimento do nosso espírito.

Após esses estudos cheguei à conclusão que para continuar fazendo regressões teria de ter uma justificativa, descobrir em mim alguma fobia, algum mal que não tivesse remédio, em fim, algo que dentro do meu subconsciente me estivesse prejudicando nesta existência.

Após forçar o meu subconsciente por vários dias, encontrei, não uma, mas três situações que justificariam regressões.

Eu sofria de labirintite e chagava há ficar uma semana com tonturas e vertigens, o que me impossibilitam de levar uma vida normal, nesses períodos. Já havia consultado vários especialistas, me submetido a vários exames, incluindo o “BERA” que é um exame de última geração utilizado para avaliar a audição, quando testes rotineiros não nos dão as informações necessárias. Trata-se de um registro da atividade elétrica da via auditiva até o sistema nervoso central.

O último especialista que procurei, diga-se de passagem, o maior renome na Otorrinolaringologia da capital, ao examinar todos os exames que lhe apresentei disse:

— Senhor Otrebor, o senhor fez todos os exames que a tecnologia mais avançada proporciona. Os resultados foram negativos, o senhor, não sofre de nenhuma doença que possa produzir um quadro de labirintite. Posso lhe receitar algum medicamente para amenizar uma crise, mas não lhe posso garantir a cura.

Diante de tais assertivas, concluí que a origem poderia ser em vidas passadas, dessa forma, passível de investigação por regressão.

Quando tinha apenas catorze anos, deixei de comer carne, pois não suportava o cheiro da carne assando. Nunca apreciei churrasco. Segundo os meus pais, nunca foram descobertas as origens dessa ojeriza por carne, portanto, passível de uma investigação regressiva.

Outro fato, também importante, que me lembro desde que me conheço por gente, e de ter um medo incontido por felinos, não gosto de gatos, eles me causam arrepios. Fiquei aterrorizado quando dei de cara com um tigre em um zoológico. Entrei em desespero e sai correndo, indo parar no lado de fora. Isto ocorreu quando tinha uns oito anos e nunca mais quis saber de zoológicos. O medo, ou seja, lá o que for não tem origem conhecida, portanto pode ter relação com vidas passadas.

Tinha os motivos para fazer regressões, mas lembrei-me que na última, onde eu era um menino, que estava com seus pais, não houve qualquer evolução, o tempo que tinha sido determinado tinha se esgotado, sem que houvesse uma progressão de tempo, o tempo passava-se monotonamente como estivesse vivenciando o cotidiano de uma vida passada.

Em transe, não tinha capacidade de me auto- induzir e avançar no tempo, isso teria de ser feito; Oslim que estava monitorando a experiência.

Ele teria de interromper o MP3 e começar a falar comigo, fazendo perguntas para eu dissesse o que estava acontecendo durante a regressão, para que ele me induzisse a avançar ou recuar no tempo em que estava.

Para que isso fosse eficiente e eficaz, Oslim teria de estudar tudo o que eu havia estudado sobre regressões.

Fui a sua casa, expliquei da necessidade de ele fazer o controle da regressão e lhe passei todo o material pesquisado para que ele se enfronhasse do assunto. Relutou um pouco, mas anuiu ao meu pedido.

Marcamos para a semana seguinte uma sessão de regressão em minha casa. E, quando esta chegou, nos preparamos. Eu sentado em um sofá cama reclinável, na melhor maneira possível. Oslim comandava as ações. A voz iniciou e eu me concentrava, tudo ocorrendo perfeitamente bem. A voz chegou ao ponto de maior concentração dizendo:

Enquanto você descansa no salão, vamos começar nossa viagem ao passado...

Nesse momento, Oslim brecou a gravação e começou a sua fala:

— Vá para determinados períodos, épocas importantes da história do planeta...

Imagine, visualize um túnel luminoso à sua frente.

Este túnel reflete todas as suas vidas passadas, todas às suas experiências...

E quando você olha neste túnel pode ver o reflexo de outros túneis, que se estendem em direção ao passado...

E neste túnel também podem aparecer reflexos de outras dimensões ou de outros universos...

À medida que for passando por estes períodos, veja se sente uma atração mais forte por alguma imagem ou por algum período, que tenha relação com as suas crises de labirintite, ojeriza por felinos ou que tenha sido a causa da sua aversão por carne.

Se isto acontecer e, se você quiser ver com mais detalhes, você pode ver...

Vamos passar brevemente por cada período...

Veja se esteve lá, veja se ele te seduz, te atrai...

A primeira época é o ano de 1600... O que vê?

— Vejo um homem parado.

— Olhe para o que está calçando, o que esta vestindo. Olhe ao redor para ver se situa no tempo. Veja se há ruas, habitações, outras pessoas ao seu redor, em fim, tudo o que o cerca.

— Vejo que o homem usa grossas botas até os joelhos, com uns vinte centímetros de dobra sobreposta, feitas, me parece, que de couro cru. Calças de tecido preto. Uma espécie de casaco com gola fechada no pescoço. Um cinto de couro ao qual estava preso, dois suspensois cruzados no peito. No cinto duas espadas, uma de cada lado. Na cabeça um chapéu de abas largas e copa cônica. Na mão carrega uma arma de fogo, cujo final do cano parece uma corneta. O homem faz parte de uma expedição que está desbravando uma selva, densa e fechada. Mais de cem homens o acompanham.

- Entre dentro do homem, ele é você no passado — disse Oslim.

— Sim, eu sou este homem, sou um bandeirante, faço parte de uma entrada de bandeiras, que partiu de São Paulo, rumando o Oeste do atual estado de Minas Gerais.

A expedição tem como objetivo predominante capturar índios e procurar pedras e metais preciosos. Eu sou o líder de toda a expedição. Minha liderança é incontestável, alguns me amam e outros me odeiam, mas todos me temem como a um animal selvagem de grande fúria.

A expedição avança na mata densa e inóspita. As picadas são abertas a golpes de facão. Na maioria os seus componentes são mamelucos, inclusive eu, que me chamo Adão de Albuquerque, sou descendente de índio com branco. De repente paramos, havia movimentos ao nosso redor. São índios, que nos observam, constato que não atacarão, pois, temos armas e munição, as quais eles temem.

Minhas previsões foram erradas, logo em seguida sofremos um massivo ataque, perdemos três homens e matamos mais de vinte índios, o que fez com que eles se evadissem pela mata.

Caminhamos muito, não podíamos parar, pois, os índios, ainda podiam nos estar seguindo.

— Prestes à atenção — disse Oslim — avance no tempo até chegar a algum lugar, onde tenham parado.

— Chegamos a uma aldeia, só há mulheres, crianças e velhos, constato que os guerreiros devem estar caçando ou pescando. Dou ordem de atacar a aldeia, que não impõe qualquer resistência. As mulheres servem comida e bebida aos homens, chegados. A noite cai, dou ordem para que uma guarnição, de dez homens, fique fazendo a vigilância.

Durante a madrugada fomos atacados, os homens que não ficaram prisioneiros, foram mortos a facadas e pauladas. Eu fui feito prisioneiro após haver matado mais de dez índios. Éramos doze prisioneiros ao todo. Os demais todos mortos.

Fomos amarrados de cabeça para baixo em paus cravados no centro da aldeia. Os prisioneiros pertenciam aquele que por primeiro lhe houvesse tocado. Nessa situação fomos insultados e maltratados por mulheres e crianças. As agressões duraram várias horas. Após fomos bem tratados, recebi como companhia a filha daquele que me havia capturado e pude andar livremente na aldeia. Não havia a mínima possibilidade de fuga. Era escolher, ficar na aldeia ou morrer na selva. Tínhamos uma corda amarrada ao pescoço. Mécia-Assu, a índia que me fazia companhia, era uma moça que devia ter seus vinte anos. Vejo seus cabelos longos e negros. Seu rosto tem as maças salientes e o nariz ligeiramente esborrachado. Sua boca larga exibe dentes alvos e perfeitos. Noto que não sou totalmente indiferente a ela. Mécia-Assu me levou para a oca, tirou as minhas roupas e fez com que me deitasse com ela. Fizemos amor, durante dota a noite. O dia amanheceu, saímos da oca, havia grande movimentação, seis prisioneiros foram banhados e depilados. Depois os deixaram fugir e logo, logo os capturaram novamente. Passados alguns momentos, eles tiveram o corpo pintado de preto, untados com mel e recobertos por plumas e casacas de ovos. Ao por do sol iniciaram uma grande beberagem de uma bebida alcoólica. Todos os adultos pareciam bêbados, cambaleando pela aldeia até caírem em sono profundo.

No dia seguinte, um homem dança e revirava os olhos, parou a frente de seis prisioneiros e começou a lhe falar na língua nativa, que não entendo. O home desfere golpe de tacape na nuca dos prisioneiros que caem desfalecidos, um a um. Seis velhas se aproximam das vítimas inertes no solo, erguem a cabeça e com uma faca cortaram as gargantas, de um a um, e recolhem os sangues em cuias de porongos. Abrem os crânios e retiram os miolos. O sangue é bebido ainda quente, por mulheres e crianças. Os homens arrastam os cadáveres e os escaldam e raspam-lhes a pele, retirando a camada que fora aplicada no dia anterior. Introduzem um bastão no ânus e esquartejam os membros. Fazem uma incisão na barriga, e expõem as vísceras e se afastam, logo, as crianças se aproximam e começam a devorar os intestinos.

Um homem se aproxima e começa a retalhar o tronco, começando pelo dorso. As línguas e os miolos foram destinados aos jovens. Os adultos ficavam com a pele dos crânios e as mulheres com os órgãos genitais. As mães embebiam o bico dos seios no sangue e amamentava os bebes. Após as partes são colocadas sobre uma espécie de grelha de paus, brasas são colocadas sob a grelha. Os pedaços são colocados a assar, coxas, pernas, pés, glúteos, braços e antebraços, mãos, dorsos, costelas e cabeças. O cheiro da carne assando me causa enjoo. Os índios pegam os pedaços e com as mãos, rasgam a carne assada, retiram pedaços que são devorados.

Sinto que vou vomitar.

— Se você quiser parar, pode descansar no divã — disse Oslim.

A comilança termina, pareciam todos saciados. Os ossos dos mortos foram preservados. Os crânios foram fincados em estacas e colocados à frente da oca daquele que o havia capturado.

— Pule para uma data há mais trinta dias — disse Oslim.

— Não existo nesta data.

— Retroaja apenas o necessário para ver como findou essa vida — disse Oslim.

— Amanhece um novo dia, a aldeia está em grande alvoroça. Sou levado com os demais prisioneiros. Um homem dança e revira os olhos, parou a nossa frente e começou a falar na língua nativa, eu não entendo nada do que diz. Sou pego pelos cabelos e tudo fica escuro, sinto um alívio, uma serenidade impar, coisa que nunca senti antes.

Oslim que atento estava, liga o MP3 e inicia a volta da regressão.

— E daí — perguntou Oslim — como foi à regressão, em certos momentos, achei que irias desmaiar, noutra, pareceu-me que irias vomitar.

— Foi tudo muito real, e horrível, até os cheiros eu sentia. Acho que descobri o porquê de não gostar de carne assada, e de sentir o cheiro de carne assando.

— Você durante a regressão, narrava tudo o que estava vivenciando em seu transe. E dizer que tais situações realmente aconteceram, por volta de 1600 — disse Oslim.

— Eu já ouvira falar em canibalismo, mas nunca pensei que fosse assim, como vivenciei, isso merece uma pesquisa na internet.

No dia seguinte, busquei na WEB, o que estava disponível a esse respeito. Encontrei em diversos sites, histórias de canibalismo pelos índios. Algumas coisas que não entendi, foram esclarecidas pelos historiadores. Eles comiam a carne e bebiam o sangue dos prisioneiros, pois achavam que assim fazendo adquiririam sua força e coragem. Por isso as mães, embebiam o bico dos seios no sangue e davam aos bebes para chuparem. Descobri ainda, que quando se tratava de guerreiros de outras tribos, estes não fugiam, pois, era honroso ser sepultado nos estômagos do inimigo. E, quando ouvi o sacrificador proferir palavras não entendi o que dizia a suas vítimas, as quais que seriam:

— No pertence a nação... (tal ou qual), nossa inimiga? Não mataste e devoraste, tu mesmo, nossos parentes, a vítima respondia: sim, sou muito valente, matei e devorei muitos...“Replicava então o executor: ” Agora estás em nosso poder; logo serás morto por mim e devorado por todos, para a vítima, aquele era um momento glorioso, já que os índios brasileiros consideravam o estômago do inimigo a sepultura ideal.

Após a primeira experiência bem sucedida, eu e Oslim combinamos que na próxima semana, voltaríamos a nos reunir para dar prosseguimento aos nossos estudos relativos a regressões às vidas passadas.

TERCEIRO CAPÍTULO

Após haver feito a malograda regressão a uma vida passada que me trouxe uma inquietação e um mal estar irreparável. Resolvi que em havendo uma próxima, esta deveria ser a uma vida que não me causasse traumas no presente.

Por isso resolvi que somente faria uma nova regressão se pudesse controlá-la e desistir dela se me parecesse inconveniente.

Nas minhas pesquisas apreendi que as vivências passadas não têm um tempo cronológico, pois este apenas serve para orientação, pois o tempo é uma realidade transcendente as nossas limitações espaciais. Que a fronteira entre o presente, passado e futuro é meramente didática. Portanto, todos acontecem simultaneamente, não havendo tempo nem espaço. A regressão às vivências passadas nos propícia, não apenas uma visão global do nosso Ser, como também a conscientização da nossa existência atual, revelando nossas experiências negativas que poderão ser trabalhadas para que não mais se repitam, ou que deixem de nos causar perturbações na vida presente.

Que na regressão, não importa realmente se cremos ou não em reencarnação.

Também não é importante sabermos se as vivências que foram experimentadas na regressão de fato ocorreram ou não.

Diante dessas informações, concebi a ideia de que, tais experiências podem ser transferidas geneticamente, que algum dia talvez, a ciência descubra um gênio que explique que as experiências dos nossas antepassados sejam transferidas para o nosso subconsciente a través da genética.

Vários autores são unânimes em afirmar que as experiências de vidas passadas, só são validas, se tiverem como objetivo, corrigir medos, repressões, culpas e eventos mal resolvidos em vidas passadas, a fim de serem feitas escolhas mais adequadas no presente; Detectar traumas, oriundos de vidas passadas, que fazem com que nos sintamos reprimido e limitado na nossa vida atual.

Aprendi que a regressão não está ligada a nenhum tipo de religião, crença ou credo. Para que a regressão funcione basta que haja aceitação do procedimento.

Que todos nós somos capazes de fazer regressões, bastando, para tanto, usarmos a nossa imaginação. Todos nós temos uma capacidade de criar imagens e, sobretudo, todos nós podemos intuir as respostas para os nossos problemas. E que, estas respostas estão dentro de nós mesmos. Só necessitamos permitir o acesso. Para que ela, regressão, funcione é necessário estar aberto para as respostas que surgem em nossa mente deixando o ceticismo e a parte racional de lado.

Que não existe nada de sobrenatural nem de milagroso. Há apenas o desbloqueio e a integração emocional, que aliado à sua vontade de mudar de vida, atuam para abrirem certa área de sua vida que estava bloqueada ou desequilibrada.

De tudo o que sabia sobre regressão, e confesso que era pouco, tinha medo, que era o de "não voltar" de uma regressão ?

Neutralizei esse medo ao saber que a regressão apenas contata com memórias antigas, sendo que essas memórias que veem ao presente, nós não nos projetamos no passado, portanto nada de mais poderá nos acontecer.

É o mesmo que acontece quando abstraímos, nos projetando no futuro, sobre algo que não aconteceu, mas que poderia ter acontecido. Certamente com você caro leito isso já tenha acontecido por diversas vezes.

Lembro que certo dia, eu tinha de sair da estrada principal e entrar em uma estrada secundária de chão batido. Atrás de mim, vinha uma carreta em velocidade normal. Sinalizei que iria entras no acostamento e comecei a entrar, quando aparece um caminhão, saindo

de uma fábrica ocupando o acostamento, colocando-se a minha frente.

Se parasse, seria abalroado pela jamanta se não conseguisse parar bateria no caminhão que estava a minha frente. O que fiz foi providencial, freei e arrastando as rodas virei o carro para a direita, indo parar lado a lado com o caminhão enquanto a carreta passou buzinando. Parado, projetei a cena de ter sido abalroado pela carreta e prensado entre ela e o caminhão. Confesso que a abstração foi tal que me causou um mal estar tão grande que cheguei a sentir náuseas. Mas, nada havia sofrido, apenas o meu emocional havia sido afetado.

Uma pergunta que me fiz, após a última regressão, a qual me causou uma angústia incontida, foi se as situações vivenciadas durante a regressão realmente ocorreram ?

Eu na regressão havia sentido o cheiro a carne assando, ouvia a fala do índio em uma língua não conhecida, sentira o cheiro do sexo de Mécia-Assu e o gosto dos seus beijos.

Não há como saber se as situações vivenciadas durante a regressão realmente ocorreram e se ocorreram exatamente da maneira que eu vivenciei.

Ainda com muitas interrogações, sobre o assunto, resolvi fazer uma nova regressão.

Sigo em passos lentos e cansados até chegar a uma casa, onde no andar superior, há a luz que me servira de guia. A casa e enorme parece estar abandonada há muitos anos. O lastro de madeira na entrada estava parcialmente destruído, com tabuas podres e outras soltas. Forço a porta, está trancada no piso dando a impressão de que há muito não era aberta. Forcei-a, mais uma vez, e ela despencou caindo pesadamente sobre o piso que se desmoronou com o impacto. Com um salto escapo do impacto, recuo alguns metros e olho para cima vejo a luz que iluminava o andar superior, nada lá dentro se movia. A luz bruxuleante dava a entender que seria proveniente de um lampião a óleo. Espero deixando a poeira sentar, e sob a pouca iluminação propiciada pela lua, avanço sobre as tábuas podres que quebravam ao serem pisadas, até chagar ao portal e adentro na casa.

Uma grande sala, com uma escada de madeira na lateral direita alcançava o andar superior. Tudo lúgubre uma vês que apenas havia a pouca luz do luar que entrava pela porta arrombas. Tudo parecia em estado de total decomposição. Dirijo-me a escada e experimento pisar no primeiro degrau e constato que se quisesse chegar ao andar superior, teria de ser por outro meio, a escada estava podre e certamente não resistiria o meu peso. Após o exame, olho para cima e avisto um homem que começava a descer a escada, portava ma mão direita, um lampião a óleo, o qual iluminava a sua frente.

Não o podia vê-lo, pois sua imagem permanecia escondida na penumbra, atrás do lampião.

Apressei-me a dizer ao homem do lampião, que cuidasse, pois, os degraus estavam podres.

— Não se preocupe senhor, conheço esta escada como a palma de minha mão.

— Boa noite! Chamo-me Walter Harres de Oliveira. Tive o meu coche atolado perto daqui.

O homem se aproximou e disse:

— Eu estava a sua espera senhor.

— O senhor mora aqui? — perguntei com voz embargada.

— Digamos que sim e que não, estou aqui neste momento a sua espera.

Ao chegar próximo de mim, estendeu a mão e eu a apertei com firmeza e dizendo:

— Tenho satisfação em conhecê-lo senhor?

— Guardião, senhor! Guardião.

— Senhor Guardião, disse que me aguardava, se ouvi bem.

— Sim, eu passei as últimas noites, sinalizando com o meu lampião, para atrair alguma pessoa que estivesse passando. Casualmente o senhor foi quem respondeu ao meu chamado.

Quando o vi sob a luz oscilante do lampião, pude notar que seu semblante tinha uma expressão de sofrimento no rosto como alguém que se encontra numa situação perplexa.

Tinha certeza de tudo o que estava acontecendo na regressão estava sendo monitorado, gravado e ouvido por Oslim e, que ele estava preparado para a qualquer momento que notasse que estivesse me envolvendo numa situação embaraçosa faria voltar na regressão, por isso, nada teria a temer.

Deixei-me levar e continuei na regressão.

— Mas, me diga senhor Guardião! Guardião de quê?

— Sou o guardião da entrada para outro mundo.

Olhei fixamente para ver se ele estava troçando de mim, mas tinha um ar absolutamente sério, o que fez com que lhe perguntasse.

— Por acaso quer dizer que é a morte? Pois, o meu ver, somente vamos para outro mundo quando morremos.

— Ledo engano senhor, aqui neste local está a entrada para um mundo maravilhoso, inimaginável.

— Pretende me mandar para esse maravilhoso mundo?

— Não se trata disso, eu estou aqui na espera de alguém que me possa ajudar a retornar ao meu mundo. Este aqui não me parece bom.

Olhei-o demoradamente tentando ver alguma diferença que o pudessem qualificar como um ser diferente de mim, mas nada notei, ele me pareceu um homem comum, a não ser pelas suas vestes, que a primeira vista, me pareceu estarem um tanto apertadas.

— Você disse que guarda uma entrada, e onde ela realmente se localiza? — perguntei-lhe mostrando curiosidade.

— Logo ali aos fundos do velho prédio, bastará que nos o contornemos, me acompanhe e aproveitemos que o luar clareia todo o local.

Contornamos a casa e ao fundo, no pátio, lá estava um grande poço de forma redonda, com paredes construídas em pedras negras. Aproximamo-nos e o meu interlocutor disse:

— Este poço profundo nos levará ao mundo que lhe falei, para lá chegarmos, basta que nos lancemos em queda livre.

— Se é assim tão simples, porque ainda está aqui?-perguntei olhando-o firmemente.

Ele pareceu aflito e embaraçado com a minha pergunta, demorou a responder e quando o fez disse:

— Você certamente não entenderia se eu lhe respondesse. Mas vamos lá. Existe uma parte da descida que necessitamos de ajuda, quando vim estava acompanhado de um amigo, que teve o pescoço quebrado ao cair do andar superior ao térreo desta velha casa.

— E o que fez com o corpo dele, perguntei?

— Fiz o que deveria fazer nesse caso, lancei o corpo dele no poço.

- E porque fez isso?

— Fiz para que ele chegasse a um lugar onde ficará flutuando, simplesmente parado no espaço. Para quando eu lá chegasse o ajudasse a romper a barreira neutra. — Tudo me parece história para boi dormir, respondi-lhe fechando o senho.

- Não o posso censurar realmente isso para você deve parecer um grande absurdo.

— Mas, digamos que eu tope saltar no poço junto com você, quem pularia primeiro eu ou você?

— Nenhum dos dois casos. Saltaríamos ao mesmo tempo, pois saltaríamos abraçados, ou amarrados por uma corda, se o preferires.

— Faça-me acreditar na existência de tal mundo maravilhoso.

— Ele é constituído de vilas e cidades, como o mundo de vocês, só que lá não há a mesma deterioração que afeta o mundo da superfície.

— Está me dizendo que esse mundo fica nas entranhas do planeta.

— Sim, é isso que estou lhe assegurando.

Não sei por que, mas eu acreditava em tudo o que estava me dizendo.

Oslim que estava no controle, vendo o quadro em que me encontrava, não desenvolvia, intervêm dizendo:

— Procure avançar essa etapa de incerteza.

Logo o dia estava claro, o sol estava quase que a pino, quando disse ao Guardião:

— Vamos nos lançar no poço e seja o que Deus quiser.

Estávamos amarrados um ao outro, pelo tronco, por uma corda de grosso calibre, subimos na murada do poço e nos lançamos em queda livre.

Mal começamos a queda livre o poço aumentou o seu diâmetro e nossos corpos mergulharam numa negra escuridão, não conseguíamos nos manter em uma posição só os nossos corpos, amarrados um ao outro, começavam a rodopiar, ora estávamos rodando para um lado, ora para outro. A queda acelerada, o que me causou ânsia de vomito seguida de vertigem, iguais a que tinha quando de um surto de labirintite.

Oslim atento a tudo o que estava acontecendo, deu partida no MP3, interrompendo a regressão.

Voltei ao salão, sentei-me no divã, meu corpo experimentava um mal estar semelhantes ao que tinha quando de um quadro de labirintite. A tensão foi passando, passando, quando meu corpo se tornara calmo, Oslim desligou o MP3 e falou com voz moderada:

— Retorne ao local onde estivera antes, logo após a queda, num momento em que não mais esteja caindo.

Vejo-me parado com o meu corpo flutuando no ar. O homem que se lançara comigo, estava ao meu lado e também flutuava.

Não havia qualquer fonte de luz aparente, mas uma penumbra fazia que enxergássemos tudo o que nos cercava.

— Onde estamos e o que aconteceu que estamos simplesmente flutuando no espaço com estivéssemos levitando? — perguntei ao Guardião.

— É exatamente isso que está ocorrendo, devemos nos movimentar neste ambiente como se estivéssemos dentro d’água, utilizando movimentos de impulsão do corpo para frente, e movimentando pernas e braços, assim conseguiremos avançar.

Com tais movimentos conseguimos chegar até uma rocha que aflorava no solo. Segurei-me a ela o mesmo fez o meu acompanhante e ali ficamos parados. Olhei para o Guardião eles estavam atento procurando alguma coisa pelas redondezas. Nesse momento Oslim, queria saber onde estávamos e perguntou mansamente:

— Veja o que se encontra no local onde estão, o que há além da paisagem se é que ela existe?

— Há um grande espaço, olho para baixo e vejo rochas estratificadas, olho para cima e vejo também rochas, não há estalactites ou estalagmites, porque não há espeleotemas neste local se se trata evidentemente de uma caverna ou coisa que o valha? Faço esta pergunta ao Guardião e ele responde:

— Estamos exatamente no meio do caminho entre duas superfícies do nosso globo a interna e a externa, por isso não há gravidade nesta zona, estamos no meio de uma zona neutra.

— Mas, Guardião! Não entendo como isso está acontecendo? Podes me explicar melhor?

— Sim, posso tentar te explicar melhor. Mas no momento estou preocupado com o meu parceiro que desapareceu nesta zona.

— Antes de despencamos no abismo do poço, você me disse que teria de ajudá-lo neste ponto neutro.

— Sim, para avançarmos teremos de estar amarrado um ao outro, pois no caso de um despencar, o outro segura e, assim podemos vencer a neutralidade gravitacional e subirmos até o centro da terra.

Mas antes devo encontrar o corpo do meu parceiro e amigo, que deve estar flutuando pelas redondezas.

Procurou por alguns instantes e como não o viu, sendo impossível permanecer naquele local em tais circunstâncias, resolvemos que era chagada a hora de subir para o interior deixando a linha neutra.

— Mas Guardião! Como podemos subir para o interior, se descemos da superfície — perguntei-lhe.

— Neste estágio tanto faz subirmos para a superfície ou subirmos para o interior, a gravidade vai aumentando à medida que subimos, por isso, tanto faz subirmos para o interior ou para a superfície a gravidade acontecerá de qualquer maneira.

— Não entendi bem, mas vá lá. Eu acredito.

— Vou lhe explicar melhor, para que seja possível você entender:

o nosso planeta tem paredes, ou uma casca na espessura de mil e trezentos quilômetros, a exatamente seiscentos e cinquenta quilômetros, justamente no meio dessa crosta, há uma faixa, chamada de linha neutra, local onde estamos neste momento, onde a gravidade, como acontece com qualquer ímã, troca a polaridade. Dessa forma, ao atravessarmos a crosta terrestre, a gravidade vai diminuindo até chegar à linha neutra onde ela e zero, quando se começa a subir, ela vai aumentado até chegar no outro lado da crosta, onde há um mundo que é iluminado e aquecido por um sol, sim, uma bola de fogo que se formou dado ao efeito centrifugo e centrípeto. Quando o planeta estava sendo formado, os seus componentes mais pesados, como o cromo, níquel, ouro, prata, cobre e o chumbo, estavam na forma líquida, eles foram se concentrando no centro, enquanto que a força centrifuga afastava deles os materiais mais leves. A medida que o planeta foi se solidificando, formou-se o equilíbrio entre as forças atuantes que ficaram em equilíbrio, sob o efeito da gravidade e o movimento de rotação. As massas líquidas mais pesadas se concentraram no núcleo a uma distância de três mil e oitocentos quilômetros, se mantendo em constantes reações atômicas, produzindo calor e luz. Dessa forma atuando como um sol interno que aquece a superfície interna do globo. Entendeu?

— Acho que agora entendi.

— Então podemos continuar a nossa caminhada, que até chegarmos à superfície interior levaremos muito tempo, agora com pequena gravidade, quase nenhuma, o que nos permitirá andar vários quilômetros em um dia, mas quando chegarmos perto da superfície interna a gravidade passará a ser de um G, dificultando o nosso andar. Teremos nessas circunstancias subir escarpas e ai é que um só homem não consegue fazer, sem assumir grandes riscos.

— Diga-me o que comeremos e como obteremos água?

— Este caminho foi por mim percorrido por diversas vezes, por isso, tenho pontos de abastecimentos, tanto de água como de alimentos sólidos, não se preocupe, tudo está sob o mais absoluto controle.

Nesse momento Oslim interfere e diz com voz mansa e serena:

- Avance no tempo, até chegarem perto da superfície.

- Devemos estar próximo da superfície, estejamos preparados para atingirmos a superfície interna do globo terrestre nas próximas horas- disse o Guardião.

Finalmente chegamos a uma furna onde a claridade entrava por fendas no teto. Era a superfície, onde o sol, que brilhava entrava pelas fendas. Escalamos a murada íngreme e finalmente saímos das entranhas da terra.

Ao ver tudo o que me rodeava, eu era só interrogações, me voltando para o Guardião disse:

- Mas o que vejo, estamos na superfície da terra, mas não é a superfície que conheço. O sol brilha, mas, não é o mesmo sol que estou costumado a ver, é menor e menos intenso. A vegetação é abundante cobrem os vales e as montanhas. É possível ver no fundo do vale um rio que corre. Mas onde estamos?

- Estamos no mundo maravilhoso que lhe prometera, aqui não há poluição, a água que corre nos rios podem ser bebidas sem qualquer restrição. O ar é puro e provem de uma corrente que vai de um polo ao outro, entrando no polo sul e se dirigindo ao polo norte ou vice e versa. Tudo o que se planta a aqui dá, os frutos são mais saborosos, os animais são mais dóceis, não há insetos, roedores ou qualquer animal que seja prejudicial ou predador de outras espécies.

As cidades são construídas sem que possam, prejudicar o meio ambiente, os esgotos são todos tratados na origem, nada é lançado na natureza que não seja compatível com o ambiente que irá recebê-lo. Este é o mundo ideal e eu sou o Guardião que tenho como missão

não deixar que seres da superfície o invadam em grandes números, só permitimos alguns escolhidos como você.

Vejo-me novamente deitado no divã no grande salão, a voz de Oslim, dizendo, que despertaria e me recordaria de tudo o que havia visto e passado.

Otrebor Ozodrac
Enviado por Otrebor Ozodrac em 04/12/2021
Reeditado em 23/01/2023
Código do texto: T7399667
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