Formigas

[Continuação de "Na Competição"]

- Entendo que mandar de volta a nave, em piloto automático, deve ser entendido como um convite, não como um ato hostil. Aparentemente, eles pretendem reagrupar a tripulação completa.

O inspetor Hasselblad estava reunido com os dois remanescentes da equipe do capitão Espinoza, a Dra. Takahata e o engenheiro Hans Oberth, bem como a capitã Marjani Nnamani, que o levara de Arapa-IV até Moabe-6387-V.

- Quer então que embarquemos no cruzador, o qual provavelmente irá nos levar até onde nossos companheiros estão presos... supondo que ainda estejam vivos? - Nora Takahata mostrava-se justificadamente relutante em aceitar a sugestão de Hasselblad, mesmo sendo ele o estrategista que era.

- Sei que isto soa demasiadamente arriscado, mas meus instintos me dizem que os tais Construtores não nos desejam fazer mal... pelo menos, não deliberadamente. Capturar a tripulação de Espinoza e mandar a nave de volta, talvez seja uma tentativa de fazer contato com algo que não conseguem entender.

- Mas... se a ideia era fazer contato, porque simplesmente não mandaram um dos nossos com um recado? - Questionou Oberth.

- Eu não trago respostas prontas para as suas dúvidas - atalhou Hasselblad. - Estou colocando o que penso que sejam as motivações dos Construtores. E, para que não reste nenhuma dúvida sobre meu comprometimento com a ideia apresentada, eu e a capitã Nnamani somos voluntários para seguir com vocês no cruzador retornado. Nós e algumas melkis, que vieram de Arapa-IV conosco.

Takahata e Oberth entreolharam-se. Finalmente, Takahata fez um sinal de concordância com a cabeça.

- Está bem. Se há alguma esperança em resgatar os nossos companheiros, eu estou nessa.

- Conte comigo - acrescentou Oberth.

Hasselblad virou-se para a capitã Nnamani:

- Bom, então só nos resta fazer o traslado da Rainha dos Amaldiçoados e suas servas para o cruzador de Espinoza.

- Vou providenciar isso - acedeu a capitã.

E para Takahata e Oberth:

- Estejam prontos para partir em uma hora.

* * *

Com sua nova tripulação à bordo, o cruzador de Espinoza decolara rumo ao Rabicho de Nawagar, transformado pelos misteriosos Construtores numa megaestrutura de seis anos-luz de diâmetro. Hasselblad convencera Marjani Nnamani a não levar seu próprio cruzador como escolta, visto que entendia que isso poderia ser mal interpretado pelos alienígenas.

- Para estas criaturas, devemos não ser mais do que formigas... tanto em termos de escala, quanto de desenvolvimento tecnológico... portanto, dá no mesmo levar um cruzador de escolta ou uma esquadra inteira. Não fará a menor diferença.

Nnamani teve que reconhecer que o raciocínio era lógico, e a contragosto, deu ordens à sua tripulação que permanecesse em órbita de Moabe-6387-V.

O percurso até o Rabicho de Nawagar, situado 2.500 anos-luz sobre a Galáxia, levou metade do tempo gasto por Espinoza para chegar ali. Oberth disse que suspeitava que os propulsores houvessem sido alterados para dobrar seu rendimento, embora ele não tivesse a mínima pista de como isso poderia ter sido feito.

- Agora, se voltarmos, vou sugerir que desmontem a nave para que descubramos como podemos aplicar isso em escala industrial - comentou.

- Talvez jamais venhamos a descobrir - ponderou Hasselblad. - Desconfio que utilizaram algum método que está muito além das nossas possibilidades técnicas.

- O senhor está me deixando deprimido, inspetor - retrucou o engenheiro.

- Formigas - foi a pronta resposta de Hasselblad.

Iluminada apenas pela fraca luz da Via-Láctea abaixo dela, a megaestrutura mostrava-se como uma vasta massa cinzenta contra a escuridão maior do espaço intergalático. O cruzador reduziu a velocidade e começou a se aproximar de um ponto situado na face inferior do grande disco que compunha o topo da monstruosa construção. A medida que ficavam mais próximos da superfície do objeto, perceberam que esta era composta por placas em vários tons que iam do branco ao preto passando por todos os tons de cinza intermediários. Cada uma das placas, calculou Oberth, tinha uma área equivalente a de um planeta como Júpiter.

- Decididamente eles não economizaram material - ponderou Hasselblad.

Um ponto preto numa placa cinza abaixo deles começou a crescer, a medida em que iam baixando. Acabou por revelar-se como a boca de um túnel escuro, que conduzia às entranhas da megaestrutura. Em breve, o espaço interestelar ficou para trás e viram-se imersos em trevas.

- Se são tão avançados, poderiam ter providenciado iluminação - resmungou Nora Takahata.

A resposta tardou alguns segundos.

- Estou vendo luz lá na frente - disse a capitã Nnamani, apertando os olhos para enxergar algo na grande tela frontal da ponte de comando.

Demorou um pouco para que os demais vissem o ponto de luz, mas, finalmente o fenômeno tornou-se perceptível para todos os presentes.

- Há uma luz no fim do túnel - filosofou a Dra. Takahata.

- Mais do que isso... - complementou a capitã. - Há sóis no fim do túnel. As estrelas do Rabicho de Nawagar... estão todas ali dentro!

E quando o cruzador emergiu do túnel no vasto espaço vazio dentro da megaestrutura, todos visualizaram o que ela havia acabado de descrever.

[Continua]

- [11-12-2017]