“Houve um tempo em que o homem enfrentou o universo sozinho e sem amigos. Agora ele tem criaturas para ajudá-lo; criaturas mais fortes que ele próprio, mais fiéis, mais úteis e totalmente devotadas a ele. A humanidade não está mais sozinha.”
Isaac Asimov

 
 
 
 
O ano desse acontecimento não será citado para evitar conflitos jurídicos.
No entanto não posso ignorar a culpa de uma corporação em colocar nas mãos de autômatos não testados a vida de alguns cidadãos prestes a completar cento e vinte anos de idade.
Não posso acreditar que foi um curto circuito apenas o causador da chacina, eles eram uns robôs da sétima geração programados para serviços domésticos, eram verdadeiros serviçais. Estou certo que muitos entenderão a minha investigação e muitos acharão até ridículo abrir novamente um caso com mais de cinco anos.
Confesso que na ocasião tinha apenas sessenta e nove anos e estava no auge das minhas faculdades mentais e físicas, consequentemente não colocarei mais detalhes sobre mim devido a complicações biológicas e alterações genéticas não registradas. Entretanto o caso acontecido com uma dúzia de cidadãos totalmente saudáveis e longevos não foi uma total e catastrófica fatalidade devido a uma rápida e eficaz ação da polícia distrital em tirar de circulação os humanoides com defeito. Contudo o descaso de uma corporação inescrupulosa em colocar no mercado as trinta e cinco unidades de autômatos não testados, mesmo com todos os rigores na fabricação de peças e linhas de montagem sem intervenção humana, não foi apenas uma unidade a apresentar o defeito, foram trinta e cinco robôs serviçais os causadores dessa terrível onda de assassinatos.  Minhas investigações prosseguiram em sigilo e estou certo do erro fatal cometido por uma corporação para qual trabalhei durante sete longos anos deve ser punido.
O primeiro e o último caso aconteceram da mesma maneira mecânica e trágica.
Os cidadãos tiveram as gargantas cortadas as oito horas e vinte cinco minutos do dia sete de julho, exatamente no mês e dia em que completei sessenta e nove anos, não foram um, nem dois, mas seis as vítimas fatais dos autômatos defeituosos, todos os trágicos casos acontecidos enquanto era servido o café da manhã.
 
Deixo essa mensagem gravada em um lugar secreto. Talvez ninguém saiba que tenho a prova, sim a gravação condenatória descartando a possibilidade de que não foi um mero curto circuito o causador da trágica onda de autômatos enlouquecidos quebrando os protocolos de programação e levando a morte seis cidadãos, sem dúvida havia algo comum entre as vítimas, os mesmos eram acionistas da empresa fabricante dos robôs assassinos. É um fato estranho os autômatos serem adquiridos por pessoas tão influentes e com idades medianas. Foi de fato uma perda inestimável de pessoas em plena saúde física e mental, afinal hoje em dia é muito comum passar com certa folga dos cento e cinquenta anos.
 
Eu acredito que descobrirei o real motivo dos assassinatos, entretanto meus implantes começaram a apresentar defeitos depois que abri o caso. Essas próteses biônicas são de última geração e se adaptam ao corpo perfeitamente, contudo sinto que uma programação maliciosa entrou no meu chip implantado sob a pele. Não estamos seguros isto eu tenho certeza, a corporação se livrou das minhas acusações alegando falta de provas, e em seguida apresentaram um laudo assinado por um perito, certamente uma marionete da corporação. O laudo listava uma série de divergências, contudo foi aceito pelo juiz, o laudo alegava estresse mnemônico. Não vou negar meus acessos de raiva fanática diante da frieza dos advogados contratados para me acusar.
Sim eles sabem como persuadir a lei, nos dias de hoje o poder da influência corporativa se tornou uma miíase na sociedade, certamente algum dia eles descubram o que houve de errado com os trinta e cinco androides, talvez para mim seja tarde demais.
O fato que todos já sabem, estamos nas mãos de uma inteligência severa e calculista, não há como escapar. Ouço os passos no corredor, sinto que estão chegando perto, vão me pegar e apagar minha memória isto eu tenho certeza.
Eu acompanhei pela TV a subida dos policiais depois que perdi o caso, sei o que vão fazer comigo, vão me levar e colocar naquela maldita máquina para apagar tudo o que sei.
Não sou ninguém para esses malditos cumpridores da lei, são autômatos talhados na lógica na aterradora e imutável lógica, eles sabem as leis, sim eles sabem todos os artigos, todos os parágrafos.
 
Então a verdade veio na forma de um curto circuito, sim foi um mero curto circuito que usaram para apagar tudo o que sabia sobre os assassinatos, e o maior terror foi saber que a maldita corporação ficara impune de seus crimes e logo estarei trabalhando para eles novamente no total esquecimento. Horrível são os pesadelos que tenho, sonho com os malditos autômatos entrando pela porta da frente com lâminas afiadas nas mãos, os mesmos androides que ajudei a programar.

 
 
FernandoCreed
Enviado por FernandoCreed em 09/01/2019
Reeditado em 09/01/2019
Código do texto: T6546663
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