Decisão difícil

A "Hipólita" não era uma astronave militar. Portanto, quando fomos interceptados pelos piratas dos Asteroides a caminho das Colônias de Júpiter, eu não tinha a opção de um mecanismo de autodestruição que evitasse que nossa carga de replicantes em animação suspensa, valendo milhões de créditos, caísse nas mãos dos salteadores. Ou melhor: o mecanismo não existia, mas eu sabia precisamente como criar um que causaria o mesmo efeito. O que eu não contava era com a interferência de um robô da manutenção, o PLD-492, que se interpôs entre mim e o acesso à sala do reator de fusão da nave. Os PLD, popularmente denominados "Série Paladino", não eram conhecidos exatamente por sua elevada capacidade de raciocínio.

- PLD-492, ordeno que me dê acesso à sala de controle do reator! - Exclamei para o colosso metálico de 2,30 m de altura.

- Desculpe, piloto Conrad - replicou calmamente o robô. - A entrada é permitida apenas para pessoal de manutenção habilitado. Não há nenhum equipamento nesta sala que dependa de sua intervenção direta.

- Eu não pretendo fazer manutenção, PLD-492! Preciso colocar o reator em sobrecarga, para que exploda a nave e impeça que os piratas coloquem as mãos na nossa carga! - Bradei.

- Mais um motivo para que eu não permita a sua passagem, piloto Conrad - retrucou o Paladino. - Isto colocaria a sua vida em risco, algo que eu não posso permitir com base na Primeira Lei da Robótica.

- Eu não pretendo explodir com a nave, PLD-492. Vou programar o reator e depois fugimos num bote salva-vidas - expliquei. - Isso tem que ser feito rápido, pois os piratas em breve estarão a bordo!

O colosso pareceu hesitar.

- Eu e você escapamos... mas e os piratas?

- Os piratas serão mortos na explosão, é claro; se não forem, destruirão o bote salva-vidas conosco dentro. Como vê, precisamos optar entre a nossa existência e a deles.

O Paladino quase pareceu convencido, mas finalmente ergueu um dedo.

- Certo, mas... e os replicantes?

- O que têm os replicantes? - Indaguei exasperado.

- Eles não são seres humanos? Vamos explodir a nave com eles dentro?

- Tecnicamente, replicantes não são seres humanos - retorqui. - São criaturas produzidas em laboratório.

Como o Paladino continuasse imóvel, acrescentei:

- Ademais, estes replicantes ainda não foram ativados. Para todos os efeitos práticos, não são criaturas vivas.

Tarde demais. Um estrondo às minhas costas anunciou a entrada dos piratas no compartimento onde eu estava. Vi-me perante meia dúzia de bocas de fogo, empunhadas por homens barbados em trajes espaciais remendados.

- Onde pensa que vai, piloto? - Indagou sardonicamente o comandante, um sujeito de cavanhaque preto com uma cicatriz no rosto.

Virei-me para trás e encarei o robô.

- PLD-492, está vendo estes homens? Eles vão me matar se você não sair da frente.

É incrível como um Paladino pesando quase 300 kg consegue ser ágil, quando a vida do seu mestre está em óbvio perigo. E enquanto ele baixava o braço nos piratas, entrei na sala do reator e programei a sobrecarga. Pouco depois, embarquei num bote salva-vidas e entrei as coordenadas para retornar à Marte. Infelizmente, o Paladino tombou em minha defesa e eu teria que seguir sozinho.

E enquanto o salva-vidas disparava pelo espaço, a "Hipólita", atracada à nave dos piratas, explodiu como uma supernova, enchendo as trevas de luz por um breve instante. Quando voltei a enxergar, nada mais ali havia, além de uma nuvem difusa de destroços.

- [11-01-2019]