Acontedio na viela

Três tiros no escuro foram ouvidos. A princípio tomou-se aquilo por apenas estampidos, sons ocos vindo de uma viela sem importância, que servia mais de esgoto para a escória da sociedade que vinha sei lá de onde. Só depois do grito é que se foi dar algum tipo de atenção. O pedido agoniado de socorro que vinha misturado com choro e baba, ou não era baba? Das raras pessoas que passavam pela calçada pouco iluminada somente se viam os olhos curiosos tentando atravessar a massa quase sólida de escuridão, nenhuma ajuda. Os sons iam ficando minguados, tornando-se soluços espasmódicos, até que a cantaria dos gatos vadios abafou os sons vindos da viela. Logo, uma sombra caminhou até próximo o início da viela, em um lugar onde a penumbra ainda não deixava ver o sangue que lhe cobria as mãos, recostou-se na parede e escorregou até estar no chão, abraçou os joelhos e enfiou a rosto entre as pernas, deixando-se assim ficar. A pálida lua havia caminhado um bom pedaço do céu quando finalmente luzes vermelhas piscantes deram um pouco de luz àquele lugar. Duas figuras desceram do carro e olharam para a figura esquálida e suja encolhida na boca da viela chamando-lhe a atenção. Os olhos marejados e fundos ergueram-se fitando os homens de uniforme, causando-lhe ainda mais transtorno. Os homens fizeram algumas perguntas no qual a criatura respondia apenas meneando a cabeça. Esqueceram por instantes a existência dele ali e olharam ao redor, nada viram, então deram alguns passos dentro da escuridão, seus corações palpitavam acelerados e descoordenados como se gritassem, e um podia ouvir o coração do outro bater alto, gritar. Olharam-se e seus olhos diziam ao outro que ali dentro não havia nada que eles pudessem fazer. Viraram os pés e saíram apressados nem notando a falta daquela pessoa na boca da viela. Horas depois, quando a madrugada dava vez para um sol tímido ir aparecendo, uma senhora distraída se assusta com algo e sai em disparada, deixando cair os pães que acabara de comprar. Minutos depois patrulhas param em frente à boca da viela, um pequeno círculo de curiosos já havia se formado, todos tinham no rosto a expressão de assombro e negação. Estavam a olhar um cão vira-lata, tão magro que era apenas couro e osso, e estava a saciar sua fome, mordendo, rasgando e comendo um braço humano.

Juliano Rossin
Enviado por Juliano Rossin em 26/11/2008
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