MEU AMOR MISTERIOSO - Parte 6

– Clarinha! Olha quem veio nos visitar! – Dona Iara abriu a porta sendo seguida de Mariana e Ricardo. Porém, a casa estava vazia e escura. – Ué! Onde está Clarissa? Clarissa!

Ricardo acendeu a luz da sala. Não havia sinal da neta em lugar nenhum. Ele foi até o quintal e voltou segundos depois.

– A bicicleta não está aqui. Acho que ela foi dar uma volta.

Dona Iara mostrou toda sua inconformidade.

– Ela me disse que ficaria em casa! Já é noite e não voltou!

Mariana tentou contemporizar:

– Pode ser que tenha havido algo urgente para ela fazer.

– Que coisa urgente Clarinha teria para fazer, Mariana? Ela não conhece ninguém aqui!

Ricardo disse:

– Clarissa é uma moça responsável, Iara. Daqui a pouco ela vai estar aí.

Mariana esperou que o homem entrasse na cozinha para sussurrar:

– Será que Clarissa não está de namorado?

– Não, de jeito nenhum! Eu teria percebido! Ela me disse que ficaria aqui, lendo.

Mariana olhou para Dona Iara com uma expressão de riso.

– Vai ver que ela encontrou aquele rapaz misterioso...

–Será? – Dona Iara pôs as mãos na cintura considerando a hipótese. – Ela teria me dito alguma coisa. Clarinha é tão ajuizada...

– Estas meninas são ajuizadas até entrar o coração no meio – devolveu Mariana com uma risadinha. – Mas não se preocupe. Logo ela vai aparecer.

Não satisfeita, Dona Iara foi até a janela.

– Vai chover, Mariana! De novo! E nada desta menina! – na cozinha Ricardo bebia um copo d’água e Dona Iara foi atrás do marido, perturbada. – Será que não é melhor chamar a polícia?

– Para quê, mulher? – Ricardo colocou o copo vazio em cima da pia e encarou a esposa. – Desde quando acontece alguma coisa nesta cidade?

– Ricardo, sua neta sumiu.

– Ela não sumiu. Foi só dar uma volta. Daqui a pouco ela vai chegar. Acalme-se.

Dona Iara, contudo, não conseguia relaxar. Mariana a olhava sem saber o que dizer.

– Eu tenho certeza que a Clarinha vai aparecer a qualquer instante – disse ela, por fim.

– Mariana, ela disse que ficaria em casa lendo! – a mulher apontou para a janela. – Olhe! Já está noite!

Naquele momento a porta da frente se abriu. Mariana e Dona Iara se voltaram no mesmo instante. Clarissa as encarava ainda com a mesma expressão de susto de quando saiu correndo da hospedaria. Nunca pedalara tão rápido na vida para fugir do bairro deserto e suas ruas escuras.

– Clarissa! Onde você estava?

A garota viu o tamanho da encrenca que havia se metido pelo olhar furioso da avó.

– Eu fui... fui dar uma volta – ela respondeu meio gaguejando. A bicicleta já havia sido deixada na garagem.

– Assim? De repente? E o livro que você disse que ficaria lendo?

Mariana escutava a tudo atentamente.

– Eu li. Mas depois fiquei com vontade de andar… de bike.

– Por que não deixou um bilhete, Clarinha? Você me deixou muito preocupada!

– Vó, por favor, me desculpe! Não quis preocupar vocês!

Ricardo apareceu da cozinha, rindo.

– Sua avó queria chamar até a polícia.

Clarissa empalideceu de vez.

– Nossa, que exagero! Eu nem fui… longe.

Dona Iara fuzilou a neta com o olhar.

– Você foi se encontrar com o tal moço bonito?

Somente então Clarissa se deu conta o quanto Mariana prestava atenção na conversa. O que ela tinha que ver com o assunto?

– Quem me dera, vó!

Ela bem que tentou ser convincente com sua mentira deslavada, sustentando, firme, o olhar inquisidor de Dona Iara.

– Tudo bem. Mas que seja a última vez. Se alguma coisa acontecer o que eu vou dizer para sua mãe?

– Nada. Não vai acontecer nada.

Clarissa ignorou o olhar vigilante de Mariana.

– Vamos encerrar o assunto. Esta confusão até me deixou perturbada. Mariana, eu me esqueci de lhe entregar a encomenda!

– Não tem problema, Dona Iara!

Clarissa aproveitou que a avó tivera a atenção desviada e foi se refugiar no quarto. O coração ainda não havia acalmado quando ela sentou na cama, respirando fundo. Apesar do medo, o retorno para casa havia transcorrido bem. O bairro tão bonito quando de dia, mas tão sinistro ao anoitecer, não ofereceu perigo algum. No entanto, tudo o que vivera parecia ser um tanto estranho.

Castelo de Pedra. Era um lugar lindo, sem dúvida. E os hóspedes? Os poucos que tivera contato haviam se comportado de forma totalmente esquisita.

Dani... Então ele era um pianista? E dos bons. A música que ele tocara ainda ressoava na sua mente e Clarissa esperava dormir naquela noite com ela nos seus ouvidos. Era uma pena que não tivesse percebido a presença dela. Talvez até lhe presenteasse com uma melodia especial. Ah, que romântico seria...

Ignorando a promessa que fizera de se manter longe do notebook, Clarissa foi até a mesinha que ficava encostada a um canto da parede e ligou o computador. Precisava saber mais sobre a hospedaria. Deveria ter algum site em que pudesse ver como eram os seus aposentos. Talvez houvesse até alguma programação de apresentação de Dani ao piano. Seria uma ótima pista.

Quase alucinada, Clarissa jogou no Google “Hospedaria Castelo de Pedra”. Não surgiram muitos links, mas um deles parecia mais esclarecedor. Clarissa clicou no endereço e surgiu um site que falava sobre lugares antigos da cidade. Em um primeiro momento, a garota não entendeu nada. Embora o site fosse atual, as fotos não o eram. Debaixo de cada imagem havia informações sobre o local, curiosidades e detalhes sobre o funcionamento. O maior destaque do site era para a hospedaria. Ansiosa, Clarissa clicou em cima e, à medida que lia, seu semblante ficava cada vez mais pálido:

"A hospedaria Castelo de Pedra foi inaugurada em 1933 e por muitos anos foi o meio de hospedagem mais procurado pelos turistas que chegavam à Santa Maria da Serra. O hotel se destacava pela arquitetura rústica, aconchego dos seus ambientes e pelo jardim criado pelo paisagista da cidade, Breno Pavão. Famosa por suas festas, apresentações e hospedagens de artistas, Castelo de Pedra encerrou suas atividades em 1990, depois que seu fundador faleceu. No local hoje só restam as ruínas de um lugar que embalou os sonhos de muitas pessoas."

Clarissa sentiu o coração quase parar. Não era possível. Havia mais fotos e a garota clicou em todas. As imagens mostravam o auge do hotel. Festas onde pessoas apareciam chiques e felizes. O piano que Dani tocara foi retratado em duas ou três fotos com seus respectivos músicos. Clarissa se deu conta que tremia e decidiu parar de ver aquilo.

Havia alguma coisa muito errada ali.

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 27/03/2018
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