Casa dos espelhos

Nunca foi minha intenção acabar sufocada pelo que criei de mim, nunca quis acabar assim. Meu objetivo desde o começo era só me achar dentro de vários espelhos distorcidos, me encontrar no meio do caos. Viver do jeito mais autentico possível, ter a minha identidade.

Soube que tinha enlouquecido durante um parque de diversões bem velho e caindo aos pedaços, até um pouco macabro, na minha pequena cidade natal, já no meio da noite. Meu brinquedo favorito sempre foi a casa de espelhos, não sei por que mas desde criança gosto de ver como reflito para o mundo, conforme fui entrando vi todos os reflexos confusos, torturados, embaralhados, distorcidos, pela primeira vez enxerguei realmente o que eu estava sendo, as imagens estavam vivas, cada espelho me mostrava um pecado, a ira, a vaidade, a ganancia, o egocentrismo, a imoralidade.

Entrei em panico. Gritei. Chorei. Queria quebrar esses reflexos ruins, queria que parasse esse caos. Então procurei algo com que eu pudesse acabar com isso, no chão um pouco mais a frente havia uma estaca de madeira que prendia a tenda ao chão, tirei a estaca, uma parte da lona saiu, fui até a frente do maior espelho e o quebrei, fiz isso em todos os reflexos que via.

Quebrei todos os vidros daquela imensa sala, cacos iam caindo em mim por causa do vento vindo da brecha na tenda, caiam no chão, caiam em outros cacos, o barulho estava alto e aconchegante porque eu finalmente tinha conseguido me livrar dos lados ruins, os machucados não me abalavam pois no final serviram para seu propósito: tirar os reflexos ruins de mim.

Mas era tudo ilusão, eu sou um espelho e eu ainda não consegui me quebrar.

Mafê Binns
Enviado por Mafê Binns em 09/05/2019
Reeditado em 01/08/2019
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