CASA 15

CASA 15

A chuva já não era tão forte, miúda, sorrateira, daquelas insistentes que molha tudo e ninguém vê .

Débora estava parada na porta da casa 15, seu coração palpitava , pensou enquanto remexia na bolsa: "que desgraça de lugar é esse?”, meses de pesquisa, horas sem sono, a procura desse lugar, quando viu aquela mulher no meio da rua, carregando um menino no colo, Débora teve certeza de que era o filho roubado naquele 13 de maio, ainda com dois meses de nascido, pois uma mãe não esquece a fisionomia do filho, mesmo que ele cresça.

-Eduardo está morto, coloca isso na sua cabeça, nós precisamos superar - gritava Lauro quando eles conversavam na cozinha sobre a maravilhosa descoberta de Débora, ela estava radiante e ele com um humor repugnante e sua ideia infeliz de morte, na sua ignorância de pai, ele não entendia, Eduardo sumiu do berço, aquela maldita criança enterrada não era Eduardo.

Débora deu dois passos para trás assustada com o focar e desfocar do número da casa, olhou o relógio, foram dias estudando aquela rotina, logo a babá sairia com a criança para um passeio matinal.

Suspirou com raiva, na sua cabeça, bem lá no fundo existia uma dúvida em algum lugar, uma voz do demônio mandando ela ir embora, largar tudo.

Nunca faria isso, uma mãe merece o seu filho, buscou na sua bolsa a arma, Lauro guardava displicentemente essa arma em um armário no escritório, nunca teve familiaridade com armas de fogo, mas uma mãe desesperada aprende tudo, se fosse preciso mataria, porque alguém estava com seu filho e agora ela sabia quem.

-Vamos a polícia - disse Lauro.

-Não acredito em policiais - Débora ascendeu um cigarro, suas mãos tremiam quando falava - eu sei que é ele, tenho certeza, não preciso de confirmação alguma.

A babá sairia com o menino dentro carrinho, talvez foi o carrinho que revelou tudo, o mesmo carrinho que a mãe de Débora deu de presente, o carrinho de bebê dos seus sonhos, mas antes de dar o carrinho, sua mãe falou aquelas palavras cruéis que nunca sairiam da sua cabeça.

-Você não deve ser mãe Débora, não com seus problemas.

Eduardo já fez o aniversário de dois anos e ela não estava lá. Esses dois anos foi o tempo de suplício de Débora, os dias que passou naquele quarto escuro, aqueles remédios, nunca esteve doente. A verdade é que ninguém respeita uma mãe desesperada.

Duas semanas antes Lauro a levou em uma psiquiatra.

-Você lembra o que aconteceu ? - perguntou a psiquiatra que usava óculos e tinha um ar superficial, maquiagem demais, sobrancelhas feitas, vestia um terno roxo, tudo nela desagradava Débora.

-Meu filho desapareceu do berço e enterraram aquela coisa no lugar dele, alguém - ela apontou ora pra um ora para outro - um de vocês quer me enganar, quer que eu desista, mas uma mãe não desiste - disse Débora.

Lauro e a psiquiatra trocaram olhares, depois como se fosse uma medusa, a psiquiatra mexeu a cabeça, olhando em várias direções e com uma voz distante disse:

-Você atirou seu filho pela janela, precisa enfrentar isso, precisa entender e perdoar a si mesma - disse e colocou a mão nos ombros de Débora - estava em uma séria depressão pós parto, ficou muito grave, tivemos que internar você, teve alta somente recentemente, estamos estudando uma nova internação, não sou a favor, mas preciso que seu comportamento melhore.

Débora fingiu uma calma que não tinha, pediu para ir ao banheiro, não ver mais aquela mulher com suas cabeças e seus olhos cruéis, tudo que ela falava era mentira, alguém havia sequestrado Eduardo e só agora ela sabia quem, aquela babá infame levava o seu filho para passear, Débora começou a desconfiar de Lauro, talvez ele tivesse uma amante, ou quem sabe aquela babá, mesmo tão jovem, se ela fosse a amante de Lauro? Talvez ele quisesse criar o filho com outra pessoa.

-Ei - gritou Débora para a babá. Enquanto tentava olhar para a babá sua cabeça rodava, confusa, pensou, estava com dúvida, o número seria 15 ou 2015 – ano da morte de Eduardo, não importa, pois aquele era o carrinho certo, então com saliva seca nos lábios gritou novamente: "ei, para sua estúpida!"

A jovem babá, não deveria ter mais que quinze anos, parou, virou-se devagar, quando Débora olhou para dentro do carrinho de bebê o que viu a aterrorizou, será que o universo dos demônios zombava dela? Estremecida, trêmula, seus olhos ficaram vermelhos, uma raiva tomou conta de Débora, então ela enfiou a mão na bolsa e pegou a arma.

-O que esse cachorro faz no carrinho do meu bebê? Cadê o meu filho?

A babá quase não consegui falar, disse alguma coisa sobre não ter a menor ideia de onde estava o bebê, ela só tinha quinze anos, levava cães para passear, não sabia nada sobre o filho de Débora.

Por um instante Débora ficou confusa, porém o cachorro latiu dentro do carrinho, foi nesse momento que Débora horrorizada pela figura daquele cachorro sujo dentro do carrinho ocupando o lugar que deveria ser do seu filho, puxou o gatilho.

JJ DE SOUZA
Enviado por JJ DE SOUZA em 24/06/2019
Reeditado em 24/06/2019
Código do texto: T6680579
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