Lua Azul. Conto III "O quarto"

Conto III – O quarto

Pousou sobre o muro alto. Olhou a sua volta apenas por instinto. Duvidava encontrar qualquer pessoa naquela altura da noite. O vento estava gelado, a temperatura da cidade devia estar menos de 10º, dado que não a incomodava nem um pouco. Ela estava trajando um vestido branco que chegava quase no joelho com decote transpassado. O cabelo estava liso como nunca. Vestia uma sandália rasteirinha com um bracelete de prata no antebraço e um colar de ouro sobre o colo. Um visual perfeito para sair. Pulou tocando o chão com muita leveza. Entrou delicadamente pela janela do quarto. Estava como havia o deixado. Ao seu lado esquerdo o hack com seu computador, do outro lado sua cama arrumada. A frente o armário de tabaco, torceu o nariz, não conseguia se acostumar com a cor do armário sedo que a cama era magno. Sorridente, jurou não pensar nisso agora. Olhou para os cantos inferiores do hack até encontrar o filtro de linha, após colocar na tomada o ligo. Apertou o botão e o bip soou pelo cômodo. Se o coração batesse, ele estaria espremido em saudade, o que ela agradeceu pela primeira vez. Enquanto o computador fazia seu ritual, Ilhina deitou na cama passando suavemente sua mão sobre a colcha, deixando a maciez tomar seu tempo. Agradeceu novamente por não ser capaz de chorar, mas as lágrimas secas já estavam lá. Sabia que não era bom, ir até aquele quarto, pois suas lembranças assombravam sua existência. Hoje ela não era mais aquela mulher guerreira, teimosa, alegre e decidida. Ela era serena, esperta, triste e perdida. Olhou para a porta, aprimorando seu faro. O cheio era forte, incomodando mais do que nunca. Morgana minha doce Morgana. Sorriu. Percebendo que o computador estava parado na tela inicial do Windows, foi até ele sentando na cadeira giratória. Correu as pastas até uma em especial, antes de abri-la hesitou, hesitou com medo de que as lembranças não ajudassem descobrir quem é, hesitou com medo de não ser capaz de sobreviver e se perder na loucura, hesitou com ansiedade de relembrar o dia mais lindo-perifeito-maravilhoso-único de sua vida. Seu casamento. Apreciava cada foto, cada detalhe, cada pessoa, analisando suas faces, sorrindo com os sorrisos e relembrando os momentos. Enquanto olhava as fotos, sentia aliviada em seu interior, pois o medo que a manteve longe daquele quarto dês que chegou a cidade há dois meses, tinha partido para nunca mais voltar. Cláudia a cobrava todo o momento, mas sabia que a amiga não fazia por mal. Quando as fotos terminaram, ela começou o ritual para desligar o computador, logo que todos os comandos foram dados, andou até o armário. Abriu uma porta grande, com vestidos, blusas sobre os cabides e abaixo entre caixas de sapato uma maior e mais larga. Puxou com delicadeza e cuidado. Passou a mão limpando a sujeira da caixa branca sentando na coma. Seus olhos cintilaram num azul magnífico quando a tampa foi levantada revelando seu lindo vestido de noiva. Quis muito tira-lo dali, mas se conteve. Olhou para seu atual vestido branco, estava daquela forma para que as lembranças produzissem os sentidos daquele dia. Fechou a caixa percebendo o feche de luz abaixo da porta. A maçaneta foi virada com lentidão, como se a pessoa temesse algo naquele quarto. A porta se abriu lenta mostrando a face de um senhor com olhos pesados de sono. Ele olhou lentamente para os quatro cantos, sentindo um arrepiou ao ver uma caixa branca sobre a cama. Percebeu também a luz acesa do monitor e das caixinhas de som. Tomado de coragem momentânea, foi até a janela, observando o muro alto, mas como não viu nada, saiu do cômodo pensativo. Ilhina esperou o seu sogro sair, para ressurgir das sombras, caminhou abrindo outra porta pegando uma fotografia. Nela ela sorria para a câmera, enquanto um rapaz moreno de costa a beijava no rosto. Ameaçou pegar a caixa branca, mas preferiu deixá-la ali. Tinha cumprido seu objetivo naquela noite, por tanto sabia o que tinha de fazer agora; destruir Alrimam e trazer sua vida de volta.