A Funesta Maldição

O calor em Hiroshima anunciava mais um daqueles dias ardentes do verão japonês, mesmo o relógio marcando apenas sete horas e alguns minutos da manhã. Eu era bem jovem, aguardava junto a uma dezena de pessoas um policial militar que iria nos escoltar até uma colina, éramos voluntários para construção de um abrigo antiaéreo.

Saímos na direção leste. Estávamos contentes por podermos ajudar em alguma coisa, apesar de ter uma sensação de alívio e susto de que Hiroshima havia sido misteriosamente evitada dos bombardeios americanos. Quase todas as grandes cidades tinham sido abaladas pelas bombas incendiárias. Nossa metrópole na Foz do Rio Ota estava isenta.

Após alguns minutos de caminhada, nos encontrávamos a alguns quilômetros de distância da cidade quando uma força colossal, silenciosa e invisível lançou-me a vários metros de distância. Tentei levantar-me e depois de muitas tentativas consegui, vi somente o militar e alguns dos colegas ainda com vida, os outros estavam mortos. O militar disse que podia ter sido a explosão do paiol. Entretanto, eu sentia ardor em minha nuca e não dei muita atenção ao que ele disse. Podia ser o primeiro bombardeio. Só pensei em meus familiares que estavam em Nagasaki.

Caminhamos em direção a colina para onde nos dirigimos antes da força incomum nos arremessar longe. Subitamente uma chuva negra começou a cair sobre nós. Ouvi o ruído dos motores dos aviões e pensei que queriam nos incendiar. Na colina encontramos muitos mortos, reduzidos à impotência pelas ondas de calor da explosão. A conflagração devorava Hiroshima. Uma imensa nuvem em forma de cogumelo podia ser avistada por todos os que não foram mortos ali. Resolvemos voltar, o militar queria ir até o quartel porque podia ter alguém precisando de ajuda. Então voltamos, havia muitos escombros e com muita dificuldade conseguimos chegar ao quartel que estava todo destruído, havia grande número de pessoas sem vida. Todos fugiam do centro, afastei-me do grupo que estava e fui na direção contrária da que as pessoas iam. Ainda pude ver a Ponte Aioi e vizinho a ela o veículo elétrico sendo devorado pelo fogo e os corpos totalmente carbonizados. Outros pulavam no Rio, crianças, haviam crianças mortas e semi mortas gemendo de dor, chamando pelas suas mães.

Um cenário macabro estava diante de meus olhos. Escapei da morte instantânea, entretanto a funesta maldição pegou-me no momento em que aquela força colossal lançou-me longe. Muito tempo depois, eles fizeram de nós cobaias. Éramos examinados, humilhados. Nunca nos diziam os resultados dos exames e feriram nosso brio. Restou, não só para mim, mas também para os outros sobreviventes, sequelas trazidas pela bestialidade do ser humano e pela radiação da bomba ceifadora de Hiroshima.

Aditamento: Este conto histórico nasceu após a leitura de outros contos históricos da autora Fefa Rodrigues. Não que ele seja impregnado das mesmas características; pois não é; e, sim, porque narra fatos históricos. Redigir um texto é para mim um trabalho que me distrai da pouca eternidade. Mas o conto que escrevi é interessante, tem odor de campa; apresenta o inferno vivido pelos personagens; guerra desnecessária, e, aliás comum para o homem-muar, porque o motivo da guerra existir é o interesse político. Fique por dentro: Foram os dias 6 e 9 de agosto de 1945, por ordem do presidente Truman, num ato covarde, que a bomba atômica foi inserida pela primeira vez em vidas humanas. O Japão estava praticamente vencido. Um dos aviões norte-americanos escapou dos radares japoneses e bombardeou primeiramente Hiroshima. O coronel Paul Tibbets, a bordo do B-29 Enola Gay, lançou "Little Boy" sobre Hiroshima. Ela tinha um apelido aprazível, porém carregava 60 kg de urânio 235, com o poder destrutivo de mil toneladas de dinamite. A bomba explodiu ainda durante a queda, ou seja, não atingiu o solo da metrópole japonesa, emitiu uma luz silenciosa que um crente protestante ao ver confundiria com uma possível luz divina, a temperatura chegou a mais de cinco milhões de graus centígrados, incinerando tudo o que se encontrava a 500 m do epicentro da bomba. Mais de 60 mil pessoas morreram em menos de uma hora após a explosão e outras posteriormente, por efeito da radiação. Nos anos seguintes morreram 140 mil pessoas, vítimas de câncer ou outras sequelas provocadas pela radiação.

Leandro Ferreira Braga
Enviado por Leandro Ferreira Braga em 10/03/2018
Reeditado em 30/08/2023
Código do texto: T6276066
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