O PARQUE DO TERROR - Macrofobia

Cynthia puxou a calça jeans de modo a alargar mais o espaço entre os glúteos. Sentia-se linda, olhando seu corpo no espelho. Tinha trinta e dois anos de idade, mas parecia 20. E por isso podia andar com seus amigos e amigas sem se sentir deslocada. Ah, como era boa essa sensação de liberdade que podia sentir, depois de dois anos após o fim de seu casamento com Fábio.

Aquela sandice de relacionamento, aquela prepotência, querendo manipular os sentimentos dela. Julgava entende-los só em um olhar. Nunca procurou gastar tempo com ela, entendendo-a verdadeiramente, ouvindo-a, deixando-a a desabafar, assim como faziam suas amigas de trabalho. Elas sim a escutavam, mas Fábio? Nunca pode aprender isso. Azar dele, enfim.

Então agora estava muito feliz. Livre de toda aquela loucura.

O celular tocou.

-Alô. Oi Cristiano – disse com a voz mais melada que pode.

-Oi, princesa! – a voz dele era grave como o trombone da orquestra da igreja. Cynthia sempre adorou trombones. Eram homens fortes que o tocavam, pois se exigia muita força no sopro. Era uma maravilha aquela voz de Cristiano, soando musical, ordenando seus sentimentos, falando pouco, submisso e ao mesmo tempo rude.

Ele disse que já estava lá fora, aguardando-a no carro e que ela não precisava ter pressa. Cynthia agradecia a Deus todos os dias por seu novo namorado ser um psicólogo renomado da soberba cidade de Santos. Ali em São Vicente, onde morava o máximo de tipo de homem que pôde se relacionar nos dois anos após o fim de seu casamento foram advogados e dentistas, os quais não podiam cuidar dela — Não, nunca poderiam! Como eu pude me enganar por tão longos meses?.

Então, estava mesmo muito feliz. Muito grata. Cristiano tinha diagnosticado o problema de Cynthia numa uma fila de uma balada num barzinho, quando ela saíra correndo feito uma doida, por ter esperado por apenas uns dez minutos, no caixa.

Uma vergonha, ela pensou, fechando os olhos. Como pude fazer aquilo? Totalmente descontrolada, refletia agora, enquanto calçava os saltos. Um tremendo absurdo! Uma jovem linda, mas sozinha e desamparada. Mas fora justamente quando se encaminhava ao banheiro para chorar e chorar, aparecera Cristiano pegando sua mão e olhando-a no fundo dos olhos, tendo os próprios olhos cintilantes como um Elfo daqueles do filme Senhor dos Anéis. Naquela noite, Cynthia pôde sentir-se viva, notada e amada, novamente. Nunca, nunca havia passado por aquela experiência. Era realmente uma voz na sua consciência que a despertava para emoções nunca vividas. Naquele momento ela teve certeza de tudo aquilo que se confirmaria logo após algumas conversas que se seguiram nos dois encontros que ela e Cristiano tiveram. Então, ele revelara a ela de um modo tão sutil, ela nos braços fortes dele, parecendo de um urso carinhoso, sussurrando que tudo iria bem, mas ela tinha que saber o que fazer. Tinha que reconhecer primeiro sua doença. Sim. Não era nada demais, ele dissera. Nada de preocupante. Ela teria que tão-somente saber como lidar com aquela doença. E ele a ajudaria. Ele a colocaria nos braços rígidos e a protegeria, conduzindo-a num êxtase de sonho e realidade misturados.

Sentindo-se leve, como um pássaro voando sobre um lago, ela abriu os olhos e foi até à janela para olhar Cristiano.

Ele estava com a Marcela e o Glauco. Os dois namorados pareciam nem se preocupar com a demora de Cynthia. Os jovens de vinte e cinco anos beijavam-se e se abraçavam no banco de trás do Mercedez branco, conversível. Aquilo era mesmo um sonho. E Cynthia o vivia, deixando fluir, não querendo mesmo acordar.

Ah, Cristiano, enfim, vamos nos divertir.

Pensava no parque de diversões que visitariam. Era sim um parque desativado há anos, diante de vários problemas e, pelo que diziam várias mortes com as quedas de brinquedos enferrujados e outras histórias meio macabras que Cristiano tinha dito que Glauco conhecia. Cynthia anda não tivera a oportunidade de ouvir Glauco contar suas histórias de terror e suspense e, segundo Cristiano, até algumas piadas no meio delas, o que fazia com que Cynthia se sentisse animada a ouvi-lo.

Então seria um lindo luau, de histórias loucas, mas quem sabe verdadeiras. E Cynthia sempre quis mesmo saber da verdade sobre os fatos que ocorreram naquele parque desativado. O “Souls Park”, inativo há mais de trinta anos não teria ninguém. Só eles, enfim, estariam lá, à lua cheia, ao vento frio do mês de julho. E Cynthia deitaria a cabeça nos braços de Cristiano e letárgica, ouviria as histórias de Glauco, como se fosse um filme de terror comum. E seria uma noite inesquecível na qual Cristiano a conduziria como bem entendesse.

Ela passou na cozinha pegou a caixa de fósforos bem como dois pedaços da pizza portuguesa que sua mãe comia à mesa.

-Cuidado, querida.

-Pode deixar, mãe. Sei me cuidar. É só um cineminha.

Alexandre Scarpa
Enviado por Alexandre Scarpa em 30/11/2018
Reeditado em 10/04/2024
Código do texto: T6515705
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