Baía das Tartarugas

Ainda funcionava o antigo porto da cidade, quando a rádio foi desativada. Construída para auxiliar as embarcações que chegavam na região, a Rádio Tortuga Bay não existe mais. Os operadores da rádio eram recebidos pelas brisas marítimas e as gaivotas que rondavam as janelas antes de pousarem envolta do velho farol. Elisiário, responsável por administrar a rádio durante a noite, chegara para mais um dia de trabalho, o que era motivo de muito orgulho para ele auxiliar os marujos que se perdiam, transmitir informações sobre a previsão do tempo e embalar as noites dos moradores da região com ótimas canções escolhidas a dedo. Ao se sentar para descansar depois de organizar as coisas pela rádio, os equipamentos começaram a captar um sinal vindo do alto mar. E como sempre, ele enviou uma mensagem garantindo segurança e informando as coordenadas do porto. Pela janela, ele olhava calmamente o horizonte. Até que, alguns minutos depois, surge a sombra de um imenso navio mar a dentro. Elisiário tentou fazer contato com a tripulação várias vezes, mas tinha como resposta apenas os chiados de estática e alguns ruídos impronunciáveis. O navio então chegou no porto, com isso ele pôde enxergar melhor e em seu casco um letreiro corroído pela maresia dizia "TORTUGA BAY". Silencioso, pesado, escuro, sombrio e cinzento, sem sinal de vida, ouvia-se apenas o rangido das ferragens provocado pelo movimento das águas. Enquanto Elisiário analisava e alimentava sua imaginação, um clarão amarelo-alaranjado atingiu as janelas da rádio, olhando envolta ele percebeu que vinha de uma estrada que dava para lugares remotos onde se praticavam rituais e serviam como pontos de encontro para amores paralelos. Ouviu-se, então, o estrondo de uma explosão. O que poderia ter sido isso?... Pensou ele... Voltando sua atenção para o misterioso navio, largou tudo na rádio e foi olhar a embarcação de perto. Mas ele já não era mais o mesmo, algo havia alterado a sua essência, como se estivesse em transe seus olhos brilhavam presos ao fitar. Decidido ele foi, mas depois de subir no navio, um enorme nevoeiro surgiu com nuvens carregadas e iluminadas por descargas elétricas que brilhavam em vacilos de segundos, envolvendo o navio até se dissipar completamente, sem deixar rastros do nosso amigo. Lentamente o navio começou a fazer manobras para sair do porto da mesma forma que chegou, calmo e silencioso. Mar a dentro, um clarão esverdeado iluminou o céu estrelado e a embarcação desapareceu levando para longe tudo o que foi de bom... Devido ao seu desaparecimento, mudaram o nome da rádio em sua homenagem. Porém, depois do ocorrido, os equipamentos começaram a apresentar defeitos, alguns comuns, outros inexplicáveis. Hoje há apenas ruínas do que foi a sede da rádio. Contudo, capitães e marujos que navegam pela região afirmam receberem mensagens por transmissões de rádio com a voz de Elisiário. Entretanto, as mensagens sempre são recebidas pela metade, cortadas por ruídos ou barulhos estranhos. Talvez a embarcação ainda esteja vagando por aí, em lugares incertos, quem sabe um bom lugar para descansar ou um sinal de mau presságio que passa por aqui. Em linhas tortas, foi como se o navio o tivesse engolido e agora ele fizesse parte da natureza sombria daquela coisa.