Fúnebre

Arthur chegou à polícia às 23 horas, após seu colega Jonas deixar o local mais cedo no turno da noite. Apesar de muito dedicado ao trabalho, ele se sentia irritado por não poder dormir cedo no conforto de seu lar. Entendia que havia sido uma trapaça de seu desafeto que inventara um falso compromisso para fazê-lo trabalhar fora de seu turno. Arthur recolheu as anotações na mesa de madeira de Jonas e foi até sua sala.

Naquela noite fazia frio e ele acendeu a lareira e um cachimbo enquanto lia os papéis.

Segundo o relatório a respeito do cadáver, tratava-se de uma menina de, aparentes 10 anos de idade, um metro e cinqüenta, branca, de cabelos negros, olhos azuis, mas com um removido da cavidade ocular, assim como os dentes de trás, tanto da mandíbula superior, como da inferior.

Suas mãos encontravam-se vermelhas, como se tivessem sido apertadas com muita força e o dedo indicador direito estava quebrado. No corpo todo haviam marcas roxas de agressão, além de mordidas nas pernas, nádegas, mamas e no pescoço. A área vaginal encontrava-se ensanguentada, devido a uma fenda que se formara entre a vagina e o ânus, como se ambos fossem um só.

Dentro, haviam vestígios de sêmen humano. Em sua barriga, foi vista saliva e na parte de trás da cabeça, um afundamento no crânio devido a uma pancada.

O segundo relatório dizia que o corpo fora achado no município de Mossoró, no Rio Grande do Norte, mas após a primeira noite na delegacia da cidade, o corpo havia sido roubado e foi encontrado em uma cova rasa as cinco da manhã em São Gonçalo do Amarante. O legista que tratara do corpo fora encontrado morto na praça da cidade, às quatro da tarde com o pescoço quebrado e o primeiro relatório na mala. Porém o delegado local o enviou para Natal, a capital do estado, devido a um incidente ocorrido na delegacia, onde o agente funerário contratado para analisar o corpo de forma confidencial ser encontrado, na sala de autópsia, enforcado com uma carta de suicídio na mão. Em Natal, os documentos foram perdidos devido a um incêndio criminoso na delegacia, mas o corpo havia desaparecido novamente. Suspeitas foram levantadas sobre os malfeitores responsáveis pelo estupro e assassinato da menina estariam por trás desses crimes, para atrapalharem as investigações. O legista escapara do incêndio mas está desaparecido. No dia seguinte, o cadáver fora achado embrulhado num lençol por moradores de uma cidade na fronteira entre o Rio Grande do Norte e o estado do Ceará. Em seguida, enviado para Fortaleza.

Após concluir a leitura dos relatórios, Arthur joga as cinzas de seu cachimbo na lixeira, o deixa apoiado ao seu estojo de lápis e canetas e levanta-se para fechar as janelas pois uma ventania fria adentrava o lugar e balançava as cortinas. Ele decidiu então dar uma olhada no corpo. O local estava escuro, pois as lamparinas não funcionavam direito. Ele passava pelo corredor e sentia medo, mas não sabia de que e nem porquê.

Ao entrar na sala de análise dos cadáveres, acendeu seu isqueiro cujas chamas produziam uma luz, mas eram constantemente apagadas pelo vento que passava pela porta. Ele procurava o corpo pela etiqueta dos pés que continha o nome correspondente no relatório, no caso a "desconhecida n° 09". E foi abrindo gaveta atrás de gaveta, deparando-se com corpos e mais corpos, todos pálidos, com lábios ressecados e olhos sem vida. Mas após a "desconhecida n°08", não havia corpo, só um leito vazio. "O corpo foi levado de novo" – concluiu ele. Ao voltar para sua sala, ele se senta cansado em sua cadeira, com o coração acelerado. Em seguida, fecha os olhos. Nesse momento, sente pequenas mãos passando pela sua testa e seu queixo. Ao olhar pelo vidro da janela, ver uma imagem pouco nítida, mas de um rosto machucado, com um olho bem azul e uma cavidade ocular vazia. Depois, uma dor lancinante em seu pescoço.

Fim.
Gabriel Craveiro
Enviado por Gabriel Craveiro em 23/06/2019
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