Quarto 17

     A noite estava muito quente para aquela época do ano. E o quartinho de hotel barato, onde eu me encontrava, tornava o calor ainda mais sufocante. Não era lá grande coisa: duas cadeiras, uma mesa, a cama, uma cômoda, e a mesinha de cabeceira. Eu estava de passagem por ali e aquele hotel era a minha única opção, já que a melhor pousada da cidade estava lotada.
     Sentado numa cadeira eu lia um livro, entretido. Foi quando, inesperadamente, a luz caiu. No breu absoluto, me levantei da cadeira e fui tateando com as mãos as paredes e os móveis, até encontrar meu celular em cima da cama e ligar a lanterna. Mas vi que a bateria estava nas últimas e não duraria mais que 5 minutos. “Só faltava essa agora!” — exclamei com raiva. Por sorte, dentro de uma gaveta, encontrei algumas velas. Acendi uma e a deixei ali em cima, perto da mesinha de cabeceira. O quarto saiu da escuridão total para uma leve penumbra. Então, como o jeito era esperar a luz voltar, continuei a ler o livro, agora à luz de vela. Até que, vencido pelo cansaço, acabei caindo no sono.
        Algum tempo depois, acordei e percebi que a luz ainda não havia voltado. A vela agora já queimava pela metade, e a penumbra do ambiente agora parecia um pouco mais nítida. Mas não foi apenas isso: comecei a sentir uma sensação muito desconfortável, como se não estivesse mais sozinho; como se, em algum lugar do quarto, olhos invisíveis me observassem. Olhando em outra direção, avistei a cômoda onde a vela estava e, ao olhar para a minha cama, tive uma inesperada surpresa: lá estava uma mulher deitada! Levei um susto e me perguntei se não estaria sonhando ou imaginando coisas. Mas não: havia realmente outra pessoa ali comigo.         
       Não sei quanto tempo permaneci ali parado mas, apesar do medo, tomei coragem e lentamente fui-me aproximando daquela estranha. Mesmo com a pouca luminosidade, deu para ver que ela vestia um vestido de cor verde escuro, e jazia deitada de bruços, com os braços abertos, parecendo estar dormindo profundamente.
      Ao chegar mais perto, de repente, aquela mulher acordou e sentou-se na cama. Tive um sobressalto dos diabos! Mas foi logo depois que o estranho deu lugar ao bizarro, pois ela começou a vir em minha direção e sem mais nem menos, quando estava a meio metro de mim, evaporou-se em pleno ar! Percebi então que me encontrava sozinho no quarto novamente e que a luz da vela se apagara por completo.
          Lembro-me apenas de sair correndo do quarto, esbarrando em tudo pela frente no escuro. Desci as escadas a torto e a direito até chegar à recepção onde o porteiro — um senhor baixinho e franzino munido de sua lanterna — veio correndo apressado ao meu encontro, perguntando o que tinha acontecido. Mas relutei em lhe dizer o que eu achava ter visto, pensando que ele me julgaria louco ou algo assim. E tentei improvisar alguma história sem pé nem cabeça, quando ele me interrompeu:
          — O senhor ficou com o quarto 17 não foi? Eu não quis lhe falar na hora que o senhor chegou aqui, mas aquele quarto tem um segredo que somos proibidos de contar aos nossos hóspedes pela diretoria do hotel. Sabe o que é? Há alguns anos, uma mulher morreu ali. Coitadinha, ela se matou tomando vários comprimidos de uma vez só. Só encontramos o corpo no outro dia, deitada na cama de bruços com os braços abertos assim...Foi um alvoroço aqui viu? Mas o tempo foi passando, e o pessoal foi se esquecendo do caso. Alguns dizem que já viram ela andando pelos corredores de madrugada, sempre saindo do quarto 17; outros acham que é invenção. Mas eu acredito nessas coisas sabe?
       Depois da revelação do porteiro, senti-me estranhamente culpado e não tive a mínima coragem de voltar para o quarto: passei uma noite mal dormida num sofá velho que havia na entrada da recepção, mesmo com os funcionários sugerindo me colocar em outro quarto que estava vago. Não queria mais saber de nenhum quarto daquele hotel, seja o 17, o 18 ou outro número qualquer.
      Na primeira luz da manhã, com muita cautela, voltei ao quarto 17, arrumei minhas coisas e saí de lá o mais rápido que pude, para nunca mais voltar, deixando-o para sua finada hóspede descansar em paz. Pelo menos até que algum outro viajante chegue e se resolva passar uma noite naquela cama: quem sabe ele não se importe de ter uma companheira de quarto...

 
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José Lucas Brito Souza
Enviado por José Lucas Brito Souza em 11/05/2020
Reeditado em 13/05/2020
Código do texto: T6944343
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