Convite misterioso

Convite misterioso (José Carlos de Bom Sucesso – Academia Lavrense de Letras)

Leonardo estava meio receoso. Por volta das dezesseis horas, o celular toca. Ele atende e do outro lado a voz assim fala:

- Compadre Leonardo. Aqui é seu compadre Afonso. Preciso de uma ajuda sua...

Meio desconfiado e pensando ser uma nova brincadeira do compadre, Leonardo, meio indeciso, assim diz:

- Boa tarde, compadre. O que o senhor está precisando, pois acho que é mais uma de suas brincadeiras, aquelas sem graça.

- Não, compadre. Não é brincadeira não!

- Recebi, agora, a notícia de que meu cunhado Mário, marido de minha irmã Joana, faleceu na cidade de Campo Belo. Terei que ir lá, pois o sepultamento será rápido e eu gostava muito dele. Ele era, para mim, um verdadeiro irmão. Bom conselheiro, bom camarada, emprestava dinheiro para mim e eu o pagava corretamente.

- O sítio não pode ficar sozinho, pois tem café guardado lá e está acontecendo furtos na região. Preciso que você vá dormir lá. Terá que ir sozinho, pois a sua esposa, a Maria, vai com a gente.

Meio desconfiado e mordendo de raiva por dentro, Leonardo aceita a proposta, mas prossegue:

- Compadre. Cuide bem da Maria. Ela me falou agora que irá e levará o Juninho...

- Está certo, compadre. Já arrumamos a van do Edinho e daqui uma hora vamos sair. Deveremos voltar no outro dia, após o almoço.

- Boa viagem, compadre. Já estou indo para o sítio. Ainda bem que tenho uma cópia da chave.

- Compadre Leonardo, só queria dizer uma coisa:

- Se você escutar alguns gemidos, próximos à moita de bambu, perto do ribeirão, não se assuste. Estes gemidos estão acontecendo há algum tempo. Deve ser assombração, mas eu nunca fui ver o que era, ouviu?

O telefone se desliga. A esposa de Leonardo vem e diz:

- Querido, já estamos indo eu e o Juninho. Deixei seu jantar na marmita, a garrafa de café, os pães com manteiga e seu doce de leite. Chegaremos amanhã, depois do almoço. Divirta-se. Cuidado com a assombração...

Leonardo, meio nervoso, pegou os apetrechos, despediu da esposa e do filho, saindo de mansinho. Logo ouviu-se o ronco do motor da camionete dobrando à esquina, lá se indo em direção ao sítio.

O sol se punha no horizonte. Um vento frio soprava no corpo de Leonardo. O sítio estava todo limpinho, pois Afonso é um cidadão muito caprichoso com os pertences. A cama estava arrumada. O fogo, no fogão à lenha, ainda estava aceso e alguma fumaça saia pela chaminé. Leonardo colocou mais lenha no fogão. Da janela, contemplava o lindo por do sol. Pegou a máquina fotográfica e tirou algumas fotografias do sol se esquivando atrás da montanha. A noite chegou. Estrelas deslumbravam no céu e faziam grandes amontoados que se podiam traçar lindas e diversas formas geométricas.

Rapidamente e aproveitando o fogo no fogão, Leonardo tomou banho. A água estava bem quente. Agasalhou, esquentou o jantar, comeu o doce e ainda foi à despensa e partiu um lindo queijo. Escovou os dentes, pegou uma cadeira e foi à varanda para contemplar o céu noturno. Via várias estrelas, via o trefego de aviões cruzando para diversas regiões. Ouvia o cântico de alguns pássaros noturnos, tais como “João Corta Pau”, “Amanhã Eu Vou” e se estremeceu com o cântico de um casal de corujas que estava pousado nos galhos de uma árvore de ipê.

Por um bom tempo, Leonardo ficou ali admirando e pensando como é linda a natureza, pois recordava do tempo em que era agrônomo da Emater. Visitava muitas fazendas, muitos sítios, mas aquele sítio do compadre não se comparava com outras propriedades. Tinha de tudo um pouco. O pomar de frutas era muito bem tratado. Não produzia leite, mas tinha uma vaca que dava o leite para eles. Criava muito gado solteiro. Tinha porco no chiqueiro, galinhas, patos e a lavoura de café, com muitos pés plantados. Era a sua principal atividade econômica.

Já cansado, resolveu ir para dentro da casa. Achou um livro na estante. Sentando no sofá, leu diversas páginas até que o sono lhe furtasse. Com os olhos pesados, nem mesmo tirou as roupas e logo deitou na cama. Cobriu com alguns cobertores, apagou a luz vindo repentinamente dormir.

Passavam-se das duas horas da madrugada, quando despertou. Meio zonzo e ainda sem certa consciência, acordou com um som meio estranho. O som vinha da parte de baixo da janela do quarto em que dormia.

- “Hum, hum, hum, hum...”

Apavorado e lembrando do que o compadre lhe disse, Leonardo se pôs em pé. Arrumou os agasalhos, pegou a lanterna, acendeu as luzes, abriu a janela e ouviu e sentiu que os sons vinham lá do fundo, perto da moita de bambu. E sempre diziam assim:

- “Hum, hum, hum...”

Com os cabelos arrepiados, um frio na barriga, ele imediatamente fechou a janela e sentou-se na cama. Não conseguia fazer nada, pois o som continuava e sempre aumentando de volume.

Por um certo tempo, Leonardo ficou zangado com o compadre. O compadre e os familiares estavam viajando, estavam no velório. Péssima ideia, dava medo de ver velório e defunto no caixão. O som vindo da moita de bambu dava mais medo a Leonardo do que se estivesse no velório.

- “Maldito compadre ter chamado para vir aqui”, dizia em voz alta por um bom momento.

Não se sabe como, Leonardo criou coragem. Saindo do quarto, com a lanterna em mãos, um cabo de enxada que encontrou perto da sala, ele adentrou pelo quintal.

Com muito cuidado, com os cabelos arrepiados, ele ouvia o som vindo cada vez mais forte. Foi até o galinheiro e não viu nada. As galinhas estavam dormindo e somente assustou quando o galo bateu as asas e cantou. Deu um pulo para trás e xingou mais o compadre.

Seguindo para a casa onde o café estava armazenado, não viu nada. Passou mais um susto, porque o cachorro foi correndo a seu encontro, logo o reconhecendo.

Fez o mesmo trajeto até ao paiol, no pequeno curral, na parte do pomar e levou mais um susto no chiqueiro onde estavam os porcos. Um dos porcos correu, fazendo muito barulho que mais uma vez o assustou.

Não tendo mais nada a olhar e tudo estava direito, ele resolveu ir até a moita de bambu. O som aumentava mais e percebia-se que o vento soprava mais forte. Assustou, quando passava perto de uma árvore, com o cântico de uma coruja. Deu um pulo para trás e logo percebeu o pássaro. O som ia aproximando dos ouvidos. Era apavorante, mas ele precisava fazer isso. Pensou em sair correndo, pegar o veículo e ir embora, mas não poderia fazer isto porque tinha dado sua palavra ao compadre. Seria para os dois, um ato de covardia.

Aproximando-se da moita de bambu e com muito cuidado, olhando bem e iluminando com a lanterna, viu que um touro, de propriedade do compadre, chifrava o barranco, jogava terra para trás, mugia e o som era o mesmo que era ouvido:

- “Hum, hum, hum, hum...”

Feliz por ter descoberto o fantasma, dali mesmo, ligou para o compadre, que estava no velório, e contou a façanha.

JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO
Enviado por JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO em 14/02/2021
Código do texto: T7184307
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