Quem foi embora?( Quem boboia)

VOCÊ SÓ IRÁ LER SE VOCÊ SE IMPORTA E NÃO QUER IR BOBOIA (IR EMBORA) DA VIDA DE UM AUTISTA

Silvânia Mendonça Almeida Margarida

Tempos, há bem tempos, André Luís, autista, costuma perguntar lá em casa quando uma pessoa vai embora. Pode ser a Aparecida, a outra Aparecida, o V. , os tios, os primos e todos que um dia apareceram por lá. Na sua simplicidade, André, como um bebê, pois só tem tamanho, pergunta, assim que a pessoa saiu: Quem boboia? Traduzindo: quem foi embora? E temos sempre que repetir: Foi a Aparecida, mas ela voltará meu bem... E assim, foi a cada dia de todos estes anos. Uma frase que o André nunca esqueceu.

Que sentido terá para ele sempre a mesma frase? É como se estivesse a dizer mil interpretações no seu mundo que somente ele conhece. Nota-se que o seu sentimento puro, imaculado, não transgride ninguém. A pessoa vai embora e fica como uma lembrança da visita, uma lembrança dos momentos tenazes, por assim dizer.

Não é atoa que a cada pessoa que vai embora, de uma maneira ou de outra, André sente-se lesado. É porque ele não é tão autista assim. É porque tem um coração que pulsa e que bate, vermelho como a sofreguidão de ver alguém partir. E por que as pessoas partem? Não é por mero acaso que as pessoas não notam, não lembram, não perguntam. O autismo é uma doença silenciosa, que essas mesmas pessoas ficam imaginando que corações não batem no peito infanto-juvenil do autista. Ledo engano. São pessoas sensíveis e amáveis. São pessoas carinhosas e de uma ternura só. São pessoas grandes porque não precisam falar muito!!! Dizem com o olhar e com a meiguice. Autista não é convocado para nada. Cingi-lo de mimos, somente pais que muito amam. Somente irmãs e irmãos que muito o idolatram. Pois, sabem do seu coração vermelho e da sua carência também vermelha. Autistas são estorvos, os corvos, para aqueles que não têm nenhuma sensibilidade. Não sabem que o Pai Celestial deixou grande encargo para aqueles que rodeiam os anjos azuis como são chamados. E preferem ir embora, deixando para trás a saudade, o comprometimento de não voltar, nunca ligam, nunca falam e só o interesse é o principal paladar.

E André continua a perguntar: Quem boboia? Como a indagar: um dia irá voltar? Não precisa me convidar para reuniões e toda a realeza social da vida de cada um. Apenas volte. Olhe-me!! Quanto tempo terá para mim antes de ir boboia?

O autista não pede muito. Ele apenas pede um pouco da atenção que cada um tem a oferecer!! Ele apenas pede para ser compreendido!! Ele apenas quer participar. Ele é sentido e a vivência de cada um que quer ser melhor! Que quer olhar a sua volta! Quantas oportunidades perdemos na vida, por olharmos somente para os nossos interesses, as nossas vãs paixões, os nossos acasos mal compreendidos. Como é bom ter a alegria de saber da consciência do dever cumprido, de que alguém notou.

Nossa, muito teria a escrever sobre todas as pessoas que foram embora da vida do André e nem rastros deixaram. Nem lembranças!! Mercadorias, seriam? E quantos autistas já perderam!! Impossível contabilizar! Impossível continuar a escrever sobre este assunto.

Esse prelúdio é realmente quando alguém entende!!!! Filosofia do mais ou menos de lado, não há muito o que escrever, pois se transformariam em mágoas. E mágoas não têm espaços nas nossas vidas. Sentimentos bons sim...

O que sei é que deixo aqui uma mensagem: para todos aqueles que foram embora da vida do André, pelo menos uma vez adentrou-se ao meu lar, obrigada de coração. Vocês o fizeram mais maduro e contribuíram para ele aprender a perguntar: quem boboia?