Monólogo de um doido varrido

Debilitou-me uma doença psicológica bacteriana de origem vegetal pelos psicólogos denominada patologia, isto é – traduzindo para a linguagem de gente que pensa com o próprio cérebro, manuseia os objetos com as mãos, corre com os pés, olha com os olhos, ou com um olho só, caso se trate de um ciclope, e ao se ajoelhar dobra os joelhos -, patologia, dizia eu, doença da qual estou acometido, é a doença das pessoas obcecadas em estudar patos e congêneres. Congêneres, explico, para as pessoas que não sabem o que tal palavra significa, e também para as pessoas que desconhecem dela o significado, é o plural de congênere. Dadas estas explicações, esclarecedoras, que eliminam toda e qualquer dúvida quanto à acepção da palavra da qual estou a tratar, e, ao tratar dela, trato dela, não com a negligência que muitas pessoas das palavras tratam, seja a da qual tratei, seja de qualquer outra palavra, mas com a seriedade que compete aos gênios nos quais a vida infligiu dores provenientes da patologia, em decorrência da ingestão de penas, bicos, cascas de ovos, pés de patos, e, também, de marrecos, gansos, paturis, donaldes, patinhas e gastões, espécies, estas, de bípedes dotados de indumentária que, embora apropriada, é inapropriada para os indivíduos de sua espécie, mesmo que pertençam à espécie alheia, prossigo: A patologia, dizia eu, doença psicológica bacteriana de origem vegetal, derivada das poções mágicas da Maga Patológica, que, com o auxílio da Madame Mim, concebeu receitas compostas dos mais inusitados ingredientes, pertence à família das doenças da classe das categorias aparentadas com a síndrome de Estocolmo – detectada, pela primeira vez, em Helsinque, num laboratório situado em Berlim e localizado em Tóquio – e com os processos jurídicos do corredor polonês. E quem é o corredor polonês? Desconheço-lhe o nome. Sei, no entanto, e todavia, que é ele natural da Polônia, embora tenha nascido na Hungria, numa noite de lua cheia no Japão; e assistiu ao seu nascimento um homem, o parteiro, grego da ilha de Creta, que lutou, na companhia de Aquiles e Odisseu, na guerra de Tróia, e foi um dos construtores do cavalo de madeira, o famosíssimo Cavalo de Tróia, que era, na verdade, um burro de eucalipto sintético; além disso, ele concebeu um sistema filosófico racionalista, teleológico, mecanicista, heliocêntrico, holístico, que seu aprendiz, o Eleutério, que não é um elemento da tabela periódica, disseminou em todo o mundo, reservando-o para si, sem que o tenha transmitido para outra pessoa qualquer. Mas a sua filosofia, é certo, e quanto a isso não restam dúvidas, foi disseminada em todo o mundo, pois, afinal, ele, isto é, o Eleutério, a aventou aos furacões, ciclones, tufões, que de tempos em tempos varrem a costa leste do litoral e o litoral da costa leste do continente americano banhado pelo Oceano Atlântico, cujas águas são salgadas, e nelas vivem baleias; e Eleutério não se limitou a apenas, e tampouco unicamente, aventá-la aos furacões, tufões, ciclones; ele também a externou para as águas dos oceanos, que a espalharam por todo o planeta. E quem é o Eleutério? Não sei. Eu nunca o vi mais gordo, e nem mais magro, e nem mais alto, e nem mais baixo. E eu nunca ouvi falar dele, e acerca dele nenhuma palavra eu li. Mas o Eleutério não é importante; importante é a distância entre a Terra e a Lua. A Lua, explico, para eu mesmo, para que eu possa entender a minha idéia que me apresento, quando se aproxima da Terra dela fica mais próxima, e quando dela distancia-se dela fica mais distante, e a Terra, ao distanciar-se da Lua quando a Lua dela distancia-se, dela afasta-se, e quando dela aproxima-se ao mesmo tempo em que ela de si aproxima-se encurta-se a distância que há entre elas. Tal fenômeno ainda não foi inteiramente, e tampouco parcialmente, compreendido pelos seres humanos que o estudaram, e muito menos pelos seres desumanos que nunca se dedicaram ao seu estudo. É inexplicável, e inexplicável será até o dia em que alguém o compreenda, e, compreendendo-o, o entenda, e, entendendo-o, formule as explicações que o explique, e explique, também, a relação de causa e efeito entre a extinção dos tiranossauros rex e o milésimo gol do Pelé. Por que o seu milésimo gol Pelé o marcou numa cobrança de pênalti, e não numa cobrança de escanteio? Há uma relação de causa e efeito, e de princípio, meio e fim, entre os dois eventos, afinal, pois, os tiranossauros rex tinham dentes, e o Pelé tem dentes também; e a existência de dentes na boca do Pelé e nas bocas dos tiranossauros rex indica similaridades fenomenológicas existencialistas entre o ludopédio, isto é, o futebol, ou soccer, como dizem os norte-americanos, e os filmes de Steven Spielberg. Além disso, um tiranossauro rex, dias atrás, invadiu-me a televisão, e surrupiou-me das mãos o controle remoto, e, antecipando-se a mim, premiu do controle remoto um botão, e teletransportou-se para outra galáxia, onde encontrou, num planeta piramidal, no sopé de uma montanha, um ovo cósmico, que explodiu no mesmo instante em que Moisés rachou-o com um machado, matando o tiranossauro rex, mas não se matando no processo, pois, afinal, ele, o Moisés, em decorrência do deslocamento de ar da explosão explosiva, foi arremessado à Terra, e caiu, no topo do cume da ponta do Everest onde encontrou o Homem das Neves Abomináveis e o Abominável Homem das Neves a confabularem acerca da relatividade do tempo absoluto, a tempo de ouvir o Homem das Neves Abomináveis comentar, dando por encerrada a sua entrevista com o Abominável Homem das Neves: “O tempo, sendo relativo, não pode ser compreendido como tempo relativo, afinal, pois, sendo relativo, o tempo é, portanto, absoluto, pois, afinal, a sua condição temporal não é atemporal, afinal, pois, ele existe como fenômeno cósmico, portanto, real, dotado de propriedades absolutas, conquanto elas não eliminem as suas propriedades relativas, afinal, pois, a relatividade do tempo, ao mesmo tempo que define o tempo da relatividade, perpetua a noção absoluta do tempo relativo conjugada à noção relativa do tempo absoluto conquanto a sincronia dos eventos simultâneos coordenados pelas cordas que compõem a infinitude do tecido cósmico do universo observado de dentro de um prisma desmaterialize as partículas de nêutrons, que estão a singrar o oceano sideral há bilhões de anos e cujo destino é desconhecido de todos. Sabe-se, apenas, até o presente momento, que, em decorrência da eclosão do Big Bang, os italianos inventaram o spaghetti, os franceses a guilhotina, os alemães o salsichão, os gaúchos o churrasco, e o Bethoveen a surdez”. E aqui, uma avalanche arrastou Moisés até uma aldeia ameríndia txucarramãe onde um índio tupinambá indagou-lhe: “A Capitu capitulou?”, e de Moisés não obtendo resposta, o índio tupinambá entregou-lhe duas placas rochosas com inscrições que Moisés não soube decifrar, e cujo significado o silvícola desconhecia, e o silvícola exortou Moisés a ir até o Egito procurar por Champollion, que poderia lhe prestar consultoria, e ajudá-lo a traduzir as inscrições. Moisés entendeu que o destino o chamava a empreender uma tarefa que ele, e apenas ele, e ninguém mais, poderia empreender, e principiou a jornada; no entanto, todavia, porém, devido a sérios problemas no intestino, teve ele de adiá-la. Não sei se ele foi, ou não, bem sucedido em sua empreitada; só sei que eu, exausto de tanto pensar, tenho, e já, de encerrar as minhas reflexões para eu não vir a enlouquecer, pois, afinal, eu enlouquecerei caso eu não cesse, e já, de pensar, para não vir a carecer de forças que conservem a minha sanidade mental. E agora vou dormir, para poder acordar amanhã cedo, preservadas todas as minhas faculdades mentais, e dar seqüência aos meus pensamentos. Desejo-me bons sonhos. E boa noite.

Ilustre Desconhecido
Enviado por Ilustre Desconhecido em 01/11/2019
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