O Cisco no Olho de Deus

A noite de sexta-feira já havia caído quando Sarah interrompeu Ryan, que estava às voltas com um trabalho de programação, laptop no colo.

- Precisamos ir à cidade. A despensa está quase vazia.

- Está bem - disse ele. - Vou pôr o programa para compilar enquanto você pega suas coisas.

Sarah voltou pouco depois com uma bolsa e casaco, e Ryan já havia fechado o laptop. O casal saiu da casa e Ryan abriu o carro, ao mesmo tempo em que Sarah trancava a porta da frente. Finalmente, sentou-se ao lado do marido, que olhava embatucado para o painel do carro.

- O que houve? - Indagou ela.

- Não sei. Girei a chave na ignição, e nada do motor pegar.

- Talvez seja um problema elétrico - sugeriu Sarah.

- Bom, não vamos perder tempo com isso agora. Vou chamar um Uber - decidiu-se ele.

A espera foi curta. Cinco minutos depois de acionado o aplicativo, um carro preto parou à frente da casa.

- É o nosso motorista - disse Ryan olhando para a tela do celular. - Mot... nome estranho.

Ryan e Sarah embarcaram no banco de trás e o motorista tomou o rumo da cidade. Ou assim pareceu, a princípio.

- Por que pegou esse caminho? - Questionou Ryan, ao perceber que haviam entrado numa estrada vicinal.

- É um atalho - justificou-se Mot.

- Vamos passar por Dead's End - percebeu Sarah.

- Era onde estava o circo - lembrou Ryan.

- O circo ainda está lá - replicou Mot. - Não gostariam de dar uma olhada? Eu espero...

Marido e mulher entreolharam-se.

- Não, obrigado - redarguiu Ryan com firmeza. - Nos leve direto para a cidade, estamos com pressa.

- Está bem - assentiu Mot, parecendo um tanto decepcionado. - Mas vamos passar em frente ao circo assim mesmo.

E de fato, foi o que ocorreu. A grande lona cercada de trailers e barracas menores, ainda estava armada em Dead's End. Havia algumas luzes acesas, aqui e ali, mas fora isso, o lugar parecia morto. Não se via vivalma.

- Por que ainda não foram embora? - Sussurrou Sarah.

Olhando pelo retrovisor, Mot respondeu à pergunta retórica.

- Talvez ainda estejam esperando visitantes.

- Não seremos nós - retrucou Ryan cerrando os punhos.

- Não mesmo - aduziu Sarah.

Sob a luz da lua, o carro preto afastou-se do circo deserto. Quando desapareceram de vista numa curva da estrada, todas as luzes se apagaram, como se já não tivessem qualquer serventia para quem estava lá dentro.

- [16-10-2021]