O RAPAZ DA ILHA

O rapaz fez um movimento com a cabeça quando a quentura dos raios do sol penetrou por entre os galhos das árvores e tocou-lhe o rosto. Ele ergueu o braço para fazer sombra nos olhos e percebeu o sangue seco na palma de sua mão. Num movimento brusco sentou-se olhando a sua volta. Estava no chão. O corpo fraco despencou novamente no tapete de folhas secas. A cabeça doía, a respiração era difícil, o suor escorria, a mente estava vazia, nenhuma lembrança, nenhum movimento, apenas o silêncio sendo varrido pela corrente de ar e novamente ele desfaleceu.

Quando recobrou a consciência outra vez, seus olhos encontraram o escuro da noite. Desta vez sentiu um oco no estômago, e a boca ressequida pedia por água.

Ergueu-se devagar e com dificuldade andou sem destino apoiando-se numa árvore e noutra ao som de uma majestosa sinfonia de insetos. Suas vestes, ondulavam às rajadas de ventos fortes na promessa de chuva iminente. Ouviu o estrondo de um trovão, seguido da claridade, bem próxima, de um relâmpago o qual lhe permitiu ver melhor onde pisava. Estava a poucos metros do que lhe pareceu ser areia.

Parou por um momento. Mais um trovão soou ao longe, outra claridade próxima e a chuva começou a cair forte, pesada, sonora. Seus passos, também pesados, o conduziram para a areia. E mais uma vez ele foi vencido pela fraqueza.

Seu corpo debilitado repousou na areia branca daquela ilha deserta por longas horas enquanto fragmentos de imagens desbotadas povoavam seu sono profundo.

Viu a subida de uma rua antiga e abandonada, revestida em paralelepípedo, nas proximidades de um vilarejo sombrio, camuflado por mato crescido e castigado pela falta de chuva. Ouviu ao longe o trotar de um cavalo, um estalo de chicote cortou o ar. O vilarejo desapareceu e deu lugar a uma estrebaria. Um homem em idade avançada, encurvado, de pele negra, cuidava dos cavalos. Um vozerio crescente encheu o ar como um exame de abelhas e um rapaz robusto montando um cavalo preto de patas brancas entrou em cena silenciando as vozes da diversidade de pessoas reunidas no local, se acotovelando para disputar o melhor ângulo a fim de assistir ao espetáculo prestes a iniciar, porém aquela cena desapareceu numa neblina espessa. Uma estrada coberta por terra vermelha e solta ocupou o cenário seguinte. Um cheiro forte recendeu no ar e ao longe surgiu uma caravana de bois, comandada pelos orgulhosos fazendeiros, sob a admiração, o respeito e os aplausos de toda a sociedade do município de Ancoradouro, a cidade do gado de corte.

Quando o esplendoroso sol nascente tingiu de dourado o horizonte, se estendendo sobre o movimento suave da água do mar e as gaivotas entusiasmadas voaram e crocitaram em saudação ao amanhecer, o rapaz continuava dormido.

Maria White
Enviado por Maria White em 06/11/2021
Reeditado em 06/11/2021
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