Quando o investigador é a fé

Já haviam discutido tudo o que discutiam em todas as reuniões que realizavam, as reuniões eram freqüentes e os temas estavam se tornando repetitivos, foi quando um dos cinco amigos propôs um divertido jogo entre eles: Mistérios.

A brincadeira consistia em marcar comportamentos ilícitos, ou no mínimo imoral em pedaços de papel, que seriam espalhados sobre uma mesa, e cada um dos participantes pegaria o papel correspondente à transgressão que já havia cometido:

(1)-Infidelidade Conjugal;

(2)-Trair a confiança de um amigo;

(3)-Furtos em magazine;

(4)-Atos de vandalismo recentes;

(5)-Tendo já pensado em ato incestuoso.

Os Mistérios foram propostos, cada jogador pegaria o papel contendo o segredo que carregava na consciência; ficou combinado, com antecedência, que ninguém seria obrigado a fazer confissões, ou revelar detalhes de sua conduta repreensível. Todos imaginavam que conheciam, de sobejo, um ao outro, e o propósito era saber o que cada um escondia do restante do grupo, sem necessidade de explicitar o Mistério condenável com pormenores.

O portador do Mistério número dois foi encontrado, com dois tiros no peito, quando chegava em sua casa, ele abriu a porta, e recebeu os disparos, caindo dentro da sala.

A polícia, quando chegou, percebeu que ele ainda estava vivo, e tentava falar e pegar o seu terço que estava estendido a pouca distância do corpo, e o policial, que atendia à ocorrência, aproximou o terço até a mão da vítima, como se estivesse atendendo a última crença daquela vida que se esvaía. O moribundo pegou a peça sacra,e pinçou uma das contas, balbuciando alguma coisa, que nunca alguém poderia decifrar.

O investigador interrogou os amigos, os últimos que haviam falado com a vítima, tentando extrair de algum deles algo que pudesse elucidar o crime, e os quatros repetiram a inocente brincadeira que realizaram, pouco tempo antes do crime ser cometido.

O policial era um religioso fervoroso, e rezava todos os dias um terço, invariavelmente; fazia caminhadas para manter o físico, e rezava para manter a alma.

As investigações o levaram à seguinte conclusão: o assassino descobriu, tempos atrás, que o baleado saía, regularmente coma sua mulher, esposa daquele que no joguinho inocente havia tirado, para si, o Mistério número cinco.

Não foi nada sobrenatural, nem extra sensorial, a forma com que o homicida foi identificado; a conta do terço pinçada pelo então quase morto denunciava: o quinto Mistério contempla....

Definitivamente ficou muito claro que o policial conhecia todos os Mistérios de um terço, afinal ele rezava um terço todos os dias, com todos os seus mistérios.

Roberto Chaim
Enviado por Roberto Chaim em 18/04/2018
Reeditado em 19/04/2018
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