LUCYLE

Ouro Branco, pequeno município, tinha alguns lugares peculiares localizados quase sempre afastados das habitações familiares. Boate Vida Boa era um desses locais. Não era zona, mas que loucura aquilo, uma bola de luzes cintilantes girava sobre uma pista de parquê, lustrada ao extremo.A música tocada por um DJ era estonteante, altíssima e para dançar em velocidade alucinante. Ao fundo um bar vendia bebidas, refrigerantes e alguns itens liberados de forma especial. Alguns garçons caminhavam com suas bandejas entregando taças cheias e recolhendo as vazias. A música não parava e os dançarinos e dançarinas giravam em rodopios medonhos para quem não era acostumado àquilo. Não era um lugar fino,os frequentadores não eram sofisticados. Enquanto muitos se apertavam dançando nos mais diversos ritmos, outros bebiam, namoravam e beijavam muito.Tudo ali era livre e os casais não respeitavam regras e, pelos cantos tudo era possível. Eram agora 01h 30min, exatos,e ela passou pela portaria, acompanhada por um homem de terno cinza que a conduzia pela mão, vestido longo, decote para chamar a atenção de qualquer vivente, cabelos muito bem penteados e brincos dourados pendentes das orelhas talhadas pela natureza com extrema beleza, eram feitas para escutar palavras doces.Os sapatos eram de salto alto,agulha e sobre eles pairavam pés perfeitos cobertos por fina meia.Ao som dos primeiros passos todos pareceram parar o que faziam, o DJ deixou o som estático, um garçom deixou cair a bandeja num estrondo que pareceu o som de uma bomba.Finalmente alguém falou, num som estranho entre raivoso e admirado disse:Lucyle! Não terminou o grito e a música voltou a tocar estridente, a pista ficou novamente lotada e todos sacudiam-se.Lucyle começou o seu show particular, parecia que tinha molas nas cadeiras e sebo nos saltos para dançar daquele jeito, seu companheiro, de terno cinza apenas tentava acompanhá-la sem muito sucesso, os homens cercaram-na e Lucyle dançava cada vez mais e nesta condição de dançarina principal da noite, a pista ficou lotada, completamente apertada.O acompanhante de Lucyle saiu sorrateiramente e seguiu para o sanitário masculino,outro homem trajando roupas comuns, esporte, também desapareceu da pista e ninguém mais o viu, ninguém dava bola a esses vai e vem de frequentadores.Eram 3horas e o DJ enlouquecido fez tocar um alucinante "rock and rol".Neste momento um homem vestindo roupa preta e máscara entrou na pista,pegou uma menina pelo braço e saíram dançando até se aproximarem de Lucyle, que continuava fazendo sucesso na pista de dança.Chegando próximo da protagonista o homem gritou Lucyle! Sacou de uma pequena faca e a atingiu na região do estômago, de baixo para cima. Lucyle caiu sangrando,a pista da alegria tingiu-se de sangue,o assassino deu um pulo, por entre a multidão e foi para os fundos.Havia apenas muros facilmente transpostos e saídas para terrenos baldios, por um desses caminhos fugiu o assassino. Lucyle estertorou por instantes e não resistiu. A pista de muitas alegrias e por vezes mágoas, tornou-se rubra com o sangue da bela dançarina.Quem matou Lucyle? Sabiam tratar-se de um homem mascarado.Como assim,ninguém vira um homem mascarado entrar na boate, nem mesmo sair dos fundos para frente.O Barman não viu nada e não falaria nada,pois traficava drogas e precisava ficar longe da polícia,o acompanhante da vítima voltou do banheiro depois de uma demora longa e disse nada saber, havia conversado com a moça alguns dias antes e combinaram dançar,pouco sabia sobre ela,pretendia sim, começar intimidade maior quando saíssem dali.Mas alguém sabia mais que isso.Dentre os presentes uma mulher se apresentou à polícia e disse:

-Meu nome é Joana Mara da Silva.Quem a matou foi meu marido, ele é o mascarado e quem dançava com ele antes do crime, era eu.

Perguntada sobre as razões do crime respondeu:

-Eles se conheciam há muito e eram amantes, encontravam-se em locais ermos, hotéis, motéis e eu, mesmo sabendo de tudo nada fazia, por amor, ele ficou sabendo que Lucyle estava iniciando novo relacionamento com outro homem, meu irmão,que chegou com ela.E continuou:

-Meu marido ficou loco quando a viu esta noite, gritou seu nome e eu o fiz calar-se,mas ele estava disposto a tudo e disse que terminaria aquela alegria toda ainda nesta noite, tentei dissuadi-lo e não consegui, ele bebeu muito e acho que cheirou cocaína comprada do homem do bar. Meu marido foi ao banheiro e retornou com aquela máscara, convidou-me para dançar e o fim foi esse que todos viram.

-Qual é o nome do seu marido?Perguntou o policial.

-O nome dele é José Aparecido da Silva, apelido "Cido", é funcionário da Prefeitura Municipal.

-E seu irmão onde está?

-É aquele do terno cinza.

A Polícia então prendeu a mulher, seu irmão de terno cinza e o barman traficante. Depois de alguns dias o Juiz decretou a prisão de José Aparecido.Ele disse ao Delegado, ao ser preso, que comprou a máscara e a faca do barman, de quem também comprou cocaína, para ter mais coragem.A boate onde tudo podia acontecer fechou e ali ninguém mais firmou comércio.Vândalos colocaram fogo e do local restou apenas a memória triste.

Lucyle jamais foi esquecida e sua história é contada de boca em boca.A maior dançarina de rock, dizem nos botecos.E a beleza então, muito bonita!