A cobertura

Eu havia acabado de chegar à redação do jornal naquela manhã de sábado, quando o telefone tocou na minha mesa. Era o inspetor Bronson Ford, da Polícia Metropolitana.

- Você me disse que ligasse se surgisse algum fato curioso... - declarou ele. - Tenho algo aqui que talvez lhe interesse.

Explicou em rápidas palavras do que se tratava. Não fiquei muito impressionado com o relato.

- Um arrombamento na sede do Partido Nova Aurora? O que levaram? Máquinas de escrever?

- Encontramos equipamento de escuta com um dos três invasores... e um cartão de visitas com o número do comitê de campanha do presidente Bauer.

O presidente Deangelo Bauer buscava a reeleição, e plantar escutas na sede do partido adversário era um golpe extremamente baixo. A informação de Ford poderia render uma boa matéria, avaliei.

- Me aguarde que já estou chegando - informei.

Peguei meu paletó na cadeira e informei ao editor, Jack Robertson, onde estava indo.

- Leve o Mitchell para fazer umas fotos - recomendou ele.

Saímos eu e Jayden Mitchell, o fotógrafo, até a Chefatura de Polícia. Lá, o inspetor Ford nos conduziu à carceragem, onde os três arrombadores haviam sido postos numa cela em separado dos demais presos. Mitchell começou imediatamente a fotografá-los, embora tenham rapidamente escondido as cabeças sob os paletós.

- Vocês trabalham para o Partido da Ordem? - Indaguei, microfone do gravador em punho.

- Você vai se arrepender se o seu jornal publicar uma linha ligando esta prisão ao partido do presidente - rosnou um dos suspeitos.

- Então devo concluir que são funcionários do Partido da Ordem - concluí.

- Somos ladrões comuns - disse outro, cabeça coberta por um paletó preto. - Entramos para roubar as máquinas de escrever.

- E o equipamento de escuta? Vocês iam espionar as conversas da sede do Nova Aurora? - Insisti.

- Queríamos tentar descobrir onde esses ladrões da oposição esconderam o dinheiro que roubaram dos contribuintes - prosseguiu o homem do paletó preto. - Você sabe... ladrão que rouba ladrão...

- Sei, sei... - atalhei. - Daqui a pouco vão dizer que estão preocupados com o cidadão comum.

- Essa é a única preocupação do presidente Bauer - disse o homem encapuzado. - Todos nós aqui, votamos nele.

Um murmúrio de aprovação emergiu dos outros dois.

- Está bem - retruquei. - Podem ficar tranquilos que daremos destaque a isto na cobertura do caso.

E no dia seguinte, a manchete do jornal proclamava: "Ladrões apoiam a reeleição de Bauer".

O presidente veio a público desmentir a afirmação, afirmando que as provas haviam sido plantadas e que seu comitê de reeleição nada tinha que ver com os arrombadores. Todavia, quando foi divulgado que os mesmos estavam na folha de pagamento do Partido da Ordem, teve que admitir que "alguém" cometera um erro. O chefe de campanha foi demitido, e o caso parecia fadado ao esquecimento, quando o mesmo chefe de campanha ligou para mim e me perguntou se eu teria interesse em divulgar algumas gravações comprometedoras envolvendo Bauer.

- Que nível de comprometimento? - Indaguei.

- O presidente dando as ordens para grampear a sede da Nova Ordem.

Marcamos um encontro para o estacionamento subterrâneo do jornal, e cheguei cinco minutos antes da hora marcada. O informante, todavia, não apareceu. No dia seguinte, soubemos que ele havia sido atropelado e morto por um automóvel não-identificado. Nenhuma fita cassete foi encontrada entre seus pertences.

O presidente Bauer foi reeleito para um segundo mandato, por esmagadora maioria de votos.

- [16-03-2019]