Luís falou

Mais de mil páginas. Muitas histórias, desdobramentos, venturas e descobertas nessa vida largada de detetive. Quem diria que por trás da carapuça mal-humorada, havia tantos ensinamentos? Tantas descobertas, angústias e sutilezas que somente em uma vida como detetive, uma pessoa poderia saber. Só sendo Luís mesmo...

Letícia estava dividida entre a admiração pela sua intensa vida de detetive e a indignação em reservá-la para si na maior parte do tempo. Por mais que tentasse protegê-la das víboras existentes no mundo, não precisava bancar o herói todas as horas. Apesar de saber que Luís tinha suas "bolas de segurança", como Olavo e Ana, não conseguia deixar de sentir certa inveja por ficar excluída do processo. Trata-se de uma reação tardia de inveja/ciúme que nunca conseguiu dizer pra ele. Faz parte do jogo, parte da vida.

Todavia, isso eram águas passadas. Tinha que olhar o futuro e pensar em pegar esse grupo maior que mirou em sua vida na surdina. Para tanto, precisaria do contato de alguém mais experiente, coisa que Luís previra, tanto que repassou o contato de Olavo. Apesar dos pesares, fazia-se presente na ausência, dando coordenadas e guiando os passos daqueles que ficaram para trás. Estranho, não?

Entretida entre suas reflexões e admirada com as anotações e observações de Luís, Letícia mal notara a aproximação de Olavo, chegando pontualmente às 12h20, coisa que não tinha muito costume com Luís.

- Boa tarde, Olavo. Sente-se por favor.

- Boa tarde, Letícia.

- Essas são as anotações do Luís. Então, conseguiu descobrir alguma coisa sobre o Arsenal?

- Sim, eles são uma gangue antiga, que já chegou a ter mais de 30 divisões.

- Caramba!

- É, mais de cinco pra cá, eles enfrentaram uma crise com a divisão dos grupos de poder, o que favoreceu a sua dispersão pelos mais variados lugares do mundo.

- E como diabos o Luís foi se envolver com esse povo?

- Aí, eu não sei. Talvez tivesse algo a ver com a sua promoção, ou o seu enfrentamento às gangues daqui, o pessoal cresce o olho com quem se destaca.

- Hmm, compreendo. E como a gente faz agora?

- A gente faz o quê?

- Pra pegar esses caras. Você sabe, essa gangue aí, o Arsenal.

- Bem, primeiramente, eu vou pedir para você esse caderno emprestado para analisar em busca de pistas. E, depois...

- Depois, o quê?

- Depois, que eu organizaria um grupo para investigar mais a fundo as extensões dessa gangue. Como eu acredito que isso poderá ser perigoso, eu sugiro a você que fique livre para escolher se participa ou não.

- Eu vou querer participar sim. Por toda a minha história com ele.

- Vai ser perigoso, talvez pior que você imagina.

- Não tenho medo, eu devo isso a ele e a tudo o que nós passamos.

- Gostei da firmeza diante da adversidade. Ok, vamos nessa, então.

- Tá, quais os próximos passos?

- Bem, eu vou levar esse caderno pra casa. Lá, eu farei as minhas análises e observações sobre esse último caso e daí eu te retorno.

- Certo, certo. E quanto ao meu sonho?

- Que sonho?

- Bem, eu quero virar uma detetive. Eu solicitei ao Luís para ser meu tutor...

- Ah sim. Bem, vamos focar nossa atenção nesse caso. Se, ao final de tudo, você ainda quiser ser detetive, eu te orientarei.

- Você jura?

- Seria uma forma de dar continuidade ao legado dele, certo?

- Sim! Muito obrigada! (Letícia deu um abraço caloroso em Olavo, sem pensar em nada, no seu melhor estilo). Aguardo a sua ligação!

- Ok, até logo.

- Até!

Em meio a dor que sentia pela perda de Luís, Letícia pôde ficar feliz por uns momentos após aquela conversa com Olavo. Sentia surgir um fio de alegria em meio a tantas notícias ruins. Era um motivo para seguir em frente apesar dos pesares.

Sabendo disso, Letícia foi em busca de livros sobre detetives e investigações para se inteirar do assunto. Gostaria de ter alguma noção do novo mundo em que estava entrando. Enquanto estava entretida com essas leituras, recebeu uma ligação de sua irmã, Júlia. Queria conversar, assim como também estava preocupada com ela, pois a morte de Luís foi algo pesado para ela.

- Oi, flor! Como você tá?

- Oi, Ju! Ah, a gente tá levando né? Um dia de cada vez...

- Entendi, infelizmente eu tenho uma noção de como você se sente...

- Aí mulher, não fica pensando nessas coisas! Sei que é difícil, mas a gente é forte, e vai aguentar né?

- É, flor. Você tem razão. Escuta, não quer vir almoçar aqui amanhã? A gente aproveita e vê um filme também pra se distrair. O que você acha?

- Parece maravilhoso, querida. Eu vou me organizar e passo aí.

- Certo, chuchu. Você te esperar tá?

- Tá, Ju. Beijão.

- Beijão.

Letícia esboçava um pequeno sorriso no rosto, algo que andava em falta naqueles dias. Sabia que, apesar de todas as tormentas, ainda podia contar com a sua irmã, que tanto sofrera pelas mãos de criminosos por muito menos. Ainda assim, seguia em frente. Em busca de um norte, uma tranquilidade que tinha perdido, mas que poderia ser resgatada. Enfim, seguia. Algo que Letícia iria aprender a fazer.

Enquanto isso, do outro lado da cidade, Olavo lia o caderno de Luís, enquanto completava a sua busca na Deep Web sobre a gangue dos Arsenais. Sua descoberta sobre seu líder atual o deixou chocado, sobretudo por saber da sua fama: Fragmentadora, codinome para Natasha Aimess, 29, que não deixava barato traições, esquartejando os elementos e jogando os restos em mar aberto para virar comida de peixe. Era líder do grupo e mentora dos Lâminas, cuja atuação foi repreendida por Luís e pela agente Melissa. Seria ela, a caçadora de Luís?

O andarilho.

Rousseau e o Andarilho
Enviado por Rousseau e o Andarilho em 24/10/2020
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