Drag-queen
Fui contratado para defesa num processo e buscando os indícios de sua inocência encontrei no Diário do colega advogado a descrição do seu confesso desejo.
Quero preservar a sua identidade com um discreto perfil do seu porte físico, sua idade e característica pessoais.
O protagonista tem estatura de 1,80m, idade aproximada de quarenta anos, solteiro, pai de um filho de 14 anos. Seu rosto imberbe corado, cabelos longos preso como rabo de cavalo. Possui um carro conversível vermelho, marca não identificada. Um galã de lábia convincente que a todas atrai com sua voz de Tenor.
Assim êle escreveu:
“Cansei da mesmice de meu ser. Estou abandonando meu presente programando meu futuro. Não quero ser mais o que nunca fui. Estou assumindo minha personalidade reprovada, não compreendida na sociedade que estou deixando. Não se trata de adoção de gênero nem desvio de personalidade. Quero ser lá fora o que sou entre quatro paredes. Sair do armário no jargão popular. Sou um drag-queen quero ser assumido e ter orgasmos sem reprimir.
Vou ser da noite entre estrelas e constelações à luz do luar no perfume do sereno. Brincar com os travestis, proteger os indigentes consolar as famílias das ruas e debaixo dos viadutos.
Assisti-los como nunca fiz ao nota-los no meu caminho. Não quero ser reconhecido na família, nem com os amigos. Um oculto desconhecido que se descobriu na fantasia do faz de conta. Não quero ter nome, não quero ser chamado nem conhecido porque eu sou eu mesmo comigo mesmo um narcisista contumaz”.
Vim a saber pelo noticiário policial que ele cometeu o golpe do Boa Noite Cinderela na sua presa conquistada pelo seu charme e papo convincente.
Diz o BO, isto é, Boletim de Ocorrência Policial, da Delegacia da Mulher, que o protagonista convenceu a vítima que estava na fila da bilheteria do cinema do Shopping de Santos a permanecerem juntos na sessão do cinema e que ao final da matine acompanhou-a até a porta do Edifício de sua residência. Lá se despediram, com a formalidade de um beijo no rosto, como de praxe. Se desculpando pela pressa em voltar ao seu lar, pois é divorciado e ficou com a guarda do seu filho adolescente, precisando acompanha-lo nos estudos.
Passados alguns dias ele se dirige ao prédio da vítima e a convence a recebe-lo para um chá das cinco como manda os ingleses.
Deste encontro a princípio abrasivo tornou-se pesadelo quando descuidada deixou-o a sós em quanto foi ao seu quarto atender seu celular, pois lá se encontrava habitualmente para carregar a bateria. Foi então que o meliante inseriu na bebida da vítima uma droga conhecida como “boa noite cinderela” que a fez dormir um profundo sono até seu fatídico despertar. Acordando deitada ao chão frio da copa-cozinha onde merendavam, observou seu corpo se havia sido molestado, o que curiosamente não ocorreu. Observou que a louça da cozinha estava lavada e posta no secador sobre a pia e os alimentos guardados nos seus devidos lugares. Foi até a sala onde sua bolsa estava no sofá e notou seus pertences como carteira de dinheiro e cartões de credito e bancário lá se encontravam intacto. Dirigiu-se ao seu aposento e abrindo seu guarda-roupa levou um choque ao vê-lo vazio dos seus vestidos e roupas intimas. Foi ao banheiro e notou em sua bancada vazia dos seus perfumes, batons e maquiagens usuais. Notou que no espelho estava escrito com sabão desculpas pelo ocorrido, “pois sou um drag-queen, e como tal tenho dificuldades de encontrar roupas do meu manequim, as quais encontre-as no seu armário e me vestiram muito bem.” Ainda dizia o recado: “estou deixando sobre a geladeira dois ingressos para o meu show na boate let’s goo de São Vicente.”
Com esta dissertação a investigação policial fará o indiciamento para que no contraditório possamos fazer a sua defesa.
A tese de defesa é no sentido de que a vítima é consumidora de psicotropico sonorifico e que o indiciado confundio açúcar com o pó medicinal e colocou no chá dela por engano. Não usou para si porque não consome adoçantes nas suas bebidas. Assim sendo, não teve o dolo de intorpencer a vítima.
Chico Luz