Surreombras

Sombras. Sombras. Sombras. Sombrinhas! De sol? Não, não. Sombrinha de sombra mesmo. Sabia que tem? Ah, tem, tem sim. Tem e tem muito. Olha no chão. Olhou? Viu? Tem uma sombra. Uma sombra sua, sim. Só sua. Sua sombra, sombra, sombrinha não de sol. Legal, né? Muito. Mas tem gente com mais sombra, sabe? É, mais sombra que isso aí. Tem gente com sombra que sai do chão! Sai da parede, sai da cama, sai da mesa, sai do arroz com feijão. É, é sim! Tem gente com sombra assim! Como são as sombras? Ahh, psudoaluninho. Quer saber das sombras? Elas vêm em várias formas e tamanhos, iguais a tênis. Sim, tênis vem em várias formas e tamanhos. Só não conta pros seus pais que tô falando isso, ok? As sombras que saem do chão e do arroz com feijão às vezes são grandes, às vezes são pequenas.

- Às vezes são médias?

Não, pseudoaluninho. Nunca são médias. São sempre grandes ou pequenas. Você fez uma pergunta idiota e vou ter que te matar, tudo bem? Vou pegar a cerra aqui e... RÉC RÉC RÉC. É, que pena, era um pseudaluninho legal. Agora morreu. Pelo menos não vai falar pros pais que eu falei de ptênis. Pseudoempregadinha, limpe essa sujeira aqui, sim? Isso, assim. Pode deixar aí dentro, depois eu me desfaço. Mande o próximo entrar. Ah, oi, sente-se. Não se incomode com o katchup esparramado na carteira, é que eu estava comendo coxinha com katchup antes. Mas então, abra seu caderno na página vinte e sete e meio e copie tudo que eu digo no seu livro. Pois bem, como eu ia dizendo, as sombras podem vir em várias formas e tamanhos. Sabe o que elas fazem? É claro que não, eu que sou o professor, oras bolas. Mas deixa que eu lhe falo. As sombras, elas se agarram em seu pescoço e ficam falando coisas em suas orelhas. O quê? Ah, sim, sim, nas duas. Elas falam de morte. Isso, morte mesmo. Igual a que eu posso causar com aquela cerra ali no canto, tá vendo? Se eu quisesse eu te matava.

- Hahaha.

O quê? Achou uma piada? Ah, que droga, pseudoaluninho. Vou ter que te matar. RÉC RÉC RÉC. É, já era. Traga o próximo, pseudoempregadinha. Ah, sim, sim, deixa aí com o outro. Agora traga o próximo. Sente aí, moleque. Se quiser katchup é só falar. Abra seu notebook na página 3, copie tudo o que eu falo na sua testa. As sombras, quando elas o pegam, deixam-no maluco. Deixam-no surreal, doido, lé lé da cuca. Você fica andando pra lá e pra cá - isso, desse jeito que estou fazendo - enquanto pensa em operações matemáticas e análises sintáticas da grama crescendo. Amor? Ahn? Amor? Não, não é para quem tem sombra. Hahahaha, que piada! A sombra o suga, a sombra o mata em vida. Você não quer ter uma sombra, pseudoaluninho. Não quer mesmo. Sim, eu tenho uma sombra. E sim, eu estou morto em vida. A sombra não me deixa em paz, pseudopsicólgo. A sombra não me deixa em paz nunca! Posso me sentar neste divã aqui? E me deitar, posso? Obrigado. Traga-me uma torta de cerejas, por favor. Essas coisas são tudo o que presta neste mundo, já notou? A cereja. A cereja, a cereja! A maldita cereja em um mundo de cerveja. Tô cheio da cerveja do mundo. Cevada de cru fermentado. Tô cheio de cerveja! Traga-me mais torta de cereja, mais, mais, mais. Então, pseudopsicólogo, como eu ia dizendo, ahn? Ah, ah, sim, obrigado, pseudocozinheiro. Então, como eu ia dizendo, as sombras me maltratam sempre. Elas me maltratam dia, maltratam-me noite, maltratam-me agora e maltratar-me-ão para sempre. Se ligou na mesóclise? E na ênclise bem bolada? É, eu sei usar. É que escrevo, entende? A gente tem que ficar esperto nessas coisas. Enfim, as sombras me maltratam sempre. Sabe o que elas tão falando agora no meu ouvido? "Este prédio vai desabar, a cereja vai lhe rejeitar, seu intestino vai te embostear todo. Essa última, será que é dar um boost? Ah, capaz. De jeito nenhum.

- Conte-me mais sobre as sombras.

Ah, não, pseudoalucólogo. Por que fez isso? RÉC RÉC RÉC. Pseudoempregadinha, faça seu serviço. Traga o próximo. Olá, pseudoaluninho. Como vai você? Houve uma época em que PC Siqueira tinha a patente dessa frase. Olá, como vai você? Velhos tempos, velhos tempos. Ah, essa sombra, sombra maldita e danada que não sai de mim. Já viu uma sombra? Vou lhe mostrar.

Ela saiu do meu peito e rasgou meu pescoço, o da pseudoempregadinha e o do pseudoaluninho.

Ah, puxa vida. Agora estamos os três rasgados. Eu morri, você morreu, nós morremos. Três pseudoaluninhos, um pseudoalucólogo e uma pseudoempregadinha aqui no cemitério. Sobrou o pseudocozinheiro vivo. Enfim, não importa. Adeus, se divirtam no céu. Estou sozinho. Ah, o que é isso? Lágrimas? De novo? Por que há sempre tantas lágrimas em meus olhos? Eu me sinto tão sozinho, tão sozinho! Ah, como eu queria que não fosse verdade. Como eu queria que isso fosse só um canto publicado na seção Contos Surreais em um site virtual no ano de dois mil e dezesseis depois de Cristo, dia 11, mês de maio. Como eu queria que fosse isso! Sento-me no chão. É um chão fofo e duro, que nem terra. Que nem o colo de alguém amado. Alguém amado? Nunca tive. Mamãe não conta, papai não conta. Quem está falando? Ah, oi, sombra. O que está fazendo com meu intestino delgado? Sugando? Alimenta-se disso, não é? Está tudo bem, já estou acostumado. Só me devolva quando terminar, preciso dele para usar o banheiro. Usar o banheiro é muito importante porque do contrário você explode. Já pensou nisso? Uma granada embosteada. Tipo boost do inglês!

Estou triste, sombra. Estou muito triste. Estou bem triste. Ah, sombra, não se pode ficar falando da própria tristeza. Não sabia disso? É falta de educação. Sabe, está doendo um baralho inteiro você ficar fazendo isso com meus órgãos internos. Eles são chamados assim porque precisam ficar dentro do corpo, sabia? Mas tudo bem, eu sei que precisa de brinquedos. Brincar é importante. Bem bonito esse show de malabares que faz com meu cérebro, coração e olho esquerdo. É uma pena que eu só esteja vendo metade do show, se é que me entende. Haha. "Haha". Isso me lembra do pseudoalunho que matei. Do que ele riu mesmo? Ah, é, foi porque pensou que eu brincava quando disse que o mataria se quisesse. Aquele pseudoaluninho foi um tonto mesmo, podia estar comendo algo do pseudocozinheiro. Algo que não fosse cru, pelo bem da higiene. Ah, que fome. Estou com muita fome. Vou ir lanchar. O quê? Não consigo pegar as cerejas? Ah! É porque sou um fantasma! Que trova! Que trova, que trova, mas que trova!

Sabe, sombra, é muito dolorido ser um fantasma,

Observou como a cereja passa direto por minhas mãos?

Logo as cerejas, eu tinha que ver logo as cerejas fazerem

Isso. É o meu maior medo, é o meu maior medo!

Tudo bem? Ah... tão bem quanto um peixe no

Anzol. Ele já era. Pode lutar, lutar, luta

R, mas já era. Se sair, vai estar um um rasgão na boca

I tudo o que vai fazer pro esto da vida será nadar.

Oje tudo o que eu quero é o abraço de alguém. Agora pare de tomar meu sangue no canudinho, sombra. Já estou anêmico.